O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), como em todos os anos há quase três décadas, transforma a semana do dia 17 de abril em marco na luta pela reforma agrária. A data lembra o assassinato de 21 trabalhadores rurais, em 1996, na chamada Curva do S, como ficou conhecido o trecho da rodovia PA-150, no município de Eldorado dos Carajás, no Pará, em que policiais militares armaram uma emboscada e atiraram contra um grupo do movimento que seguia em marcha até a capital Belém.
O local transformou-se em memorial em homenagem aos mártires do movimento, ponto de encontro anual para atividades do MST, que já sediou um acampamento pedagógico da juventude, e este ano promove ato político e religioso em defesa de uma reforma agrária que promova a agricultura familiar sustentável.
“Em um processo de cura coletiva, a curva do S, que ficou marcada pela violência, se transformou também em símbolo de resistência, tornando-se campo sagrado de onde as vozes silenciadas dão o grito. O grito pela terra, pela vida, pela natureza, pelos seres humanos. E neste espírito, convocamos para nos reunirmos entre as castanheiras para um ato de semeadura dos dias de abundância e felicidade que construiremos”, diz o movimento, em nota. O ato que marca os 28 anos do massacre começa às 8h desta quarta-feira (17), entre as castanheiras que perfilam o local, com atividades culturais como música, poesia, dança e discursos.
Na atual jornada de luta pela reforma agrária, chamada de Abril Vermelho, o MST informou ter realizado, até o momento, 30 ações diversas em 14 estados do país, mobilizando mais de 20 mil famílias sem terra. Desse total, foram 24 ocupações de terra em 11 estados. O movimento, que completa 40 anos de fundação, denuncia a existência de 105 mil famílias acampadas às margens de rodovias em todo o país aguardando um pedaço de terra.
“As ocupações de terra enfatizam a importância da reforma agrária como alternativa urgente e necessária para a produção de alimentos saudáveis no Brasil, tendo como foco a erradicação da fome no campo e na cidade, garantindo o desenvolvimento do país, no contexto agrário, social, econômico e político. Vale destacar que estamos em uma conjuntura em que o orçamento voltado para a obtenção de terra e direitos básicos no campo, como infraestrutura, crédito para produção, moradia, entre outros, é por dois anos consecutivos, o menor dos últimos 20 anos”, diz o movimento.
Na última segunda-feira (14), o governo federal anunciou nova estratégia para a destinação de terras destinadas à reforma agrária no país. O programa Terra da Gente, regulamentado em decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sistematiza alternativas legais de obtenção de terras para a reforma agrária, além das formas tradicionais, como a desapropriação de áreas improdutivas e a regularização de terras públicas. O objetivo é incluir 295 mil novas famílias no programa nacional de reforma agrária até 2026.
Além da desapropriação de terras, cujos processos podem levar anos, a medida permitirá a transferência de áreas rurais de grandes devedores da União e a possibilidade de negociação com bancos, empresas públicas e governos estaduais para a aquisição de terras em troca do abatimento de dívidas ou permutas, em procedimentos mais ágeis e sem conflito judicial.
O governo também destacou a recomposição do orçamento para a desapropriação de terras este ano, com recursos de R$ 520 milhões, o maior dos últimos anos, mas inferior às dotações de gestões anteriores.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) criticou, nesta segunda-feira (15), a abordagem da Polícia Militar do Rio de Janeiro (PMRJ) durante operação em Campos dos Goytacazes, no norte fluminense. Uma imagem compartilhada nas redes sociais mostra a presença de sete policiais em uma área rural, aparentemente conversando com dezenas de homens e mulheres.
Segundo a postagem, foram mobilizadas mais de dez viaturas que cercaram o Assentamento Josué de Castro, regularizado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) desde 2007. De acordo com o MST, houve intimidação de famílias assentadas, além do uso de drones e de bloqueadores de sinal de celular.
O episódio ocorre apenas três dias após o Ministério Público Federal (MPF) anunciar que está apurando a existência de ações policiais desproporcionais em assentamentos de reforma agrária localizados no município de Campos dos Goytcazes.
