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  • Sotaque cuiabano: muito além do “tchuva” e “cadju”

    Sotaque cuiabano: muito além do “tchuva” e “cadju”

    O sotaque cuiabano é muito mais do que um simples modo de se comunicar; é uma verdadeira expressão cultural, reflexo da história e da diversidade que moldaram a região de Cuiabá ao longo dos séculos.

    Marcado pela influência indígena, portuguesa, africana e até árabe, o dialeto cuiabano é um mosaico que revela a essência e a identidade do povo cuiabano. Com expressões singulares e características peculiares como a troca do “l” pelo “r” e a informalidade carismática, o falar cuiabano vai além das palavras: ele conta histórias e carrega memórias.

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    Desde os tempos dos Bororos, passando pela chegada dos bandeirantes e pela mistura com outras culturas, a linguagem local evoluiu, mas nunca perdeu sua autenticidade. Hoje, preservar essa forma de falar é preservar um patrimônio cultural inestimável, que conecta o presente às raízes históricas e culturais de Mato Grosso.

    Legado indígena no sotaque cuiabano

    O dialeto cuiabano tem suas origens nas influências indígenas da etnia Bororo, que habitava a região antes da chegada dos colonizadores. Os Bororos eram mestres na pesca e na conexão com a natureza, o que se reflete no vocabulário e nas expressões locais. Por exemplo, o termo “Ikuêbo”, em dialeto Bororo, descrevia o brilho do sol nas águas do córrego da região, hoje conhecido como Prainha.

    Com a chegada dos bandeirantes no século XVIII, as influências portuguesas se misturaram às indígenas. O sotaque característico cuiabano, com o uso de “d” e “t” em palavras como “tchuva” e “cadju”, tem origem no português falado no norte de Portugal. Essa fusão deu origem a um estilo único de comunicação, que ainda é ouvido nas ruas de Cuiabá.

    Patrimônio cultural e o sotaque cuiabano

    A singularidade do falar cuiabano está nas expressões e regionalismos que o tornam tão especial. Frases como “minina, num tê conto nada!” e “foi um ranca rabu danadu” exemplificam a criatividade e a vivacidade da linguagem local. Além disso, a influência africana se faz presente em palavras como “coxipó”, que significa “rio dos peixes” em tupi-guarani, e em expressões herdadas do português mouro, como “tchuva de caju”.

    Preservar o dialeto cuiabano é essencial para manter viva a história e a cultura da região. Ele não é apenas um modo de falar, mas um reflexo da identidade e da resistência cultural de Cuiabá. Valorizar essa herança é garantir que as futuras gerações compreendam e celebrem as raízes de sua terra.

    Expressões que marcam a identidade mato-grossense

    Sotaque cuiabano
    Sotaque cuiabano

    O dialeto cuiabano é uma verdadeira riqueza cultural, repleto de expressões únicas que refletem a história e a identidade do povo mato-grossense. Palavras como “abeíudo” (curioso), “baguá” (metido a valente) e “canhá” (evitar doação) fazem parte do cotidiano dos cuiabanos e compõem um vocabulário rico e peculiar.

    O falar cuiabano é marcado pela informalidade e pela criatividade. Expressões como “bamu tchegá” (convite para se aproximar), “desimbestô” (saiu correndo) e “na bucha” (na presença da pessoa) revelam a espontaneidade e o humor do povo cuiabano.

    O dialeto cuiabano é um patrimônio cultural que precisa ser valorizado e preservado. Ao conhecer e utilizar essas expressões, estamos contribuindo para manter viva a tradição e a identidade da nossa região.

    Algumas expressões cuiabanas e seus significados:

    • Abeíudo: curioso
    • Arca-caída: doença regional
    • Baguá: metido a valente
    • Bamu tchegá: convite para se aproximar
    • Banbeá: afrouxar
    • Cacoá: debochar
    • Canhá: evitar doação
    • Desimbestô: saiu correndo
    • Distrinchano: explicando
    • Imbuchada: grávida
    • Incafifado: incutido
    • Ladino: esperto
    • Leitero: puxa-saco
    • Malemá: mais ou menos
    • Mequetrefe: sem valor
    • Na bucha: na presença da pessoa
    • No ôio: no centro

    Dicionário Cuiabano

    Ah! Uuum – Expressão que indica indignação, concordância ou não. É aplicada dependendo da situação E a entonação da voz muda.
    Ex: ‘Ah! Uuum. Pára cô isso.”

    Agora quãndo!? – Interjeição de duvida.
    Ex: ‘Maria teve três namorado… hummm.. agora quando!?”

    Agora o quequeesse! – Espanto
    Ex: ‘Agora o quequeesse, mas que cabelo mais tchum tchum…”

    Aguacêro – Bastante chuva, poças de água.
    Ex: ‘Não deu pra ir lá, tava o maior aguacero na estrada.”

    Arroz-de-festa – Denominação de quem não perde nenhuma festa . Está sempre em festa. Ex: ‘Ele vai em casamento, batizado, 1a comunhão, crisma, formatura,.. . é um arroz de festa.”

    Atarracado (a) – Abraçado, juntos.
    Ex: ‘Os dois tão atarracado ali no escuro.”

    Até na orêia – Repleto, cheio, demais.
    Ex: ‘Zé Bico comeu tanto peixe, que tá até na orêia.”

    Bejô, bejô, quem não bejô, não beja mais – Fim da festa.
    Ex: ‘Acabou o baile… bejô, bejô, quem não bejô, não beja mais.”

    Bocó de fivela – Pessoa boba, burra, ignorante.
    Ex: ‘Por mais que ocê explica, ela não entende, é uma bocó de fivela.”

    Bonito prô cê – Expressão que indica quando a atitude tomada, não foi boa.
    Ex: ‘Chegô em casa bêbado, bonito prô cê.”

    Catcho – Namoro, paquera, amante.
    Ex: ‘Aquele cara tá de catcho cô Maria.”

    Cânháem – Latido de cachorro. Expressão usada para discordar.
    Ex: ‘Você namora Maria Taquara? Canháem.”

    Cêpo – Bom, ótimo, grande, admirável.
    Ex: ‘O atlético Mato-Grossense era um cêpo de time.’

    Chialá – Espia lá – Olhe lá.
    Ex.: Maria, tchialá Mané, cêpo de burro veio fazeno quiném criancinha!

    Coloiado (a) – Junto, próximo em grupo.
    Ex: ‘Saldanha Derzi tá coloiado cô Garcia Neto.”

    Cordero (a) – Denominação de quem gosta de dar corda nas pessoas.
    Ex: ‘Não vai no papo dele, ele é cordero.”

    Corre Duro – Andar mais rapido
    Ex: ‘Vamos chegar atrasado vamos, corre duro.”

    Cotxá – Relação sexual.
    Ex: ‘Os dos devem ta cotxando, ta demorano demas.”

    Tchá por Deus – Expressão de espanto, admiração, dúvida.
    Ex: Chá por Deus, esse ônibus tá muito cheio. ‘

    De jápa – Grátis, o que vem a mais.
    Ex: Quando se compra uma dúzia de bananas, e recebe treze unidades. ‘Esse adicional é a de jápa.’

    Digoreste – Ótimo, bom, exímio.
    Ex: ‘O guri é digoreste pá pega manga.’

    Ê aaah! – Indagação.
    Ex: ‘Oia o tamanho do short? Ê aaah!’

    Espia lá – Olha lá, veja.
    Ex: ‘Espia lá, uma batida de carro.”

    Futxicaiada – Muito fuxico. Excesso Excesso de mixirico.
    Ex: ‘O ambiente ali não tá bom, é só futxicaiada. ”

    Festá – Festar, participar de festa.
    Ex: ‘Maria foi festá.”

    Foló – Folgado, largo.
    Ex: ‘Maciel usa calça foló.”

    Garrô – Pegou, começou, realizou.
    Ex: ‘Ele garrô cedo no trabaio.”

    Grocotchó – Pessoa mole, doente, desanimado.
    Ex: ‘Tchico tá grocotchó.”

    Jururú – Triste, quieto.
    Ex: Padre Luiz Ghisoni tá jururú na porta da igreja de Várzea Grande.’

    Leva-e-tráz – fofoqueiro.
    Ex: ‘Kitú é um grande leva-e-tráz.”

    Londjura – Distância. Longe, muito distante.
    Ex: ‘Nessa lonjura não dá pá ir a pé.”

    Malemá – Popular de ‘mal e mal’. Mais ou menos.
    Ex: ‘E aí cumpadre como vai? Vou indo malemá tenteano.”

    Mea orêa – Minha orelha. Expressão usada para indicar quem está sem lado, sem falar o nome da pessoa.
    Ex: ‘Mea orêa aqui, tá a fim do cê.’

    Micaje – Ato de fazer imitação de alguém, fazer caretas.
    Ex: ‘Ela faz micaje de todo mundo que passa por aqui.”

    Moage – Frescura. Enrolação.
    Ex: ‘Você não quer ir com a gente? Larga de moage!”

    Na txintxa – Levar uma ação com seriedade. Sob controle.
    Ex: ‘Professora leva a turma na txintxa.”

    Não tá nem aí pá paçoca – Não liga para nada. Não quer saber das conseqüências.
    Ex: Tchá Bina, não ta nem aí pá paçoca. ‘

    Nariz furado – Veio na vontade, veio na certeza.
    Ex: ‘Chegou de nariz furado, certo que iria ganhar na conversa.’

    Negatófi – Negativo. Não, nunca.
    Ex: ‘Negatófi, hodje não tem televisão.’

    O quá – Duvidar, não acreditar.
    Ex: ‘Ele vem aqui? O quá!’

    Pá terra – cair.
    Ex: “Ele vinha correndo, e pá terra”! ‘

    Podre de chique – Bonito, elegante, bem vestido.
    Ex: ‘Jejé tá podre de chique.”

    Pongó – Bobo, tolo, idiota.
    Ex: ‘Gente Pongó não serve.’

    Por essa luz que me alomea – ‘Por essa luz que me ilumina’ Pra dizer que está falando sério, que não está mentindo.
    Ex: ‘Por essa luz que me lomea, ele tá falando a verdade.’

    Quinco – Denominação carinhosa de Joaquim.
    Ex: ‘Quinco Lobo era vereador em Cuiabá.’

    Que, que esse? – O que é isso.
    Ex: ‘Que, que esse? Como você apareceu aqui?’

    Quá! – Expressão de espanto, indignação.
    Ex: ‘Quá! Pode esquecer ele não volta mais.”

    Quebra-torto – Comer no desjejum comida reforçada como carne com arroz farofa, etc…
    Ex: ‘No sítio de manhã, sem quebra-torto é impossível.’

    Rufar – Bater.
    Ex: ‘Se aparecer aqui , o povo rufa ele.’

    Refestelá – Sorrir, rir.
    Ex: ‘Nico Padero é bom pra refestelá.’

    Ribuça – Cobrir o corpo com lençol ou cobertor.
    Ex:’Tá esfriando, rebuça menino.’

    Rebuça e Chuça – Baile.
    Ex: ‘Na guarita vai tê hoje uma chuça e rebuça.’

    Rino no tchá cara – Rindo na presença de alguém.
    Ex: ‘Ocê fala, ele fica rino no tchá cara.’ (rindo na sua cara)

    Sucedeu – Aconteceu.
    Ex: ‘Quando sucedeu isso?’

    Tá de tchico – Está menstruada.
    Ex: ‘Hoje ela não pode tá de tchico.”

    Tchá mãe – Expressão características para xingar alguém.
    Ex: ‘Tchá mãe, rapaz, vá tomá na tampa.’

    Tóma corno(a) – Expressão usada quando alguma coisa não acontece de forma correta.
    Ex: ‘Toma, corno. Marimbondo pegô na cara dele.”

    Verte água – Urinar (educadamente) .
    Ex: ‘Vidona foi verte água.’

    Que tal incluir algumas dessas expressões no seu dia a dia e mostrar para todo mundo a riqueza do falar cuiabano?

  • Linguagem reforça preconceito e barreiras para pessoas com deficiência

    Linguagem reforça preconceito e barreiras para pessoas com deficiência

    Ouso de linguagem ou expressões capacitistas não sóreforça o preconceitocomo ajuda a ampliar as dificuldades com que a pessoa com deficiência se depara no dia a dia. Essa foi a reflexão levantada por vários profissionais que participaram da roda de conversa Linguagem e comunicação não capacitista na prática, promovida terça-feira (20) pela Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo no Museu da Inclusão, na capital paulista.

    A roda de conversa é parte da programação do Dia Nacional da Pessoa com Deficiência, comemorado nesta quinta-feira (21). Entre uma série de ações programadas, eventos gratuitos que ocorrerãona sede da secretaria estão com inscrições abertas.

    “As pessoas com deficiência têm diversas barreiras e uma delas é a da comunicação. E a linguagem capacitista evidencia uma cultura que ainda não traz a visão de que a pessoa com deficiência é uma cidadã como qualquer outra, sujeita a obrigações e direitos. A linguagem capacitista é aquela que, de alguma forma, diminui essa condição do cidadão”, disse Marcos da Costa, secretário dos Direitos da Pessoa com Deficiência do estado de São Paulo, em entrevista à Agência Brasil. “Essa é uma discussão muito séria e muito importante porque demonstra que a forma de se dirigir a uma pessoa com deficiência é a imagem que se constrói ou não de cidadania”.

    Algumas expressõesmuito usadas nodia a dia, como “deu uma de João sem braço”, “como cego em tiroteio”,“portador de necessidades especiais”ou “deixa de ser retardado”, são exemplos do que chamamos de linguagem capacitista. Tratar uma pessoa com deficiência como “coitada” é outro exemplo desse tipo de linguagem preconceituosa.

    “A linguagem capacitista é toda mensagem que a gente constrói de forma que reforce um preconceito relacionado à deficiência ou a um estereótipo relacionado à deficiência”, explicou Ana Clara Schneider, fundadora e diretora executiva da agência Sondery, uma consultoria de acessibilidade criativa.

    Segundo ela, essa linguagem capacitista ocorre, em geral, de duas formas: como superação ou vitimismo. “Esses são os dois extremos. Mas há um intervalo entre eles com muitos outros exemplos que passam pela infantilização ou assistencialismo”, disse Ana Clara.

    Para Silvana Pereira Gimenes, coordenadora doprograma deEmpregoInclusivo daSecretaria de Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo, esse uso de linguagemdecorre de um imaginário popular que precisa ser superado e combatido.

    “Ninguém quer ser capacitista, ninguém quer ser racista, ninguém quer ser sexista. Mas não fomos ensinados a não ser. O racismo, o sexismo e toda forma de preconceito estãono nosso imaginário. E para superar esseimaginário, leva-se um tempo. E essa mudança só se processa quando a gente mentalizar isso”, afirmouSilvana.

    “A linguagem capacitista dá foco à diferença da deficiência, criando esse preconceito, essa diferenciação, que vem de um viés inconsciente e de um juízo de valor que é partir do princípio de que uma pessoa com deficiência é menos capaz, menos profissional”,completouAna Clara. “Os preconceitos são estruturais e vêm desse imaginário popular. E muito do que falta a esse imaginário popular é a comunicação. Precisamos reconhecer a responsabilidadesocial e o potencial de impacto de uma comunicação. E esse impacto pode ser positivo ou negativo. A partir do momento em que a gente não desconstrói os estereótipos, automaticamente estaremosreforçando-os. Se não somosintencionalmente mais acessíveis, mantemos as barreiras. Quando falamos em mudanças, em cultura e em acessibilidade, estamos falando desse lugar de aprendizado”, reforçou.

    Combater o capacitismo

    Para combater o capacitismo do vocabulárioé preciso, inicialmente, ouvir as pessoas com deficiência. “Um contato mais próximo com pessoas com deficiência evita problemas de comunicação”, destacou o ator e digital influencer Fábio de Sá, duranteo evento. “A comunicação é um princípio da condição humana e a gente sempre consegue quebrar essa barreira desde que haja vontade para isso”, ressaltou.

    Silvana destacou que é preciso também que as pessoas se policiem para que expressões capacitistas sejam eliminadas de seus vocabulários. “Não é que queremos colocar a ditadura do politicamente correto. Mas por que usar termos que ofendem o outro? Você precisa buscar melhorar sempre. E a melhora está em corrigir erros de fala e de linguagem”.

    Outros aspectos que ajudam na eliminação desse capacitismo, disseo secretário dos Direitos da Pessoa com Deficiência,passam poruma educação voltada para a inclusão e a “construção pró-ativade não só evitar certas expressõesmas, ao contrário, utilizar outras que mostram respeito, a importância e a inclusão de todos”.

    Também é precisoentender que eliminar o capacitismo na linguagem tem deser um esforço contínuo. “Isso precisa se tornar um hábito. A acessibilidade tem que ser intencional e consistente”, afirmouAna Clara.

    “Precisamos começar a olhar a deficiência como um traço, uma característica. Sempre digo que todo ser humano anda. Posso andar com dois pés, posso andar com dois pés e uma bengala, com dois pés e um andador ou posso andar por meio de rodas, seja uma cadeira ou uma maca. A capacidade é um conceito criado por pessoas que valorizavam o corpo perfeito e que remonta àcultura grega. Hoje a gente já entende que todas as pessoas são capazes. Cada pessoa executa as tarefas de formadiferente eisso não significa incapacidade. Então, usar uma linguagem que valorize as pessoas é excelente. É uma relação em que todos vão ganhar”, disseSilvana.

    Edição: Graça Adjuto
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