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  • Caso Samarco: ministro diz que R$ 100 bi é o mínimo para acordo

    Caso Samarco: ministro diz que R$ 100 bi é o mínimo para acordo

    O governo espera fechar em breve o acordo de repactuação da reparação dos danos da tragédia ocorrida em Mariana (MG) em 2015. A expectativa é que sejam garantidos R$ 100 bilhões em dinheiro novo. A proposta envolve ainda R$ 30 bilhões convertidos em obrigações a serem implementadas diretamente pelas mineradoras envolvidas: Samarco, Vale e BHP Billiton. As companhias alegam já terem destinado ao processo reparatório cerca de R$ 37 bilhões.

    “Em dezembro de 2022, chegou a ser anunciado que o acordo estava encaminhado com uma previsão de R$ 49 bilhões em dinheiro novo. Depois que assumimos o governo, conseguimos mais do que dobrar isso. São R$ 100 bilhões em dinheiro novo. É a nossa última proposta. Considerando os R$ 30 bilhões em obrigações de fazer e os R$ 37 bilhões de gastos já realizados, será o maior acordo do planeta. Ao todo, são R$ 167 bilhões”, disse o ministro de Minas e Energia, Alexandre da Silveira, após participar nesta quinta-feira (20) de uma reunião no Rio de Janeiro que discutiu uma eventual retomada do horário de verão.

    “Isso seria o mínimo para poder reparar. Há impactos permanentes. Tem questões ali que dinheiro nenhum no mundo vai conseguir mudar”, acrescentou. A barragem que se rompeu integrava um complexo minerário da Samarco localizado na zona rural do município de Mariana. Na ocasião, cerca de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos escoaram pela Bacia do Rio Doce. Dezenove pessoas morreram e houve impactos às populações de dezenas de municípios até a foz no Espírito Santo.

    Em março de 2016, a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, a União e os governos mineiro e capixaba firmaram acordo formalizado por meio de um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), que estabeleceu uma série de ações reparatórias. O documento trata de questões variadas como indenizações individuais, reconstrução de comunidades destruídas, recuperação ambiental, apoio aos produtores rurais, etc. Todas as medidas são conduzidas pela Fundação Renova, criada com base no TTAC. As mineradoras são responsáveis por indicar a maioria dos membros na estrutura de governança da entidade. Cabe a elas também garantir os recursos necessários.

    Passados oito anos e sete meses do episódio, ainda há diversos problemas não solucionados. Tramitam no Judiciário brasileiro mais de 85 mil processos entre ações civis públicas, ações coletivas e individuais. Em busca de uma solução, as negociações para uma repactuação do acordo se arrastam há três anos. Até o momento, não houve consenso.

    No início do mês, o presidente Lula chegou a anunciar que o acordo sairia em outubro. O ministro Alexandre da Silveira, porém, tirou o foco dessa possibilidade. “Quero deixar registrado: eu nunca afirmei prazo. Estou trabalhando para que seja o mais rápido possível, mas ainda faltam algumas questões objetivas”, afirmou. Segundo ele, estão sendo discutidas questões técnicas e jurídicas. Também não há ainda consenso sobre prazos e forma de pagamento.

    Modelo Brumadinho

    Silveira descartou que o acordo seja inspirado nos moldes estabelecidos para a reparação da tragédia ocorrida em Brumadinho (MG), no ano de 2019. No episódio, a ruptura de uma barragem da Vale ceifou 272 vidas e gerou danos ambientais na bacia do Rio Paraopeba. O acordo de reparação foi selado em 2021 prevendo um aporte de R$37,68 bilhões.

    Segundo o ministro, interesses eleitorais influenciaram a inclusão de medidas que beneficiaram diferentes cidades do estado, mesmo aquelas mais distantes da área atingida, e os moradores de Brumadinho ficaram desamparados. O acordo garantiu recursos para grande obras que ficaram sob gestão do Executivo mineiro, como as reformas ou conclusões de seis hospitais regionais e a construção de um Rodoanel que contornará a região metropolitana de Belo Horizonte.

    “Na minha opinião, houve um crime de lesa-pátria contra o povo de Brumadinho e a população atingida. Hoje existe um pânico em Brumadinho porque em 2026 se encerram os auxílios mensais recebidos pelas famílias e o financiamento da saúde pública da região que é feita pela vale. Os recursos foram pulverizados no estado. E os impactos emocionais, mentais e na saúde pública são inexoráveis. Eu conheço bem a realidade”, diz.

    Apesar das críticas, um novo acordo para Mariana deverá ter uma similaridade na comparação com o que foi feito para Brumadinho. O envolvimento de uma entidade nos moldes da Fundação Renova deve ser descartado. De outro lado, deverão ser garantidos valores para as indenizações individuais. No caso de Brumadinho, elas ficaram de fora do acordo e passaram a ser tratadas separadamente.

    Nova gestão

    No fim de agosto, o conselho de administração da Vale elegeu um novo presidente: Gustavo Pimenta foi escolhido para substituir Eduardo Bartolomeo. A mudança parece ter gerado otimismo no governo para um desfecho nas negociações. O ministro disse que espera se sentar com o novo presidente da mineradora em breve.

    “A Vale viveu um momento de acefalia de liderança. Falei isso e disseram até que eu estava querendo interferir na escolha do novo presidente. E por mim poderia ser José, Maria, Joaquim. O importante era ter alguém para responder pela empresa. Eu acho que a Vale tem um modelo falido no mundo. Eu sou absolutamente crítico do modelo de corporation de capital pulverizado, porque você nunca sabe com quem que você está conversando. Um empurra pro outros e ninguém responde por nada. Quando se trata do interesse do povo brasileiro, ficam empurrando com a barriga. Nós não vamos deixar isso acontecer. Estamos extremamente dedicados para que haja reparação dos danos ao povo mineiro e ao povo capixaba”, disse Silveira.

    Procurada pela Agência Brasil, a Vale não comentou a manifestação do ministro. A mineradora reiterou o comunicado ao mercado divulgado no dia 11 de setembro. “Até o momento, nenhum acordo definitivo foi alcançado. A Companhia espera chegar a um acordo final no processo de mediação em outubro de 2024, o qual será devidamente divulgado ao mercado”, registra o texto.

    Entidades representativas dos atingidos têm acompanhado os anúncios envolvendo a repactuação de forma crítica. Elas questionam a realização de tratativas sob sigilo, sem a presença das lideranças das comunidades impactadas. Conforme uma carta divulgada no mês passado pelo Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), os R$ 100 bilhões seriam insuficientes para garantir uma reparação integral a todas as famílias atingidas. “No exterior, os atingidos estão processando a BHP em busca de indenizações e a conta certamente será muito maior”, destaca o documento em referência a uma ação que tramita no Reino Unido.

    Edição: Aline Leal

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  • Nova reviravolta na batalha judicial após o rompimento da barragem de Mariana

    Nova reviravolta na batalha judicial após o rompimento da barragem de Mariana

    A batalha judicial em torno do rompimento da barragem de Mariana ganhou um novo capítulo com a revelação de que a BHP Billiton financiou uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir que municípios brasileiros processassem a mineradora no exterior.

    A mineradora anglo-australiana, uma das responsáveis pela tragédia de Mariana, assinou um acordo no Reino Unido se comprometendo a não mais apoiar a ação no STF. A decisão da BHP ocorre após a divulgação de documentos que comprovariam o financiamento da empresa ao Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), autor da ação.

    O Ibram, por sua vez, buscava tornar inconstitucional a possibilidade de municípios brasileiros promoverem ações judiciais no exterior, alegando que isso fere a soberania nacional. No entanto, a ação foi vista por muitos como uma tentativa da mineradora de evitar a responsabilização por seus atos e de limitar o acesso das vítimas à justiça.

    Insatisfeitos com o processo reparatório no Brasil, milhares de atingidos pela tragédia de Mariana e Brumadinho buscaram a Justiça britânica e holandesa para responsabilizar as empresas envolvidas. A decisão da BHP de financiar a ação no STF foi vista como uma tentativa de obstruir essas ações e limitar os direitos das vítimas.

    Com a revelação do financiamento da BHP, a mineradora se viu pressionada a assinar um acordo no Reino Unido, comprometendo-se a não mais apoiar a ação no STF. A decisão foi celebrada pelos atingidos, que veem nessa vitória um passo importante para garantir a reparação dos danos causados pela tragédia.

    Enquanto a batalha judicial se intensifica no exterior, no Brasil o processo reparatório ainda enfrenta diversos desafios. O Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), firmado entre as mineradoras, a União e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, tem sido alvo de críticas por parte dos atingidos, que consideram os valores indenizatórios insuficientes.

    A tentativa de repactuação do TTAC também tem enfrentado dificuldades, com as mineradoras e o governo federal divergindo sobre os valores a serem destinados à reparação dos danos.

    Com a decisão da BHP de se retirar da ação no STF, espera-se que o processo reparatório avance no Brasil e que os atingidos recebam a reparação justa por todo o sofrimento causado pela tragédia de Mariana. No entanto, a luta ainda está longe de acabar, e os atingidos continuam mobilizados em busca de seus direitos.

  • AGU pede que mineradoras paguem R$ 79 bilhões por danos em Mariana

    AGU pede que mineradoras paguem R$ 79 bilhões por danos em Mariana

    A Advocacia-Geral da União (AGU) pediu à Justiça Federal de Minas Gerais que obrigue as mineradoras Samarco, Vale e BHP a depositar em juízo, no prazo de 15 dias, R$ 79,6 bilhões em reparação a prejuízos. As empresas respondem pelo rompimento da barragem de Fundão em Mariana (MG), ocorrido em novembro de 2015.

    A quantia corresponde à atualização monetária da condenação das empresas por danos morais coletivos, no valor de R$ 47,6 bilhões. A sentença foi proferida pela 4ª Vara Federal Cível e Agrária de Belo Horizonte, em ação civil pública aberta pelo Ministério Público Federal (MPF).

    A AGU quer que a Justiça Federal determine o cumprimento imediato da sentença, mesmo que ainda haja recursos das empresas pendentes de julgamento. “Já é hora do Estado e da sociedade brasileira receberem uma resposta concreta”, diz a petição apresentada pela União.

    “Este não é um processo judicial ordinário, que permite que aguardemos o trânsito em julgado da decisão para que ela tenha efeitos práticos. Não podemos esperar mais uma década. É premente a execução provisória do título, pois o meio ambiente e as pessoas afetadas têm urgência na reparação e as causadoras do dano não podem permanecer em situação de conforto, atuando de forma a procrastinar os processos e a responsabilização pelos efeitos de seus atos.”

    Se o valor não for depositado em juízo no prazo, a União pede que a Justiça determine o bloqueio de ativos financeiros das empresas e, caso a medida seja insuficiente para obtenção do valor cobrado, que seja ordenado: penhora de ações com cotação em bolsa de valores; bloqueio de bens imóveis; bloqueio da distribuição de lucros e dividendos a acionistas; e penhora de 5% do faturamento.

    Negociações

    Passados mais de nove anos da tragédia, considerada o maior desastre ambiental causado pelo setor de mineração no Brasil, as mineradoras e as autoridades não alcançaram um entendimento para a reparação dos danos causados.

    Ocorrido em 5 de novembro de 2015, o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco, localizada na zona rural de Mariana (MG), liberou no ambiente 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério. Dezenove pessoas morreram. A lama devastou comunidades e deixou um rastro de destruição ambiental ao longo da bacia do Rio Doce, chegando até a foz no Espírito Santo.

    Para reparar os danos causados na tragédia, um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) foi firmado em 2016 entre o governo federal, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, a Samarco e as acionistas Vale e BHP Billiton. Com base nele, foi criada a Fundação Renova, entidade responsável pela gestão de mais de 40 programas. Todas as medidas previstas deveriam ser custeadas pelas três mineradoras.

    Há negociações em andamento para repactuar o processo reparatório. O objetivo é selar um novo acordo que solucione mais de 80 mil processos judiciais acumulados. Nos processos, existem questionamentos sobre a falta de autonomia da Fundação Renova, os atrasos na reconstrução das comunidades destruídas, os valores indenizatórios e o não reconhecimento de parcela dos atingidos, entre outros tópicos.

    Na semana passada, a União e o Espírito Santo rejeitaram uma nova proposta de R$ 90 bilhões para reparação integral dos danos provocados pela tragédia de Mariana (MG). A quantia englobaria tanto danos materiais como os danos morais coletivos e foi considerada insuficiente pelas autoridades.

    O governo mineiro adotou posicionamento diverso e avaliou que houve avanços na nova proposta. Manifestou interesse em negociar com base nela, mas acrescentou que irá solicitar ajustes às mineradoras.

    Nas negociações, mediadas pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região, os governos pleiteavam o total de R$ 126 bilhões e tinham o apoio das instituições de Justiça que também compõem a mesa: Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública da União, além dos ministérios públicos e das defensorias públicas dos dois estados atingidos.

    Edição: Denise Griesinger

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  • Caso Samarco: sistema indenizatório criado em 2020 fecha em 10 dias

    Caso Samarco: sistema indenizatório criado em 2020 fecha em 10 dias

    O controverso sistema criado em 2020 para pagar indenizações individuais aos atingidos pelo rompimento da barragemda mineradora Samarco,em Mariana (MG), será fechado em 10 dias. O chamado sistema indenizatório simplificado (Novel) foi alvo de contestações judiciais do Ministério Público Federal (MPF) quando foi instituído.

    Entidades representativas dos atingidos também chegaram a criticar, em diferentes ocasiões, dificuldades envolvendo o sistema. Por outro lado, a maior parte das indenizações individuais pagas até o momento se deu pelo Novel.

    O fechamento do sistema indenizatório foi determinado no final de julho pelo juiz Vinicius Cobucci, do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), que assumiu o caso recentemente e adotou uma posição divergente dos magistrados anteriores. Para Cobucci, o Novel “padece de nulidades absolutas” e “apresenta sinais claros de esgotamento”. O magistrado estabeleceu que novos registros no sistema poderão ser incorporados até as18h do dia 29 de setembro. Após essa data, somente poderá ocorrer análise dos casos já incluídos.

    MPF

    Embora seja crítico do sistema Noveldesde o início, o MPF avalia que a decisão foi tomada de forma abrupta e recorreu. A instituição considera que a situação gera incertezas acerca do processo indenizatório.Achamos que o sistema é ruim, mas, nesse momento de absoluta injustiça, depois de oito anos, ele é o único caminho que leva algum dinheiro para os atingidos”, disse àAgência Brasilo procurador Carlos Bruno Ferreira da Silva.

    “Realmente pagou para alguns atingidos. Mas pagou para muita gente que não é atingido. E deixou muitos atingidos de fora. É um processo que começa pelo Baixo Guandu, que está longe de ser um dos municípios mais afetados nesta terrível tragédia. E é um modelo sem muitos critérios claros.

    Em sua visão, o fechamento do sistema prejudica moradores de cidades mais afetadas. Ele cita Mariana, Barra Longa e Governador Valadares. “Justamente quando o Novel começava a rodar nesses municípios, veio essa decisão. O MPF recorreu para que as pessoas dessas localidades não sejam tratadas sem a justiça necessária. O Novel tem que continuar aberto para permitir um funcionamento semelhante ao que ocorreu em Baixo Guandu, que evidentemente foi o município mais favorecido”, acrescentou.

    Barragem

    A barragem da Samarco se rompeuem novembro de 2015. A estrutura, localizada em Mariana (MG), liberou uma avalanche de rejeitos que alcançou o Rio Doce e escoou até a foz, causando impactos socioambientais e socioeconômicos em dezenas de municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo. Dezenove 19 pessoas morreram.

    No início de 2016, um acordo para reparação dos danos foi firmado entre o governo federal, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, a Samarco e as acionistas Vale e BHP Billiton. Através dele, foi criada a Fundação Renova, entidade responsável pela gestão de mais de 40 programas, entre os quais o de indenização individual. Todas as medidas previstas devem ser custeadas pelas três mineradoras.

    Quando o Novel foi criado, em 2020, sobravam críticas sobre a morosidade do processo indenizatório implementado até então. Na época, relatórios da Ramboll, uma das consultorias externas independentes que assessoram o MPF, apontavam limitações passados quase cinco anos da tragédia: apenas um terço das famílias cadastradas em toda a bacia do Rio Doce haviam recebido alguma indenização.

    Reflorestamento de áreas atingidas em MarianaReflorestamento de áreas atingidas em Mariana

    Reflorestamento de áreas atingidas em Mariana – Imagem cedida pela Fundação Renova

    O Novel foiinstituído em outubro de 2020, inicialmente para Baixo Guandu (ES) e Naque (MG), conforme decisões do juiz federal Mário de Paula Franco Júnior, que estava à frente do caso na época. Ele apontou a necessidade de simplificar o processo indenizatório para torná-lo possível e fixou uma tabela com valores pré-definidos para diferentes categorias impactadas. Também determinou que a Fundação Renova criasse uma plataforma online por meio do qual os advogados de cada atingido poderiam apresentar o pedido de adesão de seu cliente. Eles deveriam anexar documentos comprobatórios para serem analisados.

    A medida foi considerada pela Fundação Renova como uma saída para destravar o pagamento das indenizações, permitindo flexibilizar a documentação comprobatória de algumas categorias de atingidos, sobretudo de trabalhadores informais como artesãos, carroceiros, lavadeiras, pescadores, areeiros e outros. Também abriu caminho para o pagamento a donos de pousadas e embarcações. Os valores poderiam variar de R$71 mil até R$ 567,5 mil.

    Gradativamente, mais cidades foram incluídas em novas sentenças assinadas por Mário de Paula, que garantiuem todas elas o mesmo prazo de adesão fixado para Baixo Gandu e Naque. Desta forma, o volume de recursos destinados às indenizações individuaiscresceu rapidamente.

    Em pouco mais de um ano, o Novel já respondia por mais de 70% de todas as indenizações pagas aos atingidos. Posteriormente, o sistema foi estendido para toda a bacia do Rio Doce. Segundo dados atualizados em julho pela Fundação Renova, já foram repassados mais de R$ 10 bilhões a cerca de 95,7 mil atingidos. Os números indicam um valor médio de R$ 104 mil por atingido.

    Controvérsias

    Enquanto os pagamentos ocorriam, o Novelfoi alvo de críticas e contestações. As controvérsias foram novamente evidenciadas na decisão judicial que determinou seu fechamento. O juiz Cobucci reconheceu que a decisão gera inconvenientes, mas afirmou estar convencido de que o sistema não encontra amparo legal. Além disso, ele observou que há um ajuizamento crescente de ações individuais pelos atingidos os quais tiveram seu pleito negado.

    O ponto central do argumento de Cobucci aponta que as comissões de atingidos criadas para pleitear a adesão ao Novel não possuem legitimidade processual. Elas seriam agrupamentos informais e não associações devidamente constituídas na forma fixada pelo Código de Processo Civil.

    O juiz também observou que o funcionamento das comissões foi definido por meio de acordo firmado em 2018 para remodelar a governança do processo de reparação. Conhecido como TAC Gov, ele idealizou as comissões como entidades locais baseadas na auto-organização, por meio das quais os atingidos manifestariam seus anseios e levariam suas demandas ao poder público, ao Ministério Público e à Defensoria Pública. Seria, portanto, uma estrutura extrajudicial. Desta forma, o Novel teria sido criado e estendido a partir do pedido de entidades sem legitimidade para apresentar um pleito judicial, o que torna o sistema nulo.

    Conforme a decisão do juiz, outro problema seria de ordem sistêmica. Ele observa que o Judiciário não teve qualquer participação na concepção da plataforma, a não ser por meio de diretivas. Todo este trabalho ficou a cargo da Fundação Renova. O juiz pontua que, legalmente, qualquer sistema utilizado pelo Judiciário precisaria ser homologado e estar sob a supervisão do respectivo tribunal.

    Além disso, a instância recursal no âmbito do Novel ficou a cargo da empresa de consultoria Kearney, que foi nomeada pelo juiz Mário de Paula como responsável pela perícia.Na prática, o atingido que tivesse sua adesão negada pela Fundação Renova, poderia apresentar recurso que seria analisado pela Kearney.

    Para Cobucci, foram atribuídas prerrogativas que não correspondem à função legal de perito judicial. “A Kearney exerceu atividade de cognição para aferição do direito. A função da perícia é a produção de prova técnica, para a qual o magistrado não dispõe de conhecimentos especializados. Afirmar se o atingido tem ou não direito à indenização é tarefa que cabe ao Judiciário diretamente”, escreveu.

    O juiz também viu problemas no tabelamento de valores por categoria. “Por mais que haja essa otimização da padronização, a situação individual de cada atingido deveria ser analisada de alguma forma”, acrescentou.

    Cobucci também escreveu, na decisão, que o sistema surgido com o objetivo de simplificar o processo indenizatório se mostrou burocrático e repleto de regras, registrando ainda desencontro de informações e divergências interpretativas de analistas da Fundação Renova. Em sua visão, a Justiça brasileira tem plenas condições de lidar com as repercussões da tragédia e que a inovação instituída pelo Novel não era necessária.

    Repactuação

    Procurada pelaAgência Brasil, a Fundação Renova informou que acatará a decisão e deixará de aceitar novos requerimentos no dia 29 de setembro.

    “Até a data estabelecida pela Justiça, o sistema continuará funcionando normalmente para as localidades que ainda não tenham encerrado o prazo de adesão. Também não haverá alterações nos procedimentos”, afirmou.

    A entidade também assegurou que a análise de requerimentos já abertos continuará normalmente. As mineradoras também foram procuradas para comentar a decisão, mas orientaram a reportagem a entrar em contato com a Fundação Renova, já que a entidade é a administradora do Novel.

    O fechamento do sistema ocorre em um momento onde estão em curso tratativas para umarepactuação do processo de reparação. Passados quase oito anos, há muita insatisfação com as medidas implementadas e acumulam-se ações judiciais envolvendo não apenas questões indenizatórias. Até hoje, as obras de reconstrução das duas comunidades mais destruídas não foram totalmente concluídas.

    O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) chegou apedir a extinçãoda Fundação Renova por entender que ela não tem a devida autonomia frente às três mineradoras.

    Os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, bem como o governo federal, também já manifestaram incômodo com o andamento da reparação. Diante deste cenário, as diferentes partes envolvidas discutem um novo acordo que seja capaz de oferecer uma solução para mais de 85 mil processos judiciais que tramitam relacionados à tragédia. As tratativas são conduzidas na Justiça Federal. Foi fixada a data de 5 de dezembro de 2023 como prazo final para se chegar a um acordo.

    Recurso

    A implantação do novel em 2020 havia sido contestada emrecurso do MPF, que apontou irregularidades, considerou alguns valores baixos e criticou a legitimidade processual de comissões de atingidos até então inexistentes. Com a aceitação do Novel sem contestações pela Fundação Renova, também foi levantada a suspeita de lide simulada, que ocorre quando o processo é aberto após acordo prévio entre advogados de ambas as partes.

    A decretação de sigilo pelo juiz Mário de Paula também foi contestada. O MPF observou que dessa forma demais atingidos interessados no processo não poderiam ter acesso às informações. A instituição avaliou ainda que deveria ter sido intimada para se manifestar antes da tomada de decisão, uma vez que possui a função constitucional de atuar na defesa dos direitos difusos. Na época, o recurso do MPF foi indeferido em decisão de segunda instância.

    Em uma reunião ocorrida em maio com os atingidos, o procurador Carlos Bruno chegou a levantar a hipótese de que o Novel foi criado com o objetivo de dar uma resposta ao processo aberto no Reino Unido.

    “O objetivo eramostrar ao judiciário inglês que alguma coisa aqui funcionava”, disse na ocasião. Ele se referia àação movida por atingidos representados pelo escritório Pogust Goodhead. Eles processaram a BHP Billiton, que tem sede em Londres, e argumentaram que a Justiça brasileira era ineficiente.

    Com os avanços do Novel, um juiz britânico de primeira instância chegou a determinar o arquivamento do processo.Os atingidos conseguiram depois reverter a decisão. Audiências que vão avaliar se a BHP Billiton, bem como a Vale, têm responsabilidades pela tragédiaestão marcadas para outubro de 2024.

    Entre os atingidos,houve reclamações.

    “Para quem não teve que correr da lama, que não teve a casa ou as terras duramente afetadas, as quantias podem ser bem-vindas, mas vejo que a Samarco e suas acionistas Vale e BHP Billiton estão usando o sistema de indenização para divulgar números fabulosos e estimular aqueles atingidos da linha de frente a aderir. Alguns cederam e aderiram, mas é uma proposta de exclusão. Não cobre 10% do meu prejuízo”, disse àAgência Brasil,no ano passado o produtor rural Marino D’Ângelo, integrante da comissão dos atingidos da cidade de Mariana. Ele afirmou que o Novel não atendia de forma justa quem teve os maiores danos.

    Vida suja de lama

    Apropriedade de Marino,criador de gado leiteirono distrito de Paracatu de Baixo, em Mariana, estava no caminho dos rejeitos.

    “Entendo que todos têm direito. Em Mariana, todos são de alguma forma atingidos. A prioridade deveria ser indenizar as pessoas que tiveram a vida suja de lama. Nós, que empobrecemos, ainda vivemos uma vida que nos foi imposta. Eu hoje vivo em uma moradia provisória, e minha atividade econômica vive um retrocesso”, afirmou, na ocasião.

    Atingidos chegaram a criticar a atuação do juiz Mário de Paula e apontarampossível alinhamento com os interesses da Fundação Renova. O comportamento do magistrado também levou o MPF e outras instituições de Justiça a apresentaram uma arguição de suspeição para afastá-lo do caso. O pedido, no entanto, foi indeferido pela Justiça Federal. Mário de Paula deixou o caso apenas em junho do ano passado, quando foi promovido. Ele foi substituído por Michel Avelar, que acabou sendo também promovido em julho deste ano, permitindo assim a redistribuição do processo para o juiz Vinicius Cobucci.

    Mariana

    Epicentro da tragédia, o município de Mariana foium dos últimos incluídos no sistema Novel, o que ocorreu com uma decisão judicial do juiz federal Mário de Paula, em setembro de 2021. A medida pegou o Ministério Público emMinas Gerais (MPMG) de surpresa. Isso, porque, diferentemente do que ocorria em todas as demais cidades da bacia do Rio Doce, as indenizações dos moradores de Mariana até então vinham sendo tratadas exclusivamente na Justiça estadual. A inclusão de Mariana no Novel atendeu pedido judicial feito por uma nova comissão de atingidos registrada em cartório meses antes da decisão.

    “A comissão, que foi constituída para validar esse processo em Mariana, é ilegítima. Ela não foi eleita pela comunidade”, criticou, na época, o morador Marino D’Ângelo. Após a tragédia, Mariana havia sido a primeira cidade a ter uma comissão de atingidos, que foi constituída a partir de assembleias abertas a participação de todos os moradores dos distritos devastados. O exemplo foi seguido por outras cidades.

    Com o surgimento do Novel, diversas novas comissões ao longo da bacia do Rio Doce foram sendo registradas em cartório, muitas das quais foram formadas por poucas pessoas, sem deliberação pública.

    Para o procurador Carlos Bruno, todo atingido tem direito de apresentar suas reivindicações e de se organizar, mas ele pontua que pequenos grupos não podem pretender representar toda a região onde atuam. Ele diz que o MPF vem trabalhando com assessorias técnicas escolhidas pelos próprios atingidos em busca de um caminho para unificar todas as comissões de cada território. O procurador defende a organização popular e democrática.

    “Quando algumas comissões tem o privilégio de ascender em alguns espaços, como por exemplo, peticionar nos autos e ser representante no Novel, se permite que essas comissões, que não estão abertas à população como um todo, ganhem posições de destaque. Então, para mim, o caminho para as comissões serem cada vez mais populares é aumentar a democracia interna”, destacouo procurador.

    Edição: Maria Claudia
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  • Ministro do Meio Ambiente anuncia repactuação de acordo de Mariana

    Ministro do Meio Ambiente anuncia repactuação de acordo de Mariana

    O ministro do Meio Ambiente (MMA), Joaquim Leite, reafirmou que está em fase final de negociação a repactuação do acordo para compensar os danos ambientais e econômicos decorrentes do rompimento da barragem de Mariana (MG), ocorrido em novembro de 2015. Entre as principais medidas estão a criação de dois fundos.

    Um dos fundos terá caráter estadual e será mantido pelos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. O foco será em infraestrutura, especialmente saneamento básico: água, esgoto, resíduos sólidos e drenagem urbana.

    O outro fundo será federal – o Fundo Rio Doce Empreendedor, coordenado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – e será voltado ao fomento do empreendedorismo verde na região, com juros zero e prazo de pagamento e carência muito superiores aos de mercado. O foco será no desenvolvimento econômico. A Caixa também vai atuar com foco no micro e pequeno empresário em projetos de pagamento por serviços ambientais, tratamento de lixo e reciclagem, créditos de carbono, energia limpa, hidrogênio verde e bioeconomia.

    Segundo o ministro, as reuniões ocorrem no Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Leite garantiu que as negociações caminham bem e a proposta por parte das empresas Samarco, Vale e BHP Billiton traz recursos extras em “valores muito significativos” – bilhões de reais – e em prazos de desembolso que atendem aos requisitos mínimos. Condições que foram aceitas por parte do governo federal e que estão aguardando apenas a confirmação dos estados e de suas procuradorias e defensoria. “Nós estamos em vias de concluir essa repactuação para trazer valores efetivos e alterar a realidade daquela região”, disse o ministro em entrevista à Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

    De acordo com Joaquim Leite, a situação ainda é crítica em toda extensão de 700 quilômetros (km) do Rio Doce. Muitas vítimas não retornaram às suas casas e seguem sem receber indenizações por danos, peixes seguem contaminados, e a economia continua totalmente debilitada.  “Acho que a gente tem de olhar muito para os atingidos, os pescadores, para toda aquela atividade econômica que existia e que foi afetada por essa tragédia e, de alguma forma, fazer as reparações necessárias em relação, especialmente, ao meio ambiente, mas uma compensação monetária relevante para alterar toda essa região e criar uma nova economia na região”, disse na entrevista ao programa. Segundo ele, as negociações caminham para sua reta final, buscando que este seja o “maior acordo ambiental do mundo”.

    Encontro do G20

    Joaquim Leite também tratou do encontro de ministros do Meio Ambiente sobre energia e sustentabilidade climática do G20, grupo formado pelas maiores economias do mundo. Segundo ele, um dos principais resultados é a definição de uma estrutura de padronizações de créditos de carbono de florestas nativas. “O Brasil tem uma característica de aproveitar e poder ser exportador desse crédito. Então para nós foi bastante importante a gente começar a desenhar esse mercado global.” Ele disse que o Brasil está fechando acordos bilaterais com diversos países nesse sentido.

    Segundo ele, o Brasil cobra dos países desenvolvidos mais recursos, transferências de financiamentos e transferência de tecnologia “para a gente criar uma nova economia verde”. Ele falou também sobre o potencial de geração de energia brasileira sobretudo eólica e solar e biomassa, sendo que essas três devem quintuplicar sua produção.

    Edição: Juliana Andrade

  • Meio Ambiente anuncia fundos para compensar perdas em Mariana

    Meio Ambiente anuncia fundos para compensar perdas em Mariana

    O Ministério do Meio Ambiente (MMA) informou que está em fase final de negociação a criação de dois fundos para compensar os danos ambientais e econômicos decorrentes do rompimento da barragem de Mariana (MG), ocorrido em novembro de 2015.

    Um dos fundos terá caráter estadual e será mantido pelos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. O foco será em infraestrutura, especialmente saneamento.

    O outro fundo será federal – o Fundo Rio Doce Empreendedor, coordenado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – e será voltado ao fomento do empreendedorismo verde na região com projetos de pagamento por serviços ambientais, tratamento de lixo e reciclagem, créditos de carbono, energia limpa, hidrogênio verde e bioeconomia.

    “As negociações caminham para sua reta final, buscando que este seja o maior acordo ambiental do mundo”, disse o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite. Segundo o ministro, buscar uma reparação justa, célere e efetiva para os atingidos e para toda a região é obrigação do poder público.

    Leite citou que, nos últimos meses, um grupo formado por ele, em conjunto com o presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luiz Fux, o advogado-geral da União, Bruno Bianco, o procurador-geral da União, Augusto Aras, o ministro do Tribunal de Conta da União (TCU) Jorge Oliveira, está trabalhando para encontrar uma solução para repactuação do Acordo do Rio Doce. “Os estados e suas procuradorias também estão empenhados na busca de novos valores”, disse.

    Entenda o caso

    A tragédia do rompimento da barragem da mineradora Samarco – que tem como principais acionistas as empresas Vale e BHP Billiton – está prestes a completar sete anos. Em 5 de novembro de 2015, a ruptura liberou uma avalanche de rejeitos que alcançou o Rio Doce e escoou até a foz, causando diversos impactos socioambientais e socioeconômicos em cidades mineiras e capixabas, além de 19 mortes.

    Em 2016, por meio do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC),  foi firmado um acordo para reparação de danos. A gestão de todas as ações ficou a cargo da então criada Fundação Renova, entidade que é mantida com recursos da Samarco, da Vale e da BHP Billiton. A entidade já consumiu R$ 23 bilhões em valores atualizados. “Os gastos foram completamente ineficientes, sem resultados reais para as pessoas, para a natureza e para a econômica local”, informou o ministério.

    De acordo com o MMA, a situação é crítica em toda a extensão de 700 quilômetros (km) do Rio Doce, da cidade de Mariana em Minas Gerais, até a foz no Espírito Santo. Até agora muitas vítimas não retornaram às suas casas e seguem sem receber indenizações por danos.

    Edição: Juliana Andrade

  • Comissão externa trabalha por repactuação de acordos sobre desastre ambiental em Mariana

    Comissão externa trabalha por repactuação de acordos sobre desastre ambiental em Mariana

    Tragédia em Mariana matou 19 pessoas, destruiu casas e poluiu o rio Doce

    A comissão externa da Câmara que acompanha a repactuação dos acordos entre as mineradoras e os atingidos pelo rompimento da barragem do Fundão, no município de Mariana, em 2015, pediu ao Ministério Público de Minas Gerais que as posições dos movimentos sociais sobre o crime socioambiental sejam incluídas no relatório final do órgão sobre o assunto.

    A repactuação dos danos socioambientais e econômicos decorrentes do acidente que causou 19 mortes e a degradação de parte do rio Doce em Minas Gerais e no Espírito Santo é uma reivindicação da sociedade civil. A Fundação Renova foi criada pelas empresas Vale, Samarco e BLP Billinton para cuidar da reparação aos atingidos.

    Obrigações das mineradoras
    Segundo o coordenador da comissão externa, deputado Rogério Correia (PT-MG), apesar da mediação da Renova, o rio Doce ainda não foi limpo e não estão prontas as novas moradias das pessoas que tiveram as casas atingidas pela lama tóxica. A ideia é que a repactuação dos acordos faça com que as mineradoras cumpram com as obrigações para atenuar os estragos.

    Integrantes da comissão externa já estiveram com o presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Luiz Fux, que é também o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Já se reuniram com vereadores das cidades afetadas e visitaram povoados atingidos pelo desastre ambiental. O deputado Rogério Correia contou como foi o encontro com o procurador Carlos Bruno Ferreira da Silva, do Ministério Público de Minas Gerais.