A dirigente do MST e atualmente deputada estadual Lucia Marina dos Santos (PT), conhecida como Marina do MST, lamentou a situação. “Estou tentando contato com as famílias no assentamento em Campos, mas, quem diria, não se consegue falar. Sinal bloqueado. Por que motivo a PM não quer deixar uma deputada (nem ninguém) se comunicar com as famílias?”, questionou a deputada em suas redes sociais.
Procurada pela Agência Brasil, a Secretaria de Estado de Polícia Militar confirmou, em nota, que uma operação foi deflagrada hoje em Campos dos Goytacazes, mais especificamente na região do Morro do Coco. Segundo a secretaria, o objetivo foi garantir a segurança e a ordem na região diante da possibilidade de invasões ilegais a propriedades locais.
“Participam equipes do 8º Batalhão de Polícia Militar e da 146ª Delegacia da Polícia Civil, munidas de dados estratégicos compartilhados que norteiam a estratégia de atuação”, diz o texto. Até o momento, a PM não informou se houve alguma detenção. Também não foram divulgados resultados da operação, que ocorre no dia em que o MST anunciou o início da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária.
A jornada, realizada anualmente em abril, lembra o Massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido em 1996. Na ocasião, 21 trabalhadores rurais foram mortos pela Polícia Militar do Pará. Conforme postagem feita pelo MST em suas redes, a jornada engloba diversas ações em todo o país para enfatizar a necessidade da reforma agrária como forma de garantir segurança alimentar, proteção ambiental e a democratização da terra.
Uma dessas ações foi em Campos dos Goytacazes e teve início hoje de manhã. Cerca de 300 famílias fizeram uma ocupação às margens da BR-101, pedindo a conclusão do processo de regularização do assentamento Cícero Guedes, que beneficiará trabalhadores rurais que vivem no local há mais de 20 anos. Além disso, os manifestantes criticaram a atuação dos agentes de segurança pública na região, acusando-os de agir em aliança com proprietários rurais. Segundo nota divulgada pelo MST, os agentes tentavam impedir o direito de reunião, a liberdade de associação e o cooperativismo.
“Ignoram que a reforma agrária é uma política pública constitucional’, diz o grupo. De acordo com o Ministério da Cidadania, dados do Cadastro Único mostram que, no ano passado, havia 236.525 pessoas em estado de vulnerabilidade social em Campos dos Goytacazes. “[No município] há dezenas de processos de desapropriação paralisados no Poder Judiciário, que poderiam se tornar novas áreas de assentamento e de produção de vida e comida de verdade.”
Ofícios
Na última sexta-feira (12), o MPF informou que estava apurando denúncias sobre ações policiais desproporcionais em assentamentos de reforma agrária localizados naquele município. Ofícios solicitando esclarecimentos e providências foram enviados às secretarias de Estado de Segurança Pública e de Polícia Militar.
Foram citadas denúncias de intimidação policial contra os assentados rurais. As duas pastas devem responder em um prazo de dez dias. De acordo com o MPF, será investigado se existem milícias rurais atuando para coibir o direito de reunião no campo.
Um dos casos teria ocorrido no último dia 6, durante evento de um projeto da Defensoria Pública do Rio de Janeiro no Assentamento Dandara dos Palmares, também regularizado pelo Incra. Os episódios foram relatados em representação do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular Luiza Mahin, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O documento cita abordagens policiais agressivas e tentativas de intimidação contra membros de movimentos sociais que estavam conduzindo atividades de conscientização sobre a reforma agrária.
Também foram mencionadas queixas de famílias do Assentamento Josué de Castro, que expressaram preocupação com a “presença ostensiva da PM na região nos últimos dez dias, incluindo o sobrevoo de helicópteros durante o evento da Defensoria Pública, supostamente como um sinal de intimidação”, diz nota divulgada pelo Ministério Público Federal.
O Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, disse neste sábado (27) que tem pressa para retomar a reforma agrária. “O tempo político nosso é o tempo da pressa. A bandeira política nossa é a reforma agrária”, enfatizou ao discursar no encerramento do encontro da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O encontro reuniu ao longo da semana os dirigentes do movimento na Escola Nacional Florestan Fernandes em Guararema, na Grande São Paulo. O espaço é um centro de formação do MST, que comemora 40 anos de fundação. Em entrevista coletiva mais cedo, os representantes dos sem-terra reclamaram dos poucos avanços na redistribuição de terras durante o primeiro ano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ministro afirmou, no entanto, que está preparado para superar os obstáculos e conduzir um programa que garanta terras para as famílias camponesas. “Sobre a reforma agrária, nós vamos tocar em todos esses pilares da dificuldade histórica do Brasil. Nós já estamos preparados para desencadear esse processo de reforma agrária”, disse.
Conflitos agrários
A violência no campo foi outro tema que Teixeira prometeu enfrentar. Nós estamos mapeando todos os conflitos no campo e vamos denunciar essa milícia que se forma no Brasil e que matou uma indígena no sul do Bahia, nesta semana. Não vamos admitir que os movimentos indígenas, os movimentos quilombolas e os movimentos pela reforma agrária sofram violência. E nós vamos continuar lutando contra elas e contra aqueles que as praticam”, destacou.
No último domingo (21), uma comunidade pataxó hã-hã-hãe foi atacada por um grupo de homens que tentou retomar à força uma fazenda ocupada pelos indígenas e reivindicada como território tradicional. De acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) o ataque, que resultou na morte de uma mulher, foi planejado por um grupo autointitulado “Invasão Zero”.
Também participaram do evento os ministros dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio de Almeida; do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho; da Secretaria de Governo, da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) informou que mais de mil famílias ocuparam, na madrugada desta segunda-feira (20), duas fazendas em Parauapebas, no sudeste do Pará. De acordo com o movimento, as ações marcam o Dia da Consciência Negra, celebrado hoje, e a Jornada de Lutas Terra e Liberdade.
“Em luta, as famílias rememoram o legado de lutadores e lutadoras negras que inspiram a construção de um país livre da violência, da opressão e com garantia de direitos”, diz nota, divulgada pelo MST.
O MST afirma que as fazendas ocupadas são improdutivas e resultado de grilagem de terras. As famílias reivindicam que as áreas sejam consideradas públicas e destinadas à reforma agrária.
O movimento diz ainda que o clima na região é tenso, com a presença de policiais que teriam bloqueado a entrada e saída dos acampados.
O Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra da Paraíba (MST) denunciou neste domingo (12) o assassinato de Ana Paula Costa Silva e Aldecy Viturino Barros. Eles faziam parte do Quilombo do Livramento, Sítio Rancho Dantas, no município de Princesa Isabel. O crime teria ocorrido por volta das 15h30 da tarde de sábado (11). A Polícia Civil da Paraíba investiga o caso.
Em nota, o MST pediu justiça, identificação dos autores e celeridade nas investigações. De acordo com o movimento, Ana Paula Costa Silva era acampada, tinha 29 anos e três filhos. Aldecy Viturino Barros, tinha 44 anos, dois filhos e era coordenador do acampamento.
Moradores do Quilombo do Livramento contam que Ana Paula Costa e Aldecy foram assassinados a tiros por dois homens que chegaram em uma moto dizendo que Aldecy precisava assinar um documento que estava sob posse dos assassinos.
Ao descer a escada para atender aos homens que o procuravam, o coordenador do acampamento foi surpreendido com vários tiros, que também acertaram Ana Paula. Ele morreu na hora. Já Ana Paula chegou a ser levada para o hospital, mas não resistiu.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) publicou no Diário Oficial da União desta quarta-feira (23), portaria que cria Projeto de Assentamento Cícero Guedes, em Campos Goytacazes, no Rio de Janeiro. A área de 1.319,8148 hectares foi desapropriada em 2021, pela Justiça Federal, e destinada a assentar famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que lutam pelo local desde 1998, quando um decreto presidencial considerou as terras improdutivas, por não cumprir função social.
O lugar é palco da luta de trabalhadores rurais, muito antes disso, quando ainda mantinha em funcionamento uma usina de açúcar, administrada pelo ex-vice-governador do estado, Heli Ribeiro Gomes (1968). A Usina de Cambahyba acumulava dívidas trabalhistas e previdenciárias milionárias com a União, além de processos de trabalho análogo à escravidão e exploração do trabalho infantil.
Relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV) confirmou que ali foram incinerados 12 corpos de presos políticos recolhidos da Casa da Morte, o centro clandestino de tortura em Petrópolis (RJ), e do DOI-Codi, na capital.
“A história da Usina Cambahyba é a expressão da formação da grande propriedade e da exploração da força de trabalho e do meio ambiente no Brasil. É uma história de violência marcada pela resistência dos trabalhadores e trabalhadoras”, afirma uma nota assinada pela direção do MST, em 2021, quando o movimento ocupou as terras pela última vez, ocasião em que deram nome ao assentamento.
Homenagem
Cícero Dias, foi líder do MST em Campos dos Goytacazes, e foi assassinado, em 26 de janeiro de 2013, com mais de dez tiros nas costas e cabeça, próximo ao Assentamento Oziel Alvez, uma das ocupações feitas pelo movimento para pressionar a destinação do Complexo Cambahyba para reforma agrária.
Alagoano, Cícero passou por uma infância de condições precárias, fome e trabalho infantil. Partiu para Campos dos Goytacazes, em busca de melhores condições, onde trabalhou nos canaviais e chegou a trabalhar nas obras da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), como operário da construção civil.
Mesmo depois de conquistar sua terra, após participar do primeiro assentamento do local, ele permaneceu fortalecendo o movimento pela reforma agrária e acompanhando todas as áreas de luta pela terra na região. Era referência na produção agroecológica e no uso de técnicas sustentáveis de cultivo sem agrotóxicos. Também foi um dos idealizadores das feiras de reforma agrária do MST.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) abriu neste sábado (22), no município de São Mateus (ES), a 1ª Festa do Café da Reforma Agrária Capixaba, para celebrar a colheita do café produzido nas áreas de reforma agrária do Espírito Santo.
A festividade ocorreu no Assentamento rural Vale da Vitória. A programação durante todo o sábado contou com feira de produtos da reforma agrária (in natura, industrializados e artesanato); espaço para alimentação; atividades culturais; e inauguração das novas instalações da Cooperativa de Beneficiamento, Comercialização e Prestação de Serviços dos Agricultores Assentados (Coopterra), que, atualmente, registra cerca de 250 famílias cooperadas.
Abertura da festa da colheita do café, com a presença de assentados e acampados do MST de todo o Espírito Santo – Cyla_Photo/MST/Divulgação
Em entrevista à Agência Brasil, o coordenador Nacional de Produção, Cooperação e Meio Ambiente do MST, Daniel Mâncio, diz entender que a festividade tem abrangência nacional. Daniel Mâncio explica que a produção de café nos assentamentos da reforma agrária é organizada pelo MST em seis estados.
“O movimento dos sem terra busca organizar as cadeias produtivas prioritárias, entre elas a do café, como uma forma de dar saltos qualitativos, não só no âmbito da produção, mas da agroindustrialização e da comercialização, articulando processos de ponta a ponta da cadeia, agregando, assim, valor, gerando renda e trabalho e, por isso, contribuímos de forma muito importante do ponto de vista organizativo”.
Visitas
O evento registrou a presença de assentados e acampados do MST naquele estado, além do coordenador nacional do MST, João Pedro Stédile, e do ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira.
Ao conhecer a produção de famílias assentadas, o ministro Paulo Teixeira reforçou a importância da administração da cooperativa ser integralmente feita por famílias assentadas. “Hoje, eu vi aqui uma experiência importante na produção e sistema cooperativado do café e da pimenta. Um sistema que deu certo, demonstrando o papel da reforma agrária e da cooperação”.
Políticas públicas
João Pedro Stedile disrcusa na abertura da festa da colheita do café – Cyla_Photo/MST/Divulgação
O evento ainda teve debates e ato político. João Pedro Stédile, da coordenação nacional do MST, pontuou a importância da organização dos trabalhadores rurais no Espírito Santo. “Mesmo de forma micro, aqui no Espírito Santo, temos revelado um quadro na luta de classes nacional, especialmente no campo da agricultura”. Stédile ainda pleiteou avanços das políticas de reforma agrária. “Temos que recuperar uma política de crédito para as agroindústrias, assim como temos que retomar o Pronera [Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária]. Para isso, estaremos atentos às lutas necessárias em defesa do desenvolvimento dos nossos assentamentos”.
À Agência Brasil, o coordenador do MST, Daniel Mâncio, enumerou outras políticas públicas consideradas fundamentais ao desenvolvimento do campo brasileiro e que foram debatidas com ministro Paulo Teixeira. Entre elas: políticas de crédito para custeio e estímulo à produção nos assentamentos de reforma agrária, a partir do novo Plano Safra. O MST também focou em outras políticas públicas para agroindustrialização, desenvolvimento e agregação de valor à produção. Por fim, Daniel Mâncio defendeu as políticas de comercialização institucional, via Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Programa de Aquisição de Alimentos (PAA); pela formação de estoques e também por compras institucionais pelo governo federal. “Com essas políticas, é possível estabelecer uma nova relação de organização da produção e de distribuição do alimento para a sociedade brasileira. Além disso, a assistência técnica, enquanto um programa que fomenta, estimula, organiza e qualifica, também, a produção de café”.
Café da reforma agrária
O MST estima que, anualmente, as áreas do movimento no Espírito Santo colhem cerca de 150 mil sacas de grãos, envolvendo 450 famílias produtoras, onde a maior parte é beneficiada pela Cooperativa Coopterra.
De acordo com o movimento, o cultivo do café tem sido uma das principais cadeias produtivas em consolidação na região, especialmente o café da variação conilon.
Hoje, o Espírito Santo é o maior produtor de café conilon do Brasil, responsável entre 75% e 78% da produção nacional.
Os assentados da reforma agrária de São Mateus (ES) ainda se destacam pela produção de pimenta do reino.
Uma produção diversa de alimentos orgânicos e agroecológicos, resultado de um manejo sustentável tanto para os agricultores como para o meio ambiente, tem início na luta pela ocupação da terra.
A 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)’, realizada no Parque da Água Branca, na capital paulista, de hoje (11) até domingo (14), tem mais de quinhentas toneladas de alimentos, com 1.500 itens de produtos comercializados por mais de 1.200 feirantes. Desse montante, 25 toneladas serão doadas em uma ação solidária.
Para Ceres Hadich, da coordenação nacional do MST, “a feira traz muito essa intencionalidade de demonstrar a totalidade da reforma agrária e de como a gente chega até esse alimento saudável produzido. O início dessa luta se dá na ocupação de terra, é esse o vínculo que a gente também quer trazer para dentro da feira. Para esse alimento poder chegar aqui, poder massificar e efetivamente fazer com que se cumpra a função social, a gente precisa olhar lá para trás para ver de onde saiu essa primeira luta, e a luta se dá na luta pela terra, na luta pela ocupação”.
Acrescenta que, dentro da proposta da reforma agrária popular, o objetivo é demonstrar que é possível a produção do alimento sem agrotóxico, de forma agroecológica, com relações justas de trabalho entre os produtores e a natureza. No entanto, ressalta a necessidade que se tenha políticas públicas e a intenção de se produzir cooperadamente para que o alimento chegue de maneira viável, a preço justo, para todas as pessoas.
Ceres considera que o MST é filho de um processo de redemocratização do Brasil, ocorrido há quatro décadas. “A gente foi se fortalecendo e foi descobrindo com esse nosso Brasil recente como fazer a luta democrática, que é a luta pela reforma agrária, uma luta constitucional, uma luta legítima, ainda que a questão agrária já tenha mais de cinco séculos na nossa história, como uma grande dívida que nós temos com o povo brasileiro”.
A seguir, ressalta a importância da realização da feira no contexto político recente, em que se pode voltar a dialogar, debater e problematizar as questões do movimento.
“Nos últimos anos, a gente sofreu com ausência dela [democracia]. Os últimos anos, para nós da classe trabalhadora, não só o povo sem-terra, não só os camponeses que estavam no campo sofrendo com ausência das políticas públicas, das políticas de estado, sofrendo com ausência do estado, com a negação da ciência, das possibilidades de a gente construir um Brasil sério e com dignidade, a gente vivenciou anos muito escuros para nossa sociedade, para o nosso povo, de muita desesperança e falta de horizonte”, explica.
Mais de quinhentas toneladas de alimentos integram a 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária do MST Foto – Rovena Rosa/Agência Brasil
Diversidade
Também da coordenação nacional, Gilmar Mauro afirma que se buscou mostrar a diversidade que compõe o movimento sem-terra, trazendo diferentes culturas do país para a feira, seja em termos de alimentos ou de ações artísticas. Ele ressalta que só é possível essa produção e esse conjunto de assentamentos no país porque foram feitas ocupações de terra no passado, que se transformaram em assentamentos.
E prossegue: “a reforma agrária está dentro da Constituição brasileira, a nossa luta não é mais nem menos do que o cumprimento da Constituição, que estabelece que toda a terra que não cumpre com a função social deveria ser desapropriada para fins de reforma agrária. E, para cumprir a função social, ela precisa produzir racionalmente, respeitar a legislação ambiental e respeitar a legislação trabalhista. E nós sabemos que tem trabalho escravo, queimada, destruição ambiental, tem dívidas imensas com o INSS [Instituto Nacional do Seguro Social]. O governo federal poderia arrecadar essas terras para fins de reforma agrária”, diz.
Ele avalia ainda que a reforma agrária é uma das alternativas para o combate à fome e miséria no país, para além de doações. “A doação é importante, claro que é importante, mas ela não resolve o problema estrutural da fome. É preciso política pública e a reforma agrária pode vir a calhar com políticas públicas de financiamento da produção dos assentamentos, da pequena agricultura, quilombolas, indígenas e essa produção [pode] ser trazida para os grandes centros.”
Injustiça agrária
Para Ceres Hadich, a injustiça agrária gera outras injustiças estruturais. “Já não é mais possível a gente estar em pleno século 21 no berço desse agro pujante que gera fome. Hoje, temos mais de 33 milhões de brasileiros em situação de fome e milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar. Não é mais possível a gente conviver com isso sabendo que a gente tem todas as condições para buscar alternativas e para combater isso do ponto de vista estrutural.”
O agricultor Carlos Aparecido Ferrari, de 67 anos, participou do processo de criação do MST e é um dos representantes desse ciclo virtuoso de produção sustentável a partir da distribuição de terras, com respeito aos trabalhadores e ao meio ambiente, gerando renda e oferta de alimentos livres de agrotóxicos para os consumidores.
Após um encontro nacional para tratar dos conflitos de terras, ele conta que se percebeu que a desigualdade na distribuição de terras estava presente no país inteiro e que a luta por esse direito já ocorria de diversas formas.
A 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária do MST, em São Paulo, será realizada até domingo Foto – Rovena Rosa/Agência Brasil
“A gente tomou a decisão, nós precisávamos construir uma ferramenta para unificar a luta do sul ao norte em uma mesma linha política e uma mesma forma de fazer a luta pela terra”, diz. Criou-se uma comissão para pensar o movimento, foi realizado o primeiro encontro nacional e, a partir daí, nasceu o MST em 1984.
“Essa linha que a gente adotou de fazer a ocupação, de fazer o enfrentamento ao latifúndio, foi que levou a gente a conquistar milhões de hectares de terra nesse país todo. E, com isso, veio a discutir a produção de alimentos para acabar com a fome. Avançou não só na produção, mas também na agroindustrialização, como por exemplo, o arroz no Rio Grande do Sul já industrializado, o mel já industrializado que vem dos assentamentos, [ele] teve um avanço muito grande do ponto de vista da produção, da industrialização e da comercialização”, analisa Carlos Aparecido.
Concentração de terras
As ocupações e os acampamentos foram as formas de se denunciar a concentração de terras na mão de poucos e os latifúndios improdutivos, e são estratégias de luta pela distribuição de terra.
“Em alguns casos, conquistando algumas áreas que nem foram ocupadas. Mas a ocupação provoca a denúncia do latifúndio improdutivo e, de repente, o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] começou a fazer vistoria mesmo sem ser ocupada, não dava um índice de produção [adequada] e com isso [aquela área] entrou na lista das desapropriações, já houve muitos assentamentos assim” acrescenta.
Ainda segundo Carlos Aparecido, o movimento acabou assumindo o papel de denunciar outras injustiças que ocorrem no campo, além do acúmulo da terra, como assassinatos e massacres, além da ocorrência de trabalho escravo.Além da produção de erva-mate e de milho no Assentamento Tamakavi, em Mato Grosso do Sul, ele distribui gratuitamente e faz trocas de sementes crioulas de milho asteca palha roxa, de feijão e de arroz. Segundo ele, essa variedade de milho está quase em extinção e é importante que as sementes sejam compartilhadas.
“Continuar a resistência para produzir semente crioula, semente limpa, sem transgênico, sem veneno. Se a gente não fizer a distribuição para os amigos e trabalhar para ver se alguém compra a ideia também de uma produção ‘limpa’, vai acabar,” finaliza.
A Justiça Federal em Pernambuco determinou que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) desocupe uma fazenda pertencente à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), localizada em Petrolina (PE).
Em sua decisão, desta quarta-feira (19), a juíza federal Danielli Farias Rabelo Leitão Rodrigues estabelece que os cerca de 600 integrantes do movimento que estão na propriedade desde a madrugada do último domingo (16) deixem a área em até 48 horas após serem notificados, o que aconteceu na manhã de hoje (20).
A juíza também estabeleceu uma multa diária de R$ 500 a ser aplicada contra o MST caso seus integrantes não deixem o local voluntária e pacificamente dentro do prazo.
Por telefone, o chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Semiárido, unidade da empresa pública responsável pelo terreno de cerca de 500 hectares, Anderson Ramos de Oliveira, disse aguardar o cumprimento da sentença.
Na terça-feira (18), Oliveira concedeu entrevista à Agência Brasil, garantindo que a propriedade é usada há décadas para a realização de experimentos que buscam tornar mais resistentes as sementes e mudas de plantas cultivadas no Cerrado, aumentando a produtividade destes produtos. Além disso, parte do terreno é mantida intocado de forma a preservar a flora nativa.
Acordo
Segundo um dos dirigentes do MST em Pernambuco, Paulo Sérgio, a decisão da Justiça Federal foi anunciada após o movimento firmar um acordo com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). De acordo com Sérgio, representantes do movimento se reuniram com representantes da pasta nesta quarta-feira, em Brasília, e aceitaram deixar a área mediante o compromisso do governo federal de assentar cerca de 800 famílias sem terra de Pernambuco.
“Após a negociação, chegamos a um acordo com o MDA que consideramos uma conquista. Nos comprometemos a deixar a área voluntariamente. Em contrapartida, a partir da próxima semana, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária [Incra] enviará equipes para começar a cadastrar a 800 famílias que serão posteriormente assentadas em cinco áreas que o movimento indicará para que sejam destinadas à reforma agrária”, afirmou Sérgio, explicando que o acordo prevê que as cinco propriedades fiquem em Petrolina (três) e Lagoa Grande (duas).
“Já temos três destas áreas identificadas. Pretendemos identificar mais duas. Nossa meta é assentar 800 famílias: as 600 que estão participando da ocupação [da fazenda da Embrapa] e outras 200 que estão acampadas na região. Além disso, acordamos que, até que estas famílias estejam assentadas e possam começar a receber apoio técnico e financeiro, o governo federal fornecerá cestas básicas”, acrescentou o dirigente sem terra, ponderando que, embora o movimento já tenha começado a mobilizar as famílias para deixar a área da Embrapa, há o risco de que nem todas consigam deixar a propriedade até sábado. “Ainda vamos verificar com os advogados do movimento esta questão do prazo judicial, mas vamos honrar o acordo, deixar a área e permanecer vigilantes até que o governo cumpra sua parte.”
A Agência Brasil entrou em contato com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar para que a pasta comente o acordo e aguarda retorno.
Ministério da Agricultura
Na terça-feira, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, usou sua conta pessoal no Twitter para criticar a ação do MST. Fávaro, que é ligado à agropecuária e foi vice-governador de Mato Grosso, classificou a iniciativa de “invasão” e disse que é “inaceitável”.
“Sempre defendi que o trabalhador vocacionado tenha direito à terra. Mas à terra que lhe é de direito! A Embrapa, prestes a completar 50 anos, é um dos maiores patrimônios do nosso país. O agro produz com sustentabilidade; se apoia nas pesquisas e em todo o trabalho de desenvolvimento promovido pela Embrapa. Atentar contra isso está muito longe de ser ocupação, luta ou manifestação. Atentar contra a ciência, contra a produção sustentável é crime e crime próprio de negacionistas”, escreveu Fávaro.
Jornada
A ocupação da fazenda da Embrapa Semiárido por integrantes do MST não foi um ato isolado. Segundo o movimento, a ação faz parte da 26ª Jornada Nacional de Luta pela Terra e pela Reforma Agrária, que ocorre em todo o país, com “mobilizações massivas” em ao menos 18 estados.
Só em Pernambuco, o MST afirma que, até ontem, já tinha ocupado nove propriedades desde o último dia 3. Sete destas ocupações ocorreram no último fim de semana, nas cidades de Timbaúba, Jaboatão dos Guararapes, Tacaimbó, Caruaru, Glória do Goitá, Goiana, além de Petrolina.
Além de propriedades rurais e terras públicas, os sem-terra também ocuparam ou protestaram diante de escritórios do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em ao menos 12 unidades federativas (Maranhão, Rio Grande do Norte, Ceará, Sergipe, Paraíba, Mato Grosso, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Distrito Federal).
De acordo com o MST, as ocupações, marchas, vigílias, acampamentos e demais ações em defesa da reforma agrária continuarão acontecendo de forma coordenada até ao menos a próxima quinta-feira (20). Além de criticar a concentração de terras brasileiras na mão de poucas pessoas e empresas, a jornada resgata, anualmente, a memória dos 21 trabalhadores rurais sem-terra assassinados por policiais militares, em 17 de abril de 1996, em Eldorado dos Carajás (PA), no episódio que ficou conhecido como Massacre de Eldorado dos Carajás.
Mais de 600 Famílias Sem Terra ocuparam a Fazenda São Lukas, no município de Hidrolândia, em Goiás, na madrugada de hoje (25). Em nota, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) informou que a ação foi realizada por mulheres ligadas ao movimento e faz parte da Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra, que ocorre em todo país durante o mês de março. A finalidade é que a propriedade seja destinada para reforma agrária.
Segundo o MST, a área ocupada integra o patrimônio da União desde 2016. No entanto, antes, a propriedade pertencia a um grupo criminoso, condenado, em 2009, pelos crimes de exploração sexual e tráfico internacional de pessoas.
O movimento cita dados da Polícia Federal (PF), de que a quadrilha era composta a época por 18 pessoas e utilizava o local para aprisionar dezenas de mulheres, muitas delas adolescentes, que posteriormente eram traficadas para a Suíça e submetidas à exploração sexual. O esquema foi mantido por três anos e as vítimas eram, principalmente, mulheres goianas de origem humilde das cidades de Anápolis, Goiânia e Trindade. Segundo a PF, a própria fazenda foi adquirida com dinheiro oriundo do tráfico humano. Integrantes da quadrilha chegaram a estar na lista de Difusão Vermelha da Interpol para foragidos internacionais.
“Com a nossa Jornada, denunciamos o crescimento da violência contra as mulheres do campo e esta área representa o grau de violência que sofremos”, explicou em nota Patrícia Cristiane, da direção nacional do MST. Além da denúncia contra a exploração sexual das mulheres e adolescentes, a ocupação também busca que a terra cumpra sua função social.
“Exigimos que esta área, que antes era usada para violentar mulheres, seja destinada para o assentamento destas famílias, para que possamos produzir alimentos saudáveis e combater a violência”, avaliou Patrícia Cristiane.
Feminicídio
Entre os anos de 2019 e 2022 os casos de feminicídio cresceram 121,4% em Goiás. No ano passado, foram registrados 322 casos de estupro e mais de 15 mil ameaças contra mulheres no estado. Em todo país, o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) estima que apenas 8,5% dos casos de estupro não chegaram ao conhecimento da polícia.