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  • Rosa Weber: combate a fake news motiva discurso de ódio ao jornalismo

    Rosa Weber: combate a fake news motiva discurso de ódio ao jornalismo

    A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Rosa Weber, disse hoje (25) que, por atuar na “linha de frente contra a desinformação”, o jornalismo tornou-se “alvo constante da rede de ódio no Brasil”. A afirmação foi feita durante o seminário Liberdade de Imprensa: Onde Estamos e para Onde Vamos, na sede da CNJ em Brasília.

    “Situando-se na linha de frente contra a desinformação, a imprensa livre e os profissionais do jornalismo na defesa da transparência e da verdade são alvos constantes da rede de ódio no Brasil. De acordo com o relatório Monitoramento de Ataques a Jornalistas no Brasil da Abraji [Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo], em 2022 foram registrados 557 casos de agressões a jornalistas em nosso país. Dos casos reportados, 145 envolvem violência de gênero contra mulheres jornalistas”, disse a ministra.

    Rosa Weber acrescentou que o otimismo inicial com o surgimento de um “estado público global de comunicação, por meio da internet”, acabou por dar lugar ao “desalento ocasionado pela ocupação desse espaço naturalmente democrático por agentes do ódio e da desinformação”, e que esses grupos estariam determinados a manipular o pensamento individual e coletivo, de modo a desacreditar as instituições políticas, fomentar a discórdia, incitar a violência, instigar todas as formas de discriminação social.

    Segundo ela, o verdadeiro sentido da proteção constitucional à liberdade de manifestação e de pensamento é o de garantir “não apenas o pensamento daqueles que pensam como nós, mas, igualmente, proteger o direito dos que sustentam ideias que muitas vezes odiamos, abominamos e até mesmo repudiamos”.

    Desafio

    Nesse sentido, a ministra acrescentou que não existe uma teoria capaz de solucionar por si só a questão da desinformação. “Não há resposta simples para enfrentar a escala, o alcance e a frequência da propagação de desinformação nas redes de comunicação, especialmente contra a imprensa e os agentes de verificação da veracidade de tais notícias”.

    Para a ministra, entre os desafios atuais para a elaboração de uma estratégia de combate eficiente às fake news está o de compreender os mecanismos pelos quais a disseminação de informação opera, explorando preconceitos e vieses presentes na sociedade.

    “Esse tema traduz um dos grandes desafios das democracias modernas, especialmente nos países ameaçados cotidianamente pela ascensão de discursos autoritários e do pensamento fundamentalista. Enfrentá-los requer esforços coordenados e permanentes para trazer luzes sobre essa tarefa complexa”, afirmou.

    Edição: Denise Griesinger
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  • Polícia Federal vai investigar irregularidades em acordos da Lava Jato

    Polícia Federal vai investigar irregularidades em acordos da Lava Jato

    A pedido do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, vai encaminhar à Polícia Federal uma determinação para investigar a origem e o destino do dinheiro oriundo dos acordos de delação e leniência firmados na Operação Lava Jato.

    “É um imperativo legal, se eu recebo um documento oriundo do CNJ com a narrativa de crimes, eu sou obrigado a mandar para a polícia judiciária para que ela proceda à investigação”, explicou. Ele disse que recebeu nesta segunda-feira (18) um ofício do Corregedor Nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, sobre os indícios de irregularidades.

    O Corregedor também sugere a criação de um grupo de trabalhob (GT) com instituições do poder executivo para analisar a situação dos depósitos judiciais. Segundo Dino, será feita uma consulta aos órgãos do poder executivo para verificar a possibilidade de realização do GT.

    Na semana passada, o relatório parcial de inspeção realizada pelo CNJ na 13ª Vara Federal em Curitiba apontou que os acordos eram homologados pela vara sem todos os documentos necessários, como a apresentação das circunstâncias da celebração e as discussões ocorridas entre as partes.

    Edição: Denise Griesinger
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  • CNJ aponta “gestão caótica” de valores em acordos da Lava Jato

    CNJ aponta “gestão caótica” de valores em acordos da Lava Jato

    O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) encontrou indícios de “gestão caótica” no controle de valores oriundos de acordos de delação e leniência firmados na Operação Lava Jato.A conclusão está no relatório parcial de inspeção realizada pelo conselho na 13ª Vara Federal em Curitiba, que foi chefiada pelo ex-juiz e atual senador Sergio Moro (União-PR). A investigação começou em maio deste ano.

    De acordo com o documento, os acordos eram homologados pela vara sem todos os documentos necessários, como a apresentação das circunstâncias da celebração e as discussões ocorridas entre as partes.Os servidores responsáveis pela investigação também afirmam que os acordos poderiam beneficiar o repasse de R$ 2,5 bilhões de recursos desviados da Petrobras para a criação da chamada Fundação Lava Jato, gerida pela própria força-tarefa, que foi chefiada pelo ex-procurador Deltan Dallagnol.

    “Verificou-se a existência de um possível conluio envolvendo os diversos operadores do sistema de justiça, no sentido de destinar valores e recursos no Brasil, para permitir que a Petrobras pagasse acordos no exterior que retornariam para interesse exclusivo da força-tarefa”, diz o documento.

    A correição cita ainda que os acordos de leniência assinados entre a Lava Jato, a Odebrecht e a Braskem foram assinados sem informações completas e com valores estipulados por autoridades estrangeiras, conduta que foi considerada “absurda” pelos técnicos.

    “Os expedientes de correição externaram que os magistrados atuantes na 13ª Vara Federal de Curitiba se conformavam com a ausência de informações relacionadas, por exemplo, às tratativas realizadas, ao método utilizado para definição de valores e de vítimas, ausência de documentos produzidos pela defesa técnica durante as discussões e tudo mais que fosse necessário para imprimir transparência e viabilizar a avaliação”, conclui o relatório.

    O relatório final sobre as irregularidades encontradas na 13ª Vara Federal de Curitiba deve ser analisado neste mês pelo plenário do CNJ. O Conselho deve propor a abertura de investigação contra os juízes e procuradores que trabalharam nas investigações da Lava Jato.

    Na semana passada, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou provas obtidas nos acordos de leniência da Odebrecht e determinou que a Advocacia-Geral da União (AGU) abra investigação contra os agentes públicos que participaram da assinatura dos acordos.

    Outro lado

    Em publicação nas redes sociais, Sergio Moro afirmou que os acordos foram homologados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pelo ministro Luis Felipe Salomão, corregedor do CNJ, responsável pela investigação.

    “O próprio corregedor nacional de Justiça homologou, então na condição de ministro do STJ, pelo menos um acordo de colaboração, com Frank Geyer Abubakir, então investigado pela Lava Jato, com cláusulas e condições semelhantes e sobre elas nunca se apontaram qualquer irregularidade”, afirmou.

    Moro também acrescentou que nenhum desvio de recursos foi identificado e que o relatório do CNJ é “mera opinião preliminar”.

    “Repudia-se o emprego da expressão ‘gestão caótica’ que não faz justiça à operação que recuperou mais de seis bilhões de reais para a Petrobras, fato sem precedente na história”, concluiu.

    Edição: Sabrina Craide
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  • CPI da Câmara Distrital aprova convocação de Delgatti

    CPI da Câmara Distrital aprova convocação de Delgatti

    Os deputados distritais que integram a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa do Distrito Federal aprovaram, nesta quinta-feira (24), a convocação do hacker Walter Delgatti Neto.

    Conhecido como Hacker da Vaza Jato, Delgatti é suspeito de invadir os sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e inserir falsos documentos e alvarás de soltura no Banco Nacional de Mandados de Prisão.

    O hacker também responde a processo por ter invadido os telefones celulares do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública e hoje senador Sergio Moro (União Brasil – PR), acessando e divulgando as conversas de Moro com outras autoridades, como o ex-coordenador da força-tarefa Lava Jato e atual deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR).

    A divulgação das informações extraídas ilegalmente dos aparelhos telefônicos de autoridades públicas deu origem à chamada Operação Vaza Jato, que expôs os bastidores da Operação Lava Jato, reforçando os argumentos dos críticos que acusavam o Poder Judiciário de vazar informações sigilosas de forma seletiva, com fins políticos, além de violar o devido processo legal e o princípio da imparcialidade e abusar das prisões preventivas a fim de forçar os investigados a fazerem acordos de delação premiada.

    Nesta segunda-feira (21), o juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal em Brasília, condenou Delgatti a 20 anos de prisão e outros seis acusados por invadirem os aparelhos celulares de Moro e acessar a conta do ex-ministro no aplicativo de mensagens Telegram. A decisão judicial comporta recurso.

    Delgatti prestou depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), do Congresso Nacional, no último dia 17. Na ocasião, o hacker afirmou que invadiu o sistema do CNJ a fim de desmoralizar o Poder Judiciário, agindo a mando da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), de quem ele afirma ter recebido R$ 40 mil. Delgatti também assegura ter se reunido com o ex-presidente Jair Bolsonaro e que este teria pedido que ele assumisse a autoria de um suposto grampo contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Zambelli e Bolsonaro negam as acusações.

    Informações

    Os deputados distritais também aprovaram dois requerimentos de informação. Um deles pede informações ao Comando Militar do Planalto, unidade responsável pela segurança da área onde fica o Quartel-General do Exército, em Brasília. Parte dos vândalos e golpistas que invadiram e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e a sede do Supremo Tribunal Federal (STF) em 8 de janeiro deste ano permaneceram acampados diante do quartel por meses.

    Em depoimento à própria CPI da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o ex-chefe do Comando Militar do Planalto, general Gustavo Henrique Dutra, já disse que nenhuma instituição pública responsável tomou qualquer medida contra o acampamento antes do 8 de janeiro. E que, no dia do ataque aos Três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), convenceu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seus principais assessores a não autorizarem que os extremistas fossem detidos no mesmo dia, evitando um possível confronto.

    O segundo requerimento aprovado requer ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) que forneça todas as informações disponíveis relativas aos atos de vandalismo de 8 de janeiro, esclarecendo quais medidas de segurança foram adotadas a fim de evitar a invasão do Palácio do Planalto.

    Edição: Valéria Aguiar

  • Ministra Rosa Weber inicia mutirão carcerário pelo país

    Ministra Rosa Weber inicia mutirão carcerário pelo país

    A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, inaugura hoje (24) nova edição do mutirão carcerário nos presídios brasileiros. O programa terá duração de um mês, período em que devem ser revisados mais de 100 mil processos criminais para verificar a situação de detentos.

    O trabalho será realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que também é presidido pela ministra. Criado em 2008, o mutirão será realizado pela primeira vez de forma simultânea em todos os estados. Nas edições anteriores, a revisão de processos era realizada separadamente em cada unidade da federação.

    Nesta semana, a ministra vai acompanhar pessoalmente a realização dos mutirões em Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Bahia, Minas Gerais e São Paulo.

    Durante o trabalho de fiscalização, os técnicos dos tribunais estaduais e do CNJ vão analisar os processos envolvendo gestantes, mães, pais e responsáveis por menores de 12 anos, grupo que tem direito à prisão domiciliar, de detentos que já cumpriram a pena, mas continuam presos, além dos processos de investigados por tráfico de pequenas quantidades de drogas.

    Os dados sobre o mutirão devem ser divulgados em setembro.

    Desde a criação do projeto, foram analisados cerca de 400 mil processos, que concederam 80 mil benefícios de progressão de pena, liberdade provisória e trabalho externo. Cerca de 45 mil presos foram soltos por terem cumprido suas penas.

    Edição: Valéria Aguiar

  • Tortura é prática disseminada pelo Estado, dizem especialistas

    Tortura é prática disseminada pelo Estado, dizem especialistas

    Um homem morto asfixiado com gás no porta malas de uma viatura policial, dedos de pessoas presas fraturados por agentes penitenciários, policiais carregando um rapaz com mãos e pés amarrados com cordas e um ajudante de pedreiro desaparecido há dez anos após abordagem policial. Os casos parecem saídos do período da ditadura militar no país, mas estão no passado recente da democracia brasileira. 

    Neste Dia de Apoio às Vítimas da Tortura – 26 de junho – especialistas ouvidos pela Agência Brasil afirmam que a tortura é uma prática estrutural no país e que não aparece apenas em casos isolados.

    “Eu entendo essas práticas como tortura e maus tratos. Sem dúvida nenhuma, o que a gente testemunha no Brasil, enquanto tortura e maus tratos, tem relação direta com o nosso passado ditatorial. E eu iria até mais longe, tem relação direta com o nosso passado escravista”, disse Gabrielle Abreu, coordenadora executiva de Memória, Verdade e Justiça do Instituto Vladimir Herzog.

    Para ela, há uma linha de continuidade no que diz respeito à tortura e maus tratos que remonta à escravidão, aos séculos passados, e perpassa pelo século 20, tendo a ditadura como uma oportunidade que a tortura teve no Brasil de se aprimorar, se alastrar e se tornar praticamente um código de conduta não explícito dos agentes das forças de segurança pública no Brasil.

    “Esse episódio em que o homem foi amarrado, suspenso, pelas mãos e pelos pés, me remeteu ao pau de arara, que era um instrumento de tortura muito utilizado pela ditadura e foi muito usado também na escravidão contra homens e mulheres, negros e negras, que foram escravizados”, acrescentou. Segundo a historiadora, tem um fio de continuidade que é preciso romper o quanto antes. “Senão, a história do Brasil vai se tornar uma história de tortura, de maus tratos, de violência e, acima de tudo, uma história de impunidade”, enfatizou.

    Divulgado em abril deste ano pelo Instituto Vladimir Herzog, o monitoramento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV) revelou que o item que recomenda ao estado brasileiro a criação de mecanismos de prevenção e combate à tortura apresentou retrocesso. A CNV investigou violações de direitos humanos cometidas na ditadura militar.

    “Em relação à tortura e maus tratos, o retrocesso é completo. O estado atual é de muita negligência desses instrumentos [de combate e prevenção à tortura], a gente encontrou quase um terreno de terra arrasada mesmo e está num estado da coisa pior do que quando a CNV concluiu seus trabalhos”, revelou Gabrielle.

    Do total de 29 recomendações da CNV, apenas duas foram realizadas (7%) e seis parcialmente realizadas (21%), totalizando aproximadamente 28%. As não efetivadas e retrocedidas conformam a maioria de cerca de 72%, sendo 14 não realizadas (48%) e sete retrocedidas (24%), o que revela uma situação preocupante, segundo o Instituto Vladimir Herzog.

    Prevenção

    Um dos itens considerado realizado é o que diz respeito à introdução da audiência de custódia para prevenção da prática da tortura e de prisão ilegal. Apesar da implantação dessas audiências, entidades de direitos humanos ouvidas pela Agência Brasil apontaram ineficiência do mecanismo no combate a violações do estado.

    De acordo com o relatório, a ausência de responsabilização dos agentes públicos que cometeram graves violações de direitos humanos na ditadura é um dos pilares da contínua impunidade que impera no país em relação aos que atentam contra os direitos humanos e a democracia.

    “A gente passa pela ditadura, não responsabiliza, sequer identifica os torturadores, os agentes públicos da ditadura, não se faz qualquer investigação e a gente chega nesse presente onde a tortura é totalmente naturalizada no Brasil. É difícil chocar as pessoas, independente das práticas cometidas serem bárbaras e cruéis, não há grande sensibilização pública porque a gente já entrou no modo de naturalização muito nocivo dessas práticas”, disse Gabrielle.

    Caso recente em que um suspeito foi amarrado pelos pés e mãos com corda por policiais militares durante sua prisão por furto já teve desdobramento na justiça paulista que o tornou réu. Já os policiais, que estão afastados das atividades operacionais, seguem ainda em investigação para apurar “eventuais excessos”, segundo informou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP).

    Vídeos da abordagem mostram Robson Rodrigo Francisco com as mãos amarradas aos pés, de forma que não permitia que ele ficasse em pé, nem sentado. As imagens mostram que ele é arrastado pelo chão dentro de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e depois carregado por dois policiais militares, segurando-o pela corda e pela camiseta. Ainda amarrado, ele é colocado no porta-malas de uma viatura.

    “O caso do Robson é um exemplo de muitos outros que acontecem no estado de São Paulo e em outros lugares do país, em que a ausência de uma política institucional que objetive a mudança de cultura dentro das corporações policiais e, ao mesmo tempo, mecanismos que permitam a fiscalização dos estabelecimentos, a detecção e a apuração dessas práticas [faz com] que [situações assim] continuem se repetindo na nossa história, nos momentos atuais, como ocorreram durante a ditadura”, disse a coordenadora auxiliar do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública de São Paulo, Surraily Youssef.

    Problema estrutural

    O Brasil tem ainda uma justiça de transição inacabada. Muitos dos relatos de tortura e violência que aconteceram na ditadura militar ainda não foram apurados, apesar da existência da Comissão da Verdade, avaliou Youssef. “O cenário hoje é que a tortura ainda é uma realidade no país. E por que ela é ainda uma realidade? Porque a gente precisa fortalecer os mecanismos institucionais de apuração e de detecção da tortura”, disse. Para ela, a prática de tortura no país ainda é estrutural e é preciso uma mudança de cultura dos agentes estatais de segurança e de sua maneira de atuação.

    Para Youssef, dados das audiências de custódia, nas quais a Defensoria Pública atua na defesa de pessoas presas em flagrante, demonstram que em muitos casos há relatos de violência policial, prática de tortura e outros maus tratos. Informação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra ainda que o órgão recebeu, desde 2005, mais de 85 mil denúncias de tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante nas audiências de custódia.

    “Muitas vezes há uma desconsideração da prática da tortura que não é física, que é psicológica também, que é marcada por uma série de mobilização de estereótipos, de ameaças, de xingamentos e que isso também pode provocar o sofrimento intenso e que pode ser qualificado como tortura”, acrescentou.

    O relatório Pontos Cegos da Tortura – elaborado pela Defensoria durante a pandemia de covid-19, quando as audiências de custódia foram suspensas no estado de São Paulo – concluiu que a grande maioria dos autos de prisão em flagrante não tinha juntado o exame de corpo de delito, o que contrariava recomendação do CNJ.

    Após análise de 602 autos de prisão em flagrante de março de 2021 – realizados na Baixada Santista e na capital – a Defensoria concluiu que em menos de 2% dos casos foi realizado o exame de corpo de delito, juntado o laudo ou feito registro fotográfico, que são documentos essenciais para averiguação da prática de violência e tortura.

    “Apesar da resolução do CNJ determinar que, mesmo que a audiência de custódia tivesse suspensa, deveria existir uma análise do laudo pericial de todas as pessoas presas em flagrante, acompanhada da fotografia dessas pessoas, para que houvesse uma mínima identificação de prática de violência ou tortura, a gente percebeu que isso não foi feito pelo judiciário paulista”, disse a defensora. Segundo ela, esse resultado aponta que não houve uma preocupação clara em entender esse mecanismo institucional como essencial para averiguar as práticas de violência.

    A compreensão da tortura como estrutural também abrange as condições a que os presos são submetidos nas unidades penitenciárias, como ausência de acesso à alimentação, a bens materiais e superlotação, o que é realidade no país.

    Vítima

    O combate à tortura deve ser feito por uma série de mecanismos que possam funcionar de forma articulada, mas que tenham como centralidade a ampliação da narrativa daquela pessoa que é vítima de tortura, de acordo com Youssef.

    “Não é à toa que o dia 26 é chamado de Dia de Apoio às Vítimas de Tortura, porque é só a partir do momento que a gente dá centralidade para narrativa dessas vítimas que é possível se pensar [em] mecanismos de apuração, de reparação e apoio psicológico a essas vítimas. Esse é um fator muito importante de ser pensado quando a gente pensa nos mecanismos institucionais”, disse.

    Entre os mecanismos citados pela defensora estão as audiências de custódia, sua institucionalização e ampliação dos espaços de escuta das vítimas; o fortalecimento das perícias e dos fluxos de investigação das denúncias, principalmente tendo em vista que hoje essa investigação é feita pelo próprio batalhão, no caso das polícias militares; e o fortalecimento de mecanismos tanto de controle social, quanto o mecanismos institucionais de inspeções e supervisão dos estabelecimentos de privação de liberdade.

    “Além disso, obviamente, pensar em outra cultura dentro das corporações policiais, e isso passa por organização de cursos de formação para esses policiais, e que exista a participação, inclusive, de pessoas que já foram vítimas de violência e que possam trazer essa perspectiva, curso de direitos humanos, cursos práticos para esses profissionais”, apontou.

    Ela acrescentou que o combate a violações passa ainda por corregedorias fortalecidas e institucionalização do uso das câmeras corporais, não só na Polícia Militar, mas na Polícia Civil. Segundo ela, o uso das câmeras por policiais, que ainda não é disseminado pelo país, ajuda a compreender que muitas das abordagens policiais são acompanhadas de práticas de tortura e de violência.

    Reparação e memória

    Pensar na apuração de tortura também é pensar em mecanismos de memória, segundo a defensora pública, como desculpas públicas e indenizações. “Não é só quando há uma responsabilização criminal do agente que se pensa em mecanismo de reparação de prática de tortura. É preciso repensar também a própria maneira como o Estado repara, de reconhecer a prática, de realizar pedidos de desculpas públicas, de construir espaços onde essas pessoas possam ter apoio psicológico, porque a violência de tortura é para sempre, ela vai deixar marcas”.

    “O Estado reconhecer a violência é o primeiro passo para a gente começar a transformar essa realidade estrutural que, desde antes da ditadura militar, a gente vive e que afeta determinadas pessoas que são mais vulneráveis: pessoas negras, pobres, periféricas, mulheres”, acrescentou.

    A coordenadora do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, a advogada Carolina Barreto Lemos, avalia que a não responsabilização por violações de direitos humanos é algo que marca a história do país.

    “É uma história de muitas anistias. A não responsabilização passa o recado é de que está tudo bem, de que não é algo pelo que as instâncias e as autoridades precisam responder e que as pessoas não precisam ser responsabilizadas por isso”, disse.

    Para ela, esse contexto contribui de maneira enorme para naturalização de atos de tortura e maus tratos, no entanto, não houve nenhuma reparação simbólica no país em relação ao período da ditadura militar. “Seria uma forma de romper com essa prática que ficou tão visibilizada na ditadura. A responsabilização teria sido uma forma de simbolicamente dizer ‘nós não aceitamos a prática de tortura no Brasil’ e, no entanto, mesmo nesse caso, houve uma anistia que novamente vem naturalizar isso como algo que não tem problema torturar pessoas presas”, acrescentou.

    A advogada avalia que não houve ruptura pós ditadura militar em relação à violência nas situações de privação de liberdade. “A tortura continua tão disseminada quanto [antes], mas menos visibilizada porque agora ela volta a atingir aquele sujeito que historicamente foi atingido e que sofre com uma forma de desumanização e naturalização da periclitação de suas vidas”, disse, referindo-se à população negra e pobre.

    “Tem algo bem anterior, inclusive à própria ditadura, que é aquilo que marca essa política criminal de encarceramento em massa: o racismo estrutural. A desumanização de pessoas pobres e negras é algo que naturalizou historicamente as práticas de tortura no Brasil desde a escravidão”, disse a advogada.

    Controle externo

    Em relação aos mecanismos de prevenção e tortura no país, ela avalia que o controle externo é fundamental para alcançar tal objetivo. “Sem controle externo, não tem como combater ou prevenir. Porque, se existe a ideia de que aquele local está longe do olhar do público, que ele não está sujeito a um controle externo nem à fiscalização, você cria todas as condições para que a tortura aconteça e para que não haja responsabilização, porque inclusive não será sequer denunciada, nem conhecida”, finaliza.

    Ela ressalta a importância da atuação dos órgãos que estão previstos por lei para a fiscalização da execução da pena, que são a Defensoria Pública, o Ministério Público e poder judiciário. “É fundamental um trabalho sistemático e qualificado de prevenção dessas práticas por meio da ação fiscalizatória, que é você fazer as visitas não anunciadas, chegar de surpresa das unidades para ver o que está acontecendo de fato”, citou.

    Lembrando do Robson, que foi amarrado por cordas, do Genivaldo, que foi morto após asfixiamento no porta malas de uma viatura policial, das pessoas presas que tiveram seus dedos quebrados, Lemos ressalta que é fundamental que os poderes deem uma resposta à sociedade. “No caso do rapaz que foi acorrentado pelas mãos e pés e carregado, já teve uma resposta muito ruim por parte das autoridades, inclusive dizer que aquilo não é tortura, então isso já traz uma preocupação.”

    “A gente tem que pensar em ações de não repetição. As polícias precisam ter protocolos, e também responsabilizarem seus agentes administrativamente a partir desses protocolos. Porque, se existe um protocolo em uma polícia de que é permitido acorrentar e carregar o sujeito daquela forma, esse protocolo precisa ser revisto. E, se não existe, então precisa apurar e responsabilizar [os agentes]”, disse.

    Além disso, a advogada avalia a necessidade de rever a forma que esses agentes estão sendo formados “porque eles não estão fazendo isso a partir do nada, tem alguma coisa institucionalmente que está sendo colocada para eles para atuarem dessa maneira”.

    Edição: Kleber Sampaio

  • Doenças causam 62% das mortes nas prisões brasileiras, mostra estudo

    Doenças causam 62% das mortes nas prisões brasileiras, mostra estudo

    As mortes ocorridas dentro das prisões brasileiras são provocadas, em 62% dos casos, por doenças como insuficiência cardíaca, sepse ou infecção generalizada, pneumonia e tuberculose. Os dados constam de um estudo encomendado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

    A pesquisa foi conduzida pelas professoras Maíra Rocha Machado, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), e Natália Pires Vasconcelos, do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), que se debruçaram sobre mais de 112 mil casos em que houve a extinção da punição em razão da morte da pessoa condenada, entre os anos de 2017 e 2021.

    No caso da tuberculose, por exemplo, a chance de se pegar a doença dentro do sistema prisional é 30 vezes maior do que a observada na população em liberdade. O risco de morte por caquexia – enfraquecimento extremo – é 1.350% maior entre quem está na cadeia do que na população em geral, destacou o CNJ.

    Os óbitos foram potencializados durante a pandemia de covid-19, aponta o relatório, em função da suspensão das visitas familiares, em que havia reforço na alimentação, bem como da interrupção de atendimentos médicos e da distribuição de medicamentos para o tratamento de doenças como a tuberculose e HIV/Aids.

    “Morre-se muito, sabe-se pouco, registra-se quase nada. Praticamente não se responsabiliza, tampouco se repara”, diz o documento Letalidade Prisional: uma Questão de Justiça e Saúde Pública.

    O estudo indica ainda a ocorrência de subnotificação de mortes e afirma a necessidade de ampliar a oferta de serviços de saúde às pessoas sob custódia estatal. O estudo conclui que a chamada morte natural “é, na verdade, o resultado de um longo e tortuoso processo de adoecimento, falta de assistência, definhamento e óbito”.

    As mortes causadas por ferimento de arma de fogo e agressão por objetos cortantes, penetrantes, perfurantes ou contundentes dentro da unidade prisional, somadas às mortes por enforcamento indireto, somam 25% dos óbitos nas prisões. Outros 15% são causados por asfixia mecânica, o estrangulamento, ou sufocação indireta e as asfixias não especificadas.

    No universo pesquisado, entre aqueles que retornaram ao convívio social, o tempo médio de vida foi de 548 dias, com 28% das mortes provocadas por eventos violentos.

    O documento recomenda 36 providências, como ações coordenadas para a superação de violações de direitos humanos e a mobilização de juízes e tribunais para garantir medidas estratégicas. A íntegra da pesquisa está disponível no portal do CNJ.

    Edição: Denise Griesinger

  • CNJ começa mutirão para dar certidão de nascimento a quem nunca a teve

    CNJ começa mutirão para dar certidão de nascimento a quem nunca a teve

    O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) começou hoje (8) uma semana de esforço concentrado para tentar reduzir o número de brasileiros que nunca tiveram nenhum documento, um contingente de 2,7 milhões de pessoas, segundo informações do Censo 2022 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

    Até a próxima sexta-feira (12), o órgão promove o mutirão em todas as unidades da federação. A prioridade será dada a pessoas em situação de rua, que dependem da documentação civil para ter acesso a direitos básicos, como programas assistenciais, matrículas em escolas públicas e atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS).

    A “1ª Semana Nacional de Registro Civil – Registre-se!” faz parte do Programa de Enfrentamento ao Sub-Registro Civil e de Ampliação ao Acesso à Documentação Básica por Pessoas Vulneráveis, criado neste ano pela Corregedoria Nacional de Justiça, um dos braços do CNJ.

    Outras populações socialmente vulneráveis também são alvo da iniciativa, como os povos indígenas, ribeirinhos, refugiados e população carcerária. O mutirão deve se repetir ao menos uma vez por ano, diz o provimento que criou a semana.

    O foco, contudo, deve ser dado ao registro de pessoas em situação de rua, grupo que aumentou 211% entre 2012 e 2022, segundo levantamento do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (Ipea). De acordo com o estudo, há no Brasil mais de 230 mil pessoas nessa condição.

    “O que nós percebemos agora, com a pandemia, é que houve um acréscimo de população de rua, houve uma urgência de benefícios sociais. Nós realizamos convênio com os ministérios do Desenvolvