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  • Embrapa inicia pesquisas sobre cultivo de batata-doce e grão-de-bico no espaço

    Embrapa inicia pesquisas sobre cultivo de batata-doce e grão-de-bico no espaço

    Mais do que uma tripulação estrelada, composta exclusivamente por mulheres, o voo suborbital da Blue Origin, lançado segunda-feira, 14 de abril, levou na bagagem plantas de batata-doce das cultivares Beauregard e Covington; e sementes do grão-de-bico BRS Aleppo,  desenvolvido por cientistas brasileiros nos programas de melhoramento genético da Embrapa.

    A pesquisa com essas duas espécies em condições espaciais integra as ações da Rede Space Farming Brazil, parceria entre a Embrapa e a Agência Espacial Brasileira (AEB), que reúne as principais pesquisas no País sobre a produção de alimentos em ambientes fora da Terra, com alta radiação e baixa gravidade. A inclusão do material brasileiro no voo foi viabilizada por um convite da Winston-Salem State University (WSSU), no estado da Carolina do Norte, EUA. A astronauta que conduzirá os experimentos com as sementes brasileiras, Aisha Bowe, é ex-cientista de foguetes da WSSU e mantém parceria com a Odyssey, empresa de operações e ciências espaciais da universidade que viabilizou os experimentos na missão da Blue Origin.

    A batata-doce e o grão-de-bico foram escolhidos porque reúnem vantagens agronômicas e nutricionais, quando se considera os desafios tecnológicos e científicos de cultivar plantas no espaço. Elas são espécies adaptáveis e resilientes, de rápido crescimento e fácil manejo, que conseguem se desenvolver bem em condições adversas, mesmo com o mínimo aporte de insumos ao longo do ciclo de produção.

    Como contribuição para a dieta de astronautas, a batata-doce é uma fonte de carboidratos de baixo índice glicêmico e suas folhas oferecem uma alternativa de consumo como proteína vegetal. “As raízes da batata-doce produzem compostos bioativos que promovem a saúde humana, pois atuam como poderosos antioxidantes naturais que inibem a ação de radicais livres no organismo. Esse consumo é especialmente valioso em ambientes expostos à radiação, como nas condições da Lua, de Marte ou na Estação Espacial Internacional”, explica a engenheira-agrônoma Larissa Vendrame, pesquisadora da área de melhoramento genético da Embrapa Hortaliças (Brasília, DF).

    As batatas-doces que serão avaliadas nesta fase da pesquisa são a cultivar Covington, desenvolvida pela North Carolina State University (EUA); e a cultivar Beauregard, obtida pela Louisiana State University (EUA) e registrada no Brasil pela Embrapa, como instituição mantenedora. Ambas as cultivares possuem polpa alaranjada, indicativo da presença de betacaroteno, um pigmento natural que é precursor da provitamina A no organismo humano, e cujo consumo traz benefícios para a saúde dos olhos e da pele.

    Conhecido como o grão da felicidade, a escolha do grão-de-bico considera seu alto teor de proteínas. “A cultivar BRS Aleppo foi eleita para essa missão em função de seu alto valor nutricional e pela alta adaptabilidade do cultivo”, pondera o pesquisador Fábio Suinaga, da área de melhoramento genético vegetal da Embrapa Hortaliças.

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    Grão-de-bico BRS Aleppo é a primeira cultivar brasileira a participar de experimento espacial. Foto: Rogério Monteiro

    A busca no espaço por respostas para a Terra

    A pesquisa com grão-de-bico busca desenvolver plantas mais produtivas, com menor altura e ramificações mais eretas, um porte mais adequado às limitações do ambiente espacial. “Estamos planejando submeter sementes de grão-de-bico à radiação Gama e aos nêutrons, que atuam como geradores de variabilidade genética, da mesma forma que os cruzamentos realizados em laboratório e campos experimentais”, explica Suinaga, ao aventar a possibilidade de achar, ao longo desse processo, plantas mais precoces e resistentes.

    O cultivo de plantas no espaço demanda tanto o desenvolvimento de sistemas de produção sem solo ou com regolito (“solos”) lunares e marcianos, quanto cultivares selecionadas para condições de baixa disponibilidade de água e nutrientes. Segundo Vendrame, esses desafios são também demandas reais do setor produtivo de batata-doce para as condições de cultivo nas lavouras brasileiras. “Contamos com uma equipe multidisciplinar de pesquisadores de ponta que compõem a Rede de Agricultura Espacial Brasileira, por isso, a expectativa é obter novas cultivares com as características desejadas de modo mais rápido a partir de uma pesquisa inovadora”, conclui.

    A pesquisa em agricultura espacial deve acelerar o melhoramento genético e trazer inovações para a agricultura praticada na Terra, especialmente com o avanço das mudanças do clima. Além disso, espera-se alcançar diversos impactos, os chamados spin-offs, capazes de promover saltos no conhecimento agronômico brasileiro e gerar novas tecnologias.

    “Muitos são os exemplos de soluções espaciais que tiveram aplicações no cotidiano das pessoas. A NASA já publicou mais de duas mil dessas tecnologias que são utilizadas no nosso dia a dia, como telas de celulares, ferramentas sem fio, termômetros com infravermelho, comida desidratada, etc. Da mesma forma, podemos avançar muito em tecnologias modernas para auxílio na agricultura brasileira, usando inteligência artificial na irrigação, melhoria e adequação de plantas em cultivo indoor, novas cultivares mais tolerantes à seca, mais eficientes no uso da energia ou mais adaptadas aos desafios impostos pelas mudanças climáticas, mais produtivas e mais nutritivas”, destacou a pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste, Alessandra Fávero, que coordena a Rede Space Farming Brazil.

    A idealização do experimento foi feita por pesquisadores de diversas instituições participantes da rede. No retorno das amostras ao Brasil, cientistas da rede se juntarão para avaliar o material recebido.

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    Rede Space Farming Brasil (Agricultura Espacial Brasil) é coordenada pela Embrapa e AEB e reúne, atualmente, profissionais de 22 instituições. Foto: Juliana Sussai

    A rede de agricultura espacial brasileira

    A rede Space Farming Brazil foi criada para inovar na produção de alimentos em ambientes fora da Terra. Este grupo de cientistas está trabalhando no desenvolvimento de sistemas de produção adaptáveis ao espaço, buscando soluções para desafios complexos, garantindo a produção de alimentos em condições de elevada radiação, baixa gravidade e ausência de solo.

    Em novembro de 2023, foi firmado um protocolo de intenções entre a Embrapa e a Agência Espacial Brasileira (AEB) em prol da participação do País no Programa Artemis, da Nasa, que reúne projetos de colaboração internacional. Desde então, a Embrapa atua como provedora de dados, tecnologias e produtos que serão usados tanto no espaço quanto no dia a dia da sociedade brasileira, gerando novas oportunidades para superar desafios como o das mudanças climáticas, novas formas de produção e cultivares adaptadas a condições extremas e a novos mercados.

    Atualmente, a Rede é composta por 56 pesquisadores de 22 instituições diferentes: Agência Espacial Brasileira (AEB), Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo (Cena-USP), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), Instituto Agronômico (IAC), Instituto de Estudos Avançados (IEAv), Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IGc-USP), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP), Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Florida Tech University (FIT), Parque de Inovação Tecnológica de São José dos Campos (PITSJC), Universidade da Flórida (UFl), Universidade de Newcastle (NCL), Universidade Federal do ABC (UFABC), Universidade Federal de Lavras (Ufla), Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Winston Salem State University (WSSU).

  • Pimenteira-do-reino cultivada em árvore reduz custos e impacto ambiental

    Pimenteira-do-reino cultivada em árvore reduz custos e impacto ambiental

    Ao usar gliricídia (Gliricidia sepium L.), espécie de árvore leguminosa, como tutor vivo para o crescimento da pimenteira-do-reino, pesquisadores confirmaram que o sistema reduz em até 46% os custos de implantação por hectare, consome metade da água usada no modelo tradicional e ainda melhora a qualidade do produto. Esses resultados estão publicados nos mais recentes estudos conduzidos pela Embrapa que consolidam o sistema de produção sustentável de pimenta-do-reino na Amazônia, e que será apresentado na Jornada pelo Clima, na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas 2025 (COP 30), em novembro deste ano, em Belém (PA).

    A técnica, chamada de “sistema de produção da pimenta-do-reino em tutor vivo”, substitui as tradicionais estacas de madeira por plantas da gliricídia, que oferece suporte à pimenteira-do-reino e, ao mesmo tempo, contribui para a fixação de nitrogênio do ar, sequestro de carbono e o enriquecimento do solo. Segundo a Embrapa, o sistema combina aumento da produtividade com práticas sustentáveis e já é adotado em diversas regiões produtoras do Pará.

    O trabalho da pesquisa, realizado na região nordeste do estado do Pará, comparou o comportamento de seis clones (cultivares desenvolvidas pela pesquisa ou cultivadas pelos produtores de pimenta-do-reino) nos dois diferentes sistemas de cultivo: em estacão de madeira e em tutor vivo de gliricídia. Foram avaliadas a viabilidade econômica das lavouras irrigadas, redução de custos, eficiência do uso da água e da energia, qualidade do produto final e o impacto ambiental do cultivo nos dois sistemas.

    A gliricídia

    A Gliricidia sepium L. é uma árvore leguminosa nativa do México e da América Central, que possui alta capacidade de fixação de nitrogênio através de suas raízes. A inclusão dessa espécie no sistema agrícola contribui para o sequestro de CO2, ajudando a reduzir a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera.

    A pimenteira-do-reino é uma planta trepadeira e precisa de um tutor para o seu crescimento. O uso de estacas de gliricídia como tutor vivo (suporte) é uma alternativa aos pipericultores devido ao baixo custo e às dificuldades de aquisição de estacão de madeira, geralmente confeccionado com espécies das chamadas “madeiras-de-lei” (acapu, maçaranduba, jarana, entre outros) que se encontram em condição de esgotamento.

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    “O uso do tutor vivo de gliricídia na pimenta-do-reino vem sendo adotado no Pará desde 2004, mas a expansão se deu a partir de 2014 com o aumento do preço do estacão de acapu e suas restrições legais e que causam grande impacto ambiental” conta João Paulo Both, analista da Embrapa Amazônia Oriental (PA). O segmento produtivo, no entanto, como explica o especialista, ainda carecia de informações mais precisas sobre irrigação, espaçamento, nutrição, manejo e outros fatores de produção das cultivares de pimenteira-do-reino nesse tipo de tutor para a consolidação de um sistema de produção sustentável.

    Produção nacional

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    A pimenta-do-reino é uma das especiarias mais consumidas do mundo. O Brasil é o segundo produtor mundial dessa commodity, com uma produção de cerca 130 mil toneladas em 2023, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estado Pará é o segundo maior produtor nacional de pimenta-do-reino, com produção de 38 mil toneladas em 2023, em 18 mil hectares (IBGE/PAM, 2024). Apesar de sua tradição no cultivo, o estado enfrenta desafios para uma produtividade semelhante ao Espírito Santo, que lidera a produção nacional: 61% do total.

    A pimenta-do-reino brasileira é amplamente exportada para mercados como Alemanha, Estados Unidos, Emirados Árabes Unidos e Egito.

    Mais economia para o produtor

    Do ponto de vista econômico, o trabalho avaliou os custos de implantação de um hectare de pimenta-do-reino nos dois sistemas de produção para cada cultivar, e ainda o custo do sistema de irrigação. Um dos resultados é a redução em 46% no custo total de implantação de um hectare de pimenta-do-reino em tutor vivo de gliricídia quando comparado ao estacão de madeira (tutor morto). Para implantar um hectare de pimenta em estacão de madeira o produtor precisa desembolsar R$ 59.313,00 enquanto que um hectare em tutor vivo de glirícidia custa ao produtor R$ 32.038,00.

    “O elevado preço das estacas de madeiras praticados no estado do Pará foi o principal fator para a diferença nesse custo de implantação. O preço da estaca de madeira chega a R$ 25,00 enquanto que o valor mais alto encontrado para o tutor vivo de gliricídia foi R$ 5,00 a unidade”, relata Both. Para implantar um hectare de pimenta no espaçamento de fileiras duplas (2,20m X 2,20m X 4,00m) são necessários 1.500 estacões.

    “Com o tutor vivo de gliricídia, os custos de implantação diminuem significativamente, permitindo que os produtores utilizem esses recursos para adotar tecnologias como a irrigação, essencial em períodos de déficit hídrico”, destaca Both.

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    Foto: Ronaldo Rosa (cultivar Iaçara gliricídia)

    Custo da irrigação cai pela metade

    A demanda hídrica nos dois sistemas de plantio também foi avaliada pelos pesquisadores. A pimenteira-do-reino na gliricídia demanda menos água que no estacão de madeira. Comparando o mesmo sistema de irrigação em duas linhas, o cultivo no tutor vivo consumiu cerca de quatro litros de água por planta por dia, metade da demanda observada no cultivo tradicional. “Em um cenário de mudanças climáticas com a redução de chuvas e ampliação dos períodos secos, essa diminuição na demanda hídrica sinaliza um ponto positivo de adaptação às mudanças do clima”, afirma o pesquisador da Embrapa Oriel Lemos.

    A redução em mais de 50% no custo da irrigação também é um ponto positivo do cultivo em tutor vivo. Considerando o valor tarifário de energia no estado do Pará, o sistema de irrigação com a gliricídia teve custo anual de operação de cerca de R$ 1.413,50 por hectare (ha), enquanto a irrigação no sistema de tutor morto foi R$ 3.324,00/ha/ano.

    Conservação de recursos florestais

    A economia de água tem relação direta com os impactos ambientais do uso do tutor vivo nas lavouras. A sombra parcial da gliricídia reduz a perda de água por evaporação e a biomassa incorporada ao solo, proporciona o aumento da retenção de água e adição de matéria orgânica. “A gliricídia, que é uma leguminosa, fixa nitrogênio no solo e ajuda a melhorar suas propriedades físicas e químicas”, afirma Lemos.

    O pesquisador explica que a biomassa gerada nas podas da gliricídia é utilizada como cobertura e adubação orgânica, promovendo maior retenção de nutrientes no solo e fixação de nitrogênio atmosférico. O trabalho aponta uma redução em até 30% no uso de adubos químicos nos plantios quando comparado ao sistema tradicional com tutor morto.

    “Uma das importantes contribuições desse sistema também é a conservação de recursos florestais uma vez que o tutor vivo diminui a dependência de madeira comercial para os estacões e consequentemente a manutenção da biodiversidade local”, destaca o pesquisador.

    Pimenta-do-reino com mais qualidade e valor de mercado

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    Bowls of grain peppers and ground pepper on white background. High quality photo

    Os trabalhos avaliaram também a qualidade da pimenta-do-reino produzida em tutor vivo de gliricídia e um dos principais resultados foi a maior densidade do produto final. Both explica que a densidade do produto é uma análise fundamental para precificar a pimenta e classificá-la para exportação, já que é uma commodity. “Quanto mais pesado o grão, maior é o valor pago ao produtor”, pontua.

    O Brasil utiliza três parâmetros de densidade e o uso do tutor de gliricídia apresentou efeito positivo na densidade dos frutos, com tendência a aumentar a frequência nas classes de maior densidade. “Os grãos produzidos nesse sistema são frequentemente maiores e, portanto, com maior densidade”, esclarece o analista.

    Outros pontos evidenciados no trabalho são os parâmetros físico-químicos de qualidade da pimenta-do-reino, especialmente o teor de piperina. “A piperina é o composto bioativo majoritário da pimenta-do-reino e é identificada como um dos principais alcaloides responsáveis pela pungência, ou seja, o ardor do produto”, explica a pesquisadora da Embrapa Nádia Paracampo.

    No conjunto das seis cultivares analisadas, o teor de piperina foi cerca de 14% maior sob as condições de cultivo no tutor vivo de gliricídia em comparação ao sistema tradicional de tutor morto (estacão de madeira).

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    Foto: Ronaldo Rosa (cultivar Bragantina no tutor de gliricídia)

    Multiplicação da tecnologia mantendo a floresta

    Para atender à demanda dos pipericultores pelos tutores vivos, a pesquisa vem aprimorando o sistema de produção de gliricídia. O jardim clonal, como é tecnicamente chamada a área de multiplicação de estacas da planta, é uma tecnologia que complementa o sistema de produção sustentável da primenta-do-reino. “Cada planta matriz pode fornecer quatro estacas de gliricídia por ano”, afirma Both.

    De acordo com a Embrapa, a área de adoção do tutor vivo no cultivo da pimenteira-do-reino no Pará cresceu mais de 400% nos últimos dez anos. Saltou de 80 hectares em 2014 para 421 hectares em 2024. “A ampliação da adoção do tutor vivo por parte dos produtores é fruto da parceria entre Embrapa e empresa Tropoc, que exporta a pimenta-do-reino paraense para diversos países e se junta à instituição para consolidar o sistema de produção sustentável da pimenta na Amazônia”, acrescenta Lemos.

    Isso mostra, continua o pesquisador, que é possível aumentar a produção de pimenta-do-reino sem precisar cortar nenhuma árvore na Amazônia. “Este ano em que se discute a produção de alimentos frente às mudanças climáticas, essa mensagem ganha uma dimensão global. É fundamental que o consumidor saiba que ao comprar a pimenta-do-reino produzida no Brasil, ele está adquirindo um produto que respeita o meio ambiente e contribui para o sequestro de carbono”, finaliza.

  • Estudo mostra como o Brasil pode reduzir em até 38% a pegada de carbono na produção de trigo

    Estudo mostra como o Brasil pode reduzir em até 38% a pegada de carbono na produção de trigo

    Um estudo pioneiro realizado pela Embrapa revelou que o trigo produzido no Brasil tem uma pegada de carbono menor que a média mundial e indicou caminhos concretos para reduzir ainda mais as emissões de gases de efeito estufa. A análise, feita em lavouras e indústria moageira do Sudeste do Paraná, apontou que a adoção de práticas sustentáveis e tecnologias já disponíveis pode diminuir em até 38% o impacto ambiental da produção de trigo no País.

    Publicada no periódico científico Journal of Cleaner Production, a pesquisa é a primeira na América do Sul a estimar a pegada de carbono do trigo desde o cultivo até a produção de farinha. Também foi o primeiro estudo do tipo nessa cultura em ambiente subtropical. O índice médio brasileiro ficou em 0,50 kg de dióxido de carbono equivalente (CO₂eq) por quilo de trigo produzido — abaixo da média global, estimada em 0,59 kg.

    Para chegar a esse resultado, os pesquisadores avaliaram 61 propriedades rurais na safra 2023/2024, além de acompanhar todo o processo industrial em uma moageira paranaense. O levantamento detalhou desde o uso de fertilizantes e defensivos agrícolas até o transporte dos grãos, secagem, moagem e transformação dos grãos em farinha.

    O que é pegada de carbono?

    É o total de emissões de gases de efeito estufa causadas por um indivíduo, evento, organização, serviço, local ou produto, expresso em dióxido de carbono equivalente (CO2eq).

    Fertilizantes nitrogenados são principais emissores de CO2

    A pesquisa apontou os fertilizantes como o principal fator de pegada de carbono na triticultura. O maior impacto está na emissão de óxido nitroso (N₂O) gerado durante a aplicação de ureia, fertilizante capaz de emitir 40% dos gases de efeito estufa envolvidos na produção de trigo. A ureia é o principal fertilizante utilizado no trigo devido ao menor custo por unidade de nutriente dentre os adubos nitrogenados disponíveis no mercado. Segundo a pesquisa, a substituição desse fertilizante pelo nitrato de amônio com calcário (CAN) pode reduzir a emissão de carbono em 4%, minimizando significativamente os impactos ambientais.

    A acidificação do solo, uma das categorias com maior impacto ambiental, também pode ser mitigada pela substituição da ureia pelo CAN. “Quando a ureia não é totalmente absorvida pelas plantas ou é lixiviada como nitrato, ocorrem reações que liberam íons de hidrônio, aumentando a acidez do solo. Em contrapartida, fertilizantes à base de CAN ajudam a neutralizar esse efeito devido ao seu conteúdo de cálcio”, explica a pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente (SP) Marília Folegatti. Segundo ela, outras tecnologias também devem ser consideradas para reduzir a dependência de fertilizantes sintéticos e minimizar impactos ambientais, como biofertilizantes, biopesticidas, fertilizantes de liberação lenta e nanofertilizantes. Ela lembra que a pesquisa avança na produção de ureia verde e nitrato de amônio a partir de fontes de energia renováveis.

    A pesquisadora da Embrapa Agroindústria Tropical (CE) Maria Cléa Brito de Figueiredo lembra que o uso de fertilizantes nitrogenados é também o maior emissor de gases de efeito estufa em outras culturas com pegada de carbono e hídrica analisadas pela Embrapa, como as fruteiras tropicais, em especial, manga, melão e coco verde. “Além disso, a produção de fertilizantes sintéticos gera metais pesados que contribuem para a contaminação do solo, podendo afetar a qualidade dos alimentos, a saúde humana e os ecossistemas,” alerta a cientista.

    A pesquisa também aponta que a adoção de cultivares de trigo mais produtivas pode reduzir os impactos ambientais no campo, já que ação promove maior rendimento com menos recursos, como terra e água. O estudo ressalta ainda a importância de considerar outros fatores ambientais, como biodiversidade e saúde do solo. Futuros estudos que integrem esses aspectos poderão oferecer uma visão mais abrangente sobre a sustentabilidade da produção de trigo em regiões tropicais e subtropicais.

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    Foto: João Leonardo Pires

    Sustentabilidade e perspectivas para a produção de trigo

    No contexto mundial, os dados existentes indicam que a pegada de carbono na produção de trigo varia de 0,35 a 0,62 kg de CO₂ por kg de grãos, dependendo das condições climáticas e das práticas agrícolas de cada região tritícola. A média global está estimada em 0,59 kg de CO₂ para cada kg de grãos de trigo produzidos.

    O Brasil apresenta uma posição favorável nesse contexto. Na média final, a pegada de carbono foi definida em 0,50 kg CO2 para cada kg de trigo produzido no Brasil, número inferior às registradas na China (0,55), na Itália (0,58) e na Índia (0,62). “Ainda podemos evoluir. O estudo indica que, com um conjunto de ajustes, nossos números podem nos aproximar de referências como Austrália e Alemanha, que possuem indicadores próximos a 0,35″, avalia Álvaro Dossa, analista da Embrapa Trigo (RS). De acordo com o artigo, nos cenários estudados, utilizando tecnologias já disponíveis, a pegada de carbono do trigo brasileiro pode ser reduzida em 38%.

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    Gráfico comparativo da pegada de carbono para produção de trigo: 1 kg CO2-eq para cada 1 kg de trigo produzido.
    Fonte: Embrapa Trigo 2025, com base na revisão de literatura.

    Em escala mundial, existem registros de pegada de carbono divididos por continentes, com média estimada para a África (0,24), Ásia (0,68), Europa (0,33), América do Norte (0,42) e Oceania (0,29 mas com produção de trigo incipiente). O estudo apresentado pela Embrapa é o primeiro indicador para estimar a pegada de carbono na América do Sul.

    Além da pegada de carbono, foram analisados os impactos do trigo e da farinha de trigo no uso da água, acidificação terrestre, eutrofização (marinha e em água doce) e toxicidade (humana e ecotoxicidade). “A produção de trigo no Brasil apresenta impactos superiores em categorias como acidificação do solo e toxicidade ecotóxica terrestre, devido às emissões de fertilizantes e pesticidas. No entanto, os resultados do estudo sugerem que, com o uso de cultivares mais eficientes e práticas sustentáveis, a produção brasileira pode se consolidar entre as mais sustentáveis do mundo”, avalia Marília Folegatti.

    Em outras categorias ambientais, a produção brasileira apresenta vantagens em relação a outros países. O cultivo de trigo de sequeiro minimiza significativamente o consumo de água durante o crescimento do grão, reduzindo o impacto sobre os corpos hídricos. Contudo, a síntese de fertilizantes NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) ainda exerce influência no consumo de água. “A crescente demanda por alimentos e fertilizantes está levando indústrias a investirem em soluções de tratamento e reuso de água, aliviando a pressão sobre os recursos hídricos”, explica Folegatti.

    Para a pesquisadora da Embrapa Trigo (RS) Vanderlise Giongo, estudos sobre o impacto ambiental da produção de trigo são cada vez mais necessários num cenário de aquecimento global. “Precisamos identificar, avaliar e propor modelos de produção de trigo visando à redução de impactos ambientais, geração de renda e o estabelecimento de diretrizes para o cultivo de trigo de baixo carbono”, defende Vanderlise.

    Indicadores para a produção de farinha de trigo

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    Foto: Diogo Zanatta

    A parceria com a Moageira Irati permitiu aos pesquisadores fazer um recorte no estudo para avaliar a pegada de carbono na farinha de trigo produzida no Brasil. Foram avaliadas todas as etapas envolvidas no processo de produção da farinha, desde a lavoura (cultivo e manejo), passando pela logística de transporte e chegada na indústria (limpeza, secagem e armazenamento), até o processo de transformação dos grãos em farinha (umidificação e moagem).

    A pegada de carbono na produção brasileira de farinha de trigo variou de 0,67 (a partir de grãos originados em grandes propriedades) a 0,80 (origem em pequenas propriedades). Número inferior as médias registradas na Espanha (0,89) e na Itália (0,95), por exemplo.

    Um dos fatores competitivos do Brasil em relação aos países de clima temperado, está a maior incidência de luz solar, o que permite o aproveitamento de energia fotovoltaica, recurso natural renovável que pode ser utilizado em várias etapas na indústria.

    De acordo com o empresário Marcelo Vosnika, diretor da Moageira Irati, a produção de alimentos com menor impacto ambiental é uma demanda ainda latente no consumidor, mas cada vez mais valorizada pelo mercado. “Estamos trabalhando para mostrar ao mundo como nosso modelo de produção de trigo está associado à uma agricultura resiliente e de baixo carbono. Para provar que a nossa farinha vem de uma produção sustentável, precisamos validar cientificamente os resultados deste projeto. Acredito que a iniciativa vai gerar boas oportunidades de negócios para todos os envolvidos na cadeia do trigo brasileiro”, afirma o diretor da Moageira Irati, Marcelo Vosnika.

    A expectativa dos pesquisadores da Embrapa envolvidos no projeto é de que os resultados do ciclo de vida do trigo sejam utilizados para avaliar outros produtos a exemplo da farinha, como na cadeia de carnes e de energia. “A primeira etapa, que é a avaliação da pegada de carbono do trigo no campo, já está pronta e pode servir de base para diversas outras cadeias que utilizam o trigo no processo industrial”, avalia Vanderlise Giongo, destacando que o objetivo da pesquisa é promover alternativas para uma agricultura ambientalmente mais sustentável: “Esperamos que os resultados desse projeto possam orientar modelos de produção sustentável, desencadeando uma nova era para o trigo brasileiro”.

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    Foto: Luiz Magnante

    Como foi feita a pesquisa

    A pesquisa é um dos resultados do projeto “Indicadores e tecnologias ESG (environment, social and governance) na moagem de trigo paranaense”, iniciado em 2023, por meio da parceria da Embrapa Trigo (RS) com a Moageira Irati. O estudo acompanhou 61 produtores rurais no Sudeste do Paraná, durante a safra de trigo 2023/2024, quando foram avaliados diversos indicadores de sustentabilidade, verificando o impacto da emissão de carbono antes da porteira (fertilizantes, defensivos, sementes), durante o processo de produção (semeadura, tratos culturais, colheita e transporte) e na indústria (secagem, energia, resíduos). “Coletamos todas as informações sobre entradas e saídas de insumos e dos processos do sistema de produção para avaliar o ciclo de vida do trigo até a elaboração do produto final”, conta o analista da Embrapa Álvaro Dossa.

    As propriedades participantes do projeto trabalham com trigo de sequeiro em sistema de rotação de culturas e plantio direto na palha há, aproximadamente, 30 anos. O estudo considerou fatores como o tamanho das propriedades, o tipo de fertilizantes utilizados e as cultivares, entre outros, relacionando com os potenciais impactos ambientais.

    Com base nos dados, foi possível identificar dois tipos de produtores de trigo, em que o tamanho das propriedades era o principal fator de diferenciação. Assim, a pegada de carbono (quilo de CO2 para cada quilo de trigo produzido) chegou a 0,58 nas pequenas propriedades e a 0,47 nas grandes propriedades. “A segmentação permitiu melhor representar a realidade da produção de trigo e farinha da região do estudo, pois não seria correto o pequeno produtor, que representa a maioria, ser agrupado com produtores grandes, empresariais, já que isso pode alterar os resultados e possíveis recomendações futuras”, explica Dossa.

    A metodologia utilizada na pesquisa do trigo brasileiro foi a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), que permite verificar os impactos ambientais associados a todos os estágios do ciclo de vida de um produto. A ACV segue uma padronização internacional (ISO 14040 e ISO 14044) e considera também indicadores de pegada hídrica e potencial de aquecimento global.

  • Doenças em lavouras devem se intensificar com as mudanças climáticas, alerta Embrapa

    Doenças em lavouras devem se intensificar com as mudanças climáticas, alerta Embrapa

    A crise climática terá sérios efeitos no campo: doenças de plantas mais severas, resistentes e difíceis de controlar. Um estudo conduzido por pesquisadores da Embrapa indica que cerca de 46% das doenças agrícolas que ocorrem no Brasil devem se tornar mais severas até o ano de 2100, com impacto direto sobre culturas estratégicas como arroz, milho, soja, café, cana-de-açúcar, hortaliças e frutas. O aumento da temperatura e as alterações no regime de chuvas devem favorecer fungos, vírus e vetores, exigindo do País uma reestruturação nos sistemas de monitoramento e controle fitossanitário.

    A projeção vem de uma ampla revisão científica que avaliou 304 patossistemas (conjunto formado por patógeno e planta hospedeira) relacionados a 32 das principais culturas agrícolas brasileiras. O levantamento mostra que os fungos são os patógenos mais recorrentes, presentes em quase 80% dos casos avaliados.

    Mais calor, mais doenças

    As mudanças climáticas devem tornar o ambiente ainda mais propício à disseminação de patógenos. O estudo destaca que o aumento médio da temperatura pode ultrapassar os 4,5°C em algumas regiões brasileiras até o fim do século, se o mundo não tomar medidas para frear as mudanças climáticas. Para doenças causadas por fungos, como antracnose e oídio, esse cenário cria condições ideais para a proliferação. Alterações nas chuvas, com períodos mais secos ou intensamente úmidos, também interferem na dinâmica das doenças.

    “A previsão de doenças em um cenário de mudança climática é um desafio complexo que exige a continuidade das pesquisas e implementação de novas estratégias de adaptação”, afirma a pesquisadora Francislene Angelotti, da Embrapa Semiárido (PE). Ela ainda enfatiza a importância de investimentos para fortalecer os sistemas e estruturas fitossanitários nacionais e promover a inovação científica para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas.

    Vetores em expansão

    Não são apenas os fungos que preocupam. As doenças transmitidas por vetores, como pulgões, cochonilhas, tripes, moscas-brancas e ácaros, também devem aumentar de importância em todo o território nacional. Segundo o pesquisador Wagner Bettiol, da Embrapa Meio Ambiente (SP), o ciclo de vida desses insetos se torna mais curto com o calor, e a sua longevidade tende a aumentar. Isso significa populações maiores, mais ativas e por mais tempo durante o ano. A consequência é um risco elevado para culturas como batata, banana, tomate, citros e milho, que já são afetados por essas pragas.

    Impacto sobre defensivos agrícolas

    Pesquisas apontam que as mudanças climáticas podem afetar a eficácia dos defensivos agrícolas, exigindo ajustes nas estratégias de controle fitossanitário. Toda a dinâmica dos fungicidas nas plantas (a maneira como eles são absorvidos, transportados e degradados) pode se alterar com o novo cenário climático o qual também provocará alterações morfológicas e fisiológicas nas plantas.

    Com isso, o uso de produtos químicos pode se tornar menos eficiente ou exigir mais aplicações, o que aumenta custos e riscos ambientais. Esse cenário já impulsiona a busca por alternativas, especialmente os chamados agentes biológicos de controle, como os biopesticidas.

    Brasil é líder em biocontrole, mas precisa avançar

    O Brasil é hoje o maior produtor e consumidor de biopesticidas no mundo e tem a maior área agrícola sob controle biológico. Segundo projeção da consultoria Research and Markets, o mercado global desses produtos deve atingir 19,49 bilhões de dólares até 2030.

    Apesar do protagonismo, pesquisadores alertam que o País precisa reforçar a adaptação desses bioagentes às novas condições climáticas. “Precisamos desenvolver, com urgência, bioherbicidas e produtos biológicos que aumentem a eficiência do uso de nitrogênio e reduzam o estresse abiótico das plantas”, defende Bettiol. Ele também defende o avanço na criação de soluções biológicas para o controle de doenças estratégicas como a ferrugem asiática da soja e a ferrugem do cafeeiro, além da seleção de agentes de biocontrole adaptados ao novo clima.

    Monitoramento e ação coordenada

    Diante do cenário projetado, os especialistas recomendam uma combinação de ações para proteger os campos brasileiros como análise de risco, prevenção, adaptação, fortalecimento da vigilância fitossanitária, ampliação de investimentos em pesquisa e incentivo à cooperação internacional. Entre as medidas de curto prazo estão o uso de sistemas de cultivo diversificados, a integração de diferentes tecnologias de manejo, o emprego de agentes biológicos e a adoção de modelos de previsão e alerta de epidemias.

    “O enfrentamento desses desafios exige políticas públicas eficazes e um esforço coordenado entre agricultores, cientistas e governos para garantir a segurança alimentar e a sustentabilidade do setor agrícola”, reforça Angelotti. Ela destaca que a adaptação às mudanças climáticas no campo não pode depender apenas dos agricultores: é preciso uma articulação entre ciência, governo e setor produtivo.

    Risco fitossanitário é estratégico para o País

    O estudo também aponta para a ampla gama de patógenos vegetais do Brasil, em função de sua diversidade agrícola que se estende por um vasto território com climas variados, abrangendo plantas tropicais e temperadas. Essas características reforçam a necessidade da realização de avaliações regionalizadas com base na dinâmica dos problemas fitossanitários nas diferentes áreas produtoras e em cenários futuros.

    A pesquisadora Emília Hamada, da Embrapa Meio Ambiente, enfatiza a importância de estudos sobre a distribuição espacial e temporal de patógenos nos cenários de risco às mudanças climáticas. Para ela, é necessário que eles contenham experimentações em condições de campo para identificar a vulnerabilidade e adotar medidas de proteção aos sistemas de cultivo.

    Ela conta que as projeções climáticas indicam aumentos de temperatura no Brasil de até 4,5°C até 2100, em determinadas regiões e estações do ano. Além disso, Hamada explica, que os resultados indicam agravamento do risco de doenças fúngicas, como antracnose e oídio, em função dos aumentos de temperatura e alterações no regime de chuvas, a depender da região do País.

    Os cenários de risco são cruciais para identificar a vulnerabilidade dos sistemas de cultivo a doenças em cenários de mudanças climáticas e mais avanços científicos são necessários para prevenir efetivamente danos econômicos e ambientais, complementa Hamada.

    Ciência e adaptação como caminhos

    O estudo da Embrapa destaca que as mudanças climáticas já estão moldando o futuro da agricultura brasileira. Se nada for feito, os prejuízos econômicos e ambientais podem ser severos. Mas, com planejamento, inovação e ações coordenadas, o País pode transformar o desafio em oportunidade para modernizar seu sistema de defesa vegetal.

  • Embrapa e ICMBio assinam acordo para rastrear atum brasileiro

    Embrapa e ICMBio assinam acordo para rastrear atum brasileiro

    O projeto de rastreabilidade eletrônica dos atuns e afins para exportação será desenvolvido em uma parceria da Embrapa, responsável pelo Sistema Brasileiro de Agrorrastreabilidade, o SIBRAAR, e da Paiche Consultoria com o Instituto Chico Mendes através de acordo de cooperação técnica.

    A rastreabilidade e a adoção de boas práticas na produção e exportação de pescado são essenciais para atender os padrões regulatórios internacionais e garantir a qualidade do produto. A Embrapa reconhece a importância desses processos e propôs o desafio de inovação para desenvolver soluções digitais e ciber-físicas que apoiam a identificação e certificação de produtos de origem animal e vegetal.

    Com a tecnologia Sibraar, a Embrapa busca padronizar e facilitar o acesso  às informações sobre a origem das matérias primas, contribuindo para a transparência dos processos de agroindustrialização. A colaboração com instituições como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela Gestão e fiscalização de quatro Unidades de Conservação Federal, integrantes do Núcleo de Gestão Integrada Grandes Unidades Oceânicas, que representam 25% da Zona Econômica Exclusiva do Brasil é fundamental para ampliar o alcance do Sibraar no setor pesqueiro permitindo que os consumidores tenham acesso a informações detalhadas sobre as práticas produtivas e extrativistas, especialmente do atum. Esta parceria com o ICMBio tem potencial não só de beneficiar os consumidores, fornecendo-lhes maior segurança alimentar, mas também apoia a sustentabilidade e a competitividade da indústria pesqueira nacional.

    A Embrapa participa do projeto piloto, utilizando o Sibraar, o qual rastreia de forma digital toda a cadeia produtiva do pescado ao customizar e colocar o atum como o primeiro pescado rastreado da pesca marinha. Todas as etapas, totalmente auditáveis, desde a sua origem no mar, passando pelo beneficiamento e transporte, até o consumidor final. Além de beneficiar a economia da cadeia produtiva – abrindo uma oportunidade de negócios com mercados mais exigentes – a rastreabilidade é um passo essencial no caminho pela sustentabilidade da pesca, no Brasil e no mundo. Participarão das ações no Projeto as unidades de pesquisa da Embrapa Agroindústria de Alimentos, Agricultura Digital,Clima Temperado e Pesca e Aquicultura.

    Para a analista ambiental Mônica Peres, que coordena a área de Inovação na Pesca, do ICMBio Grandes Unidades Oceânicas, a iniciativa é bastante ousada e um grande desafio, mas também um enorme passo para estimular e incentivar a proteção da biodiversidade marinha.

    O pesquisador Alexandre de Castro, da Embrapa Clima Temperado, ressalta a importância de se incentivar uma cultura de rastreabilidade para permitir que os consumidores tenham acesso às informações sobre o pescado que consomem, além de agregar valor competitivo para o setor pesqueiro nacional.

    Segundo Cintia Miyaji, consultora da Paiche, a rastreabilidade na cadeia do pescado é uma exigência de mercados conscientes, de compradores responsáveis e de todos que se preocupam com a conservação dos recursos pesqueiros. O comprometimento de todos nesta iniciativa já é um grande passo para o seu sucesso.

  • Embrapa consulta cadeia produtiva sobre demandas de pesquisa para algodão, amendoim, gergelim, mamona e sisal

    Embrapa consulta cadeia produtiva sobre demandas de pesquisa para algodão, amendoim, gergelim, mamona e sisal

    De 8 a 18 de abril, a Embrapa Algodão está realizando uma pesquisa de opinião com os diferentes elos das cadeias produtivas das culturas do algodão, amendoim, gergelim, mamona e sisal. O objetivo é mapear e definir quais serão as prioridades de pesquisa da Unidade para os próximos anos.

    “Periodicamente a Embrapa avalia o direcionamento de suas ações por meio do Plano Diretor, e a partir deste plano, cada unidade descentralizada reavalia sua agenda estratégica com base no movimento das cadeias produtivas, infraestrutura para pesquisa e consultas públicas a diferentes elos da agricultura nacional”, explicou Daniel Ferreira, chefe-geral interino da Embrapa Algodão .

    Para identificar desafios e oportunidades em relação as cadeias produtivas pesquisadas pela unidade, serão ouvidos produtores, consultores, técnicos de extensão rural e representantes de empresas parceiras, universidades e indústrias.

    Essas informações ajudarão a orientar novas pesquisas, bem como, ações de divulgação e transferência de tecnologia, que possam contribuir para melhorar a produção de algodão, amendoim, gergelim, mamona e sisal em todo o país.

  • Novas cultivares de soja combinam alta produtividade e resistência a doenças

    Novas cultivares de soja combinam alta produtividade e resistência a doenças

    A Embrapa e a Fundação Meridional acabam de lançar duas cultivares de soja (BRS 1075IPRO e BRS 774RR) que se destacam por apresentar potencial produtivo elevado, resistência/tolerância às principais doenças, entre outros diferenciais. “Estamos colocando no mercado duas cultivares de soja bastante promissoras para a região Centro-Oeste, um dos celeiros produtivos do Brasil”, ressalta Alexandre Nepomuceno, chefe-geral da Embrapa Soja (PR).

    A BRS 1075IPRO é uma cultivar transgênica com a tecnologia “Intacta RR2PRO”. Essa característica confere tolerância ao herbicida glifosato, o que facilita o controle de plantas daninhas, e resistência a algumas lagartas que atacam a cultura da soja como a Anticarsia gemmatalis e a Chrysodeixis includens, por exemplo.

    De acordo com o pesquisador da Embrapa Carlos Lásaro Melo, esse material mostrou-se bastante competitivo, por possuir produtividades elevadas, com rendimentos acima de 7% quando comparado às cultivares mais usadas nas regiões de indicação. Nos testes, a nova cultivar demonstrou alta estabilidade produtiva, boa resistência ao acamamento, além de sanidade foliar e radicular. “Ela é uma opção que permite o plantio antecipado da soja, possibilitando a sua inserção no sistema de rotação ou sucessão com outras culturas”, explica Melo.

    Outro destaque da BRS 1075IPRO é a elevada sanidade. Nos testes a campo e casa de vegetação, a cultivar apresentou resistência às principais doenças da soja como cancro da haste, pústula bacteriana, ao vírus da necrose da haste e à podridão radicular de Phytophthora. Além disso, é moderadamente resistente à mancha olho-de-rã. A BRS 1075IPRO irá beneficiar os produtores das regiões indicadas: Goiás (RECs 301, 303 e 401), Mato Grosso do Sul (REC 301), Mato Grosso (RECs 401 e 402), e Rondônia (REC 402).

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    Foto: Lebna Landgraf

    A soja BRS 774RR é uma cultivar transgênica com resistência ao glifosato, o que confere facilidade no manejo de plantas daninhas. “Ela obteve ganho médio de 4,2% em produtividade em comparação aos demais materiais da região, e com ampla participação na área cultivada com soja”, ressalta Melo.

    Também tem como diferencial a possibilidade de permitir ampla janela de semeadura e estabilidade na região de adaptação. “É uma opção de cultivar de soja para quem deseja um plantio antecipado e rentável, em áreas de alta fertilidade, possibilitando a sua inserção no sistema de rotação ou sucessão com outras culturas”, detalha o pesquisador.

    Com relação à sanidade, em testes de avaliação a campo e casa de vegetação, apresentou resistência ao cancro da haste, à podridão parda da haste e à podridão radicular de Phytophthora e ao Nematoide de cisto (Raça 3). A cultivar também se mostrou moderadamente resistente à pústula-bacteriana, mancha olho-de-rã e ao nematoide de galha Meloidogyne javanica.

    Segundo Melo, a BRS 774RR destaca-se por apresentar excelente arquitetura de planta e estabilidade de produção na região de adaptação. A BRS 774RR irá atender produtores de algumas regiões edafoclimáticas de Goiás (RECs 301, 303, 304 e 401), Mato Grosso (RECs  401 e 402), Mato Grosso do Sul (REC 301), Rondônia (REC 402) e Minas Gerais (RECs 303 e 304).

    Indicada para áreas de refúgio

    Outro diferencial da BRS 774RR é ter a possibilidade de ser utilizada nas áreas de refúgio de lavouras que cultivam as cultivares com tecnologia Intacta IPRO (cultivares com resistência ao glifosato e uma proteína – Cry1Ac – que confere resistência a algumas lagartas), e Intacta2 Xtend (I2X) reúne três proteínas (Cry1A.105 e Cry2Ab2 e Cry1Ac), o que proporciona proteção contra seis espécies de lagartas que incidem na cultura da soja: Helicoverpa armigeraSpodoptera cosmioides, lagarta falsa medideira (Chrysodeixis includens), lagarta da soja (Anticarsia gemmatalis), lagarta das maças (Chloridea virescens) e broca das axilas (Crocidosema aporema). Além disso, combina tolerância aos herbicidas glifosato e dicamba.

    A recomendação atual de refúgio para a cultura da soja é, no mínimo, 20% da área com tecnologia diferente da Intacta IPRO e da I2X. Segundo explica o pesquisador Daniel Sosa Gomez, essa é uma medida preventiva que consiste no plantio de parte da lavoura com outras opções de soja não-Bt (sem a toxina Bacillus thuringiensis (Bt) – a uma distância máxima de 800 metros de lavouras).

    “A adoção da área de refúgio possibilita o acasalamento aleatório de mariposas oriundas das áreas das áreas de refúgio, favorecendo a manutenção de populações suscetíveis e retardando a seleção de populações resistentes”, detalha. A Embrapa defende ainda que o manejo de pragas nas lavouras siga as mesmas premissas do Manejo Integrado de Pragas (MIP).

    “Em 50 anos de atuação, a Embrapa Soja vem entregando anualmente novas cultivares com tetos de produtividade crescentes, além de estabilidade e sanidade para que o produtor brasileiro tenha em mãos as mais avançadas tecnologias embutidas na sua semente”, resume Nepomuceno.

  • Embrapa apresenta planta para controle de nematoides na Tecnoshow Comigo

    Embrapa apresenta planta para controle de nematoides na Tecnoshow Comigo

    Durante a edição deste ano da Tecnoshow Comigo, produtores e técnicos vão conhecer uma leguminosa da Embrapa eficiente no controle natural de nematoides. O evento, que começou nesta segunda-feira (7), ocorre até o dia 11 de abril, em Rio Verde, Goiás. O Guandu BRS Guatã, lançado recentemente pela Embrapa Pecuária Sudeste (São Carlos – SP), é resistente a nematoides, apresenta alta produtividade e florescimento precoce. Além disso, atua para fixação biológica de Nitrogênio, recuperação de pastagens degradadas e serve para alimentação animal.

    A Embrapa também vai apresentar os benefícios de outra leguminosa, o Guandu BRS Mandarim, conhecida pela capacidade de recuperação de pastagens degradadas e alimentação de bovinos. Parcelas com as duas tecnologias foram plantadas no local para que os visitantes conheçam as principais características e diferenças entre o Guatã e o Mandarim.

    Guatã 

    A principal vantagem da cultivar BRS Guatã é no controle de quatro espécies de nematoides, que são pragas capazes de causar prejuízos anuais à agricultura nacional de R$ 35 bilhões, segundo a Sociedade Brasileira de Nematologia (SBN). Esses parasitas atacam culturas de grande relevância econômica, como soja, cana-de-açúcar e feijão.

    A cultivar ainda apresenta melhorias nas propriedades químicas, físicas e biológicas do solo por fixação de Nitrogênio, contribuindo para a recuperação das pastagens sem a necessidade de fertilizantes químicos nitrogenados. Na época seca, quando as pastagens não apresentam boas condições, o Guandu BRS Guatã serve de alimento de qualidade para os bovinos, sendo uma alternativa de baixo custo para a suplementação volumosa.

    Outra boa notícia dessa variedade é a alta tolerância ao déficit hídrico, produzindo três toneladas de massa seca por hectare em condições de sequeiro, valor estatisticamente igual à produção em condições irrigadas. Essa capacidade torna o Guatã uma cultura estratégica para a adaptação da agricultura e da pecuária às mudanças climáticas, com períodos cada vez maiores de baixa disponibilidade de água. A propagação ocorre por meio de sementes e tem boa produtividade. É recomendada para as regiões Centro-Oeste (DF, GO, MT e MS) e Sudeste (MG e SP).

    Guandu BRS Mandarim

    A leguminosa Guandu BRS Mandarim é conhecida, principalmente, pela capacidade de recuperar áreas degradadas quando consorciada com braquiária e para alimentação animal. Com alto potencial para adubação verde, o Mandarim melhora a fertilidade do solo e a qualidade do pasto. Seu uso dispensa a adubação nitrogenada para recuperar o pasto, uma vez que o resíduo proveniente da sua roçada funciona como adubo verde, disponibilizando Nitrogênio no sistema.

    As duas tecnologias contribuem com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, com a meta 2 – Fome Zero e Agricultura Sustentável, já que colaboram para a sustentabilidade dos sistemas de produção e com a melhoria da qualidade dos produtos, beneficiando tanto os produtores quanto o sistema de produção pecuário.

  • Embrapa conta trajetória da soja no Brasil Central a partir de variedades históricas

    Embrapa conta trajetória da soja no Brasil Central a partir de variedades históricas

    Tornar o Brasil o maior produtor mundial de soja – 147,35 milhões de toneladas, na safra 2023/2024 – só foi possível com investimento em ciência para adaptar essa espécie para o cultivo em região tropical. Para demonstrar a evolução das cultivares de soja no Brasil, com foco no Centro-Oeste, a Embrapa estará demonstrando uma linha do tempo com diferentes cultivares de soja na sua Vitrine de Tecnologias no Tecnoshow Comigo, que será realizado de 08 a 12 de abril, em Rio Verde (GO).

    A iniciativa pretende demonstrar a evolução deste grão, cujo início do plantio comercial no Brasil foi há 100 anos e também celebrar os 50 anos da Embrapa Soja, em 2025. Desde a introdução experimental da soja no Brasil, foram desenvolvidas diversas cultivares, sempre buscando incremento de produtividade, adaptabilidade e resistência a doenças. A Embrapa Soja teve participação ativa nessa evolução, tanto que em 50 anos a instituição desenvolveu cerca de 440 cultivares de soja.  “A soja é a alavanca do agronegócio e da economia brasileira e isso foi possível, graças aos diversos atores que compõem a cadeia produtiva da soja – cientistas, técnicos e produtores –  e que fizeram um trabalho de excelência”, destaca Nepomuceno. Alexandre Nepomuceno, chefe-geral da Embrapa Soja.

    Para compor a Vitrine da Embrapa, foram selecionadas 15 cultivares de soja, que fazem parte do Banco Ativo de Germoplasma (BAG), uma coleção de aproximadamente 65 mil acessos (tipos de soja) introduzidos da coleção dos Estados Unidos e de outros países da África, Europa, Ásia, Oriente Médio e Oceania. “O BAG, mantido pela Embrapa, é responsável por guardar a variabilidade genética da soja. Quanto mais acessos diferentes e caracterizados, melhor é a utilização nos programas de melhoramento para desenvolvimento de novas variedades,” esclarece o pesquisador e curador do BAG-Soja, Marcelo Fernandes. Marcelo Fernandes de Oliveira, curador do BAG-Soja.

    Linha do tempo da soja

    Logo na entrada da Vitrine da Embrapa, o visitante poderá ver a soja selvagem (que é perene), e a ancestral “mais próxima” da soja (Glycine soja), cujo ciclo é anual. Além destas, também estarão em exposição algumas cultivares de Glycine max (soja cultivada).

    A cultivar Pelicano, introduzida dos Estados Unidos na década de 1950, se adaptou no Brasil e foi semeada até meados de 1960. Ainda na década de 1960, a pesquisadora Mônica Zavaglia, da Embrapa Soja, cita a cultivar Davis, que devido à resistência às doenças mancha-olho-de-rã e podridão parda da haste perdurou por vários anos e deu origem a outras cultivares. “Finalmente, em 1966, temos o lançamento da primeira cultivar de soja genuinamente brasileira de importância comercial, que é a cultivar Santa Rosa. Ela é considerada uma das cultivares mais importantes de todos os tempos, destacando-se em várias décadas”, relata a pesquisadora.

    Nas duas décadas seguintes, a soja passa por um processo de expansão no Centro-Norte do Brasil, graças ao desempenho das primeiras cultivares genuinamente brasileiras com adaptação para as baixas latitudes brasileiras. Na década de 1970, o destaque são as cultivares UFV-1, desenvolvida pela Universidade Federal de Viçosa, e a FT Cristalina, desenvolvida pela FT Sementes. Em seguida, foi lançada a primeira cultivar desenvolvida pela Embrapa para o Brasil Central, a cultivar Doko, lançada em 1980. Ainda na década de 1980, destaca-se também a cultivar BR 9 (Savana), com adaptação para BA, TO, MA e PI.

    Na década de 1990, o foco dos programas de melhoramento foi direcionado para o aprimoramento da sanidade de raiz, com cultivares resistentes aos nematoides de galha e de cisto. Como destaque desta década, estarão em exposição as cultivares MG/BR 46 – Conquista (com resistência aos dois nematoides formadores de galhas, Meloidogyne incognita e M. javanica), BRSMG 68 [Vencedora] (com resistência à Meloidogyne incognita e moderada resistência à M. javanica) e BRSMT Pintado (com resistência às raças 1 e 3 e moderada resistência às raças 4, 10 e 14 do nematoide de cisto da soja). “É importante mencionar que o nematoide de cisto da soja foi identificado pela primeira vez no Brasil na safra 1991/92, progredindo rapidamente. Devido à sua resistência, a cultivar BRSMT Pintado foi uma das cultivares mais importantes no Brasil Central desde seu lançamento, sendo semeada até início dos anos 2020, explica Mônica.

    A partir dos anos 2000, teve início uma nova geração de cultivares, com a introdução dos transgênicos (soja com resistência ao herbicida glifosato). De acordo com o pesquisador Roberto Zito, da Embrapa Soja, destaca-se a cultivar BRS Valiosa RR, grande contribuição para os sojicultores do Brasil Central. Segundo ele, a busca por cultivares de ciclo e porte de planta que viabilizassem a semeadura do milho 2ª safra, foi o cenário para o sucesso da cultivar BRS 284, registrada em 2007: “grande destaque e continua sendo cultivada até os dias atuais”, ressalta Zito.

    Na década de 2010, depois da entrada dos transgênicos, houve grande redução das áreas com soja convencional, principalmente devido à falta de opções de cultivares. “Neste cenário, a cultivar convencional BRS 8381, de tipo de crescimento indeterminado (novidade para a época), arquitetura diferenciada de plantas, ampla adaptação (recomendada para os estados de GO, DF, MT, BA, TO e MG), ocupou grande espaço e é semeada até os dias atuais”, conta Zito. Outro destaque, nesta década, foi a cultivar transgênica BRS 7380 RR, que deu grande contribuição aos agricultores nas áreas com problemas de nematoides de cisto e formadores de galhas.

    Nos anos 2020, com a chegada da plataforma de soja transgênica com a tecnologia BT para o manejo das lagartas, o pesquisador destaca duas cultivares. A primeira é a BRS 5980 IPRO, cultivar precoce e que tem ampla resistência a nematoides de cisto e formadores de galhas. A outra é a cultivar BRS 7881IPRO, o mais recente lançamento, com alta produtividade e resistente aos nematoides de cisto e galha Meloidogyne javanica.

    Histórico da soja

    Há quatro mil anos, a soja era uma planta selvagem, que crescia na costa leste da Ásia. Nesse período, a leguminosa foi domesticada pelos chineses, o que a torna uma das culturas agrícolas mais antigas do mundo. “A soja semeada atualmente tem a constituição genética da ancestral chinesa, mas ela é diferente tanto em aparência quanto em características morfológicas e de produção”, explica Nepomuceno.

    De acordo com a publicação “A saga da soja: de 1050 a.C. a 2050 d.C”, editada pela Embrapa Soja, a soja chegou ao Brasil pela Bahia, em 1882, quando foram realizados os primeiros testes com cultivares introduzidas dos Estados Unidos, mas não houve sucesso. Somente após chegar ao RS, em 1914, para testes, e a partir de 1924, em plantios comerciais, é que a soja apresentou adaptação. Porém, a soja obteve importância econômica somente na década de 1960. Até o final da década de 1970, os plantios comerciais de soja no mundo restringiam-se a regiões de climas temperados e sub-tropicais, cujas latitudes estavam próximas ou superiores aos 30º. “O produtor brasileiro tinha que usar as cultivares importadas dos Estados Unidos que eram adaptadas apenas para a região Sul do Brasil”, explica o pesquisador Carlos Arias.  No quadro abaixo, estão as cultivares da Embrapa que fizeram e fazem a história da soja na região Centro-Norte do Brasil.

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  • Fertilizantes: vulnerabilidade brasileira e algumas ações para revertê-la

    Fertilizantes: vulnerabilidade brasileira e algumas ações para revertê-la

    Diversos fatores influenciam a produtividade das culturas, podendo ser classificados como bióticos, relacionados aos seres vivos ligados ao processo produtivo, além de fatores abióticos, dentre os quais destacam-se o clima, a física e a fertilidade do solo. Dentre esses últimos, a fertilidade do solo é o mais facilmente manejável, sendo inegável a relevância do uso de fertilizantes, corretivos e condicionadores de solo para proporcionar um melhor ambiente produtivo.

    No entanto, o Brasil importa aproximadamente 85% dos cerca de 41 milhões de toneladas de fertilizantes que consome anualmente. Entre os macronutrientes essenciais, importamos 90% dos nitrogenados (Rússia, China e Oriente Médio), 75% do fosfatados (China, Marrocos e Rússia) e 90% dos potássicos (Belarus, Canadá e Rússia). Registre-se que, afortunadamente, nossa principal commoditie agrícola, a soja, não depende de fertilizante nitrogenado, resultado obtido por intensas pesquisas na fixação biológica de nitrogênio (FBN).

    Essa dependência externa, uma questão de segurança e soberania nacional, é extremamente desconfortável para um player de nossa importância na agricultura mundial, principalmente porque uma parte expressiva desses fertilizantes provém de regiões politicamente instáveis, o que facilita a ação de especuladores e tem ocasionado elevações bruscas em seus preços.

    Entre os fertilizantes consumidos em maiores quantidades, o fósforo (P) e o potássio (K) dependem exclusivamente de reservas minerais, mas o nitrogênio (N) pode ser obtido a partir do gás natural ou de processo que fixa o N atmosférico, este último com grande consumo de energia elétrica.

    Importante destacar que essa situação incômoda não ocorre em relação ao calcário (corretivo de acidez) e do gesso agrícola (condicionador do solo), nos quais somos autossuficientes.

    As ações para reverter parcialmente essa dependência externa na obtenção dos fertilizantes, visando reduzi-la para 50% até 2050, incluem a prospecção de jazidas, o estímulo ao aumento da produção interna e o equacionamento de questões ambientais e logísticas, detalhadas no Plano Nacional de Fertilizantes, elaborado por um Grupo de Trabalho Interministerial, que foi recentemente revisto em suas metas. Ainda próximo dessa linha de ação, podemos citar o uso, como fertilizantes, de resíduos minerais ou orgânicos oriundos de cadeias industriais ou agroindustriais, o que proporciona adicionalmente uma oportunidade tangível de reduzir a geração de gases de efeito estufa e de reciclar nutrientes que, de outra forma, seriam destinados a aterros sanitários.

    Uma outra abordagem para equacionar esse problema é através da redução das quantidades requeridas de fertilizantes, decorrente do aumento da eficiência de uso desse insumo, sem comprometimento das produtividades. Constata-se que depois do advento dos fertilizantes minerais, a forma de fertilizar as culturas ficou praticamente inalterada durante décadas: fontes solúveis de N, P e K ainda são aplicadas ao solo, frequentemente com reduzida taxa de aproveitamento pelas culturas. Para exemplificar, estima-se que apenas 50% dos nutrientes aplicados sejam efetivamente utilizados pelas plantas, havendo perdas por fixação ao solo (P), lixiviação (N e K) e volatilização (N).

    Eficiência de uso dos fertilizantes

    O aumento da eficiência de uso dos fertilizantes requer diferentes estratégias, sendo que a mais utilizada é sincronizar a liberação dos nutrientes com o desenvolvimento das culturas, de forma a deixá-los disponíveis à medida que avança o ciclo das plantas, que atinge demanda máxima na fase de enchimento de grãos. O exemplo mais notório envolve o nitrogênio, em que são utilizadas técnicas de encapsulamento físico dos grânulos dos fertilizantes e/ou uso de substâncias retardantes químicos ou bioquímicos, o que é amplamente utilizado com a ureia, fonte de N mais comum no mercado.

    A fonte natural de P mais utilizada é a rocha fosfática (fosfato de cálcio), que deve ser submetida a tratamento ácido para aumentar sua solubilidade no solo. No entanto, formas muito solúveis, como o MAP (monoamônio fosfato), quando aplicadas em solos argilosos tropicais, estão sujeitas a fixação do P nos óxidos, ficando rapidamente indisponíveis para as plantas. Decorre desse processo que, embora nossos solos agrícolas já apresentem elevados níveis de fósforo devido ao longo histórico de fertilizações, parte expressiva desse elemento não permanece acessível às plantas. Para resolver esse problema, recentemente foram desenvolvidos produtos biológicos que conseguem disponibilizar parte desse fósforo, diminuindo a necessidade de adicionar fertilizantes.

    As abordagens acima citadas foram obtidas após anos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) pela Embrapa, universidades e outras instituições públicas de pesquisa e da iniciativa privada e não prescindem de soluções que envolvam o uso de plantas mais eficientes, bioestimulantes e aprimoramentos nos sistemas de produção. Apenas para exemplificar, o uso de plantas de cobertura pode reduzir alguns desses processos de perda de nutrientes ao proporcionar uma ciclagem entres as camadas mais profundas e a superfície do solo, sinalizando que estratégias combinadas podem ser mais eficientes para o aumento da eficiência das fertilizações.

    Dessa forma, entende-se que para manter o histórico de sucesso de nossa agricultura, com aumentos consistentes de produtividade, são necessários avanços constantes nas tecnologias de fertilidade do solo e manejo de plantas, proporcionando maior eficiência, menores custos e menores impactos ambientais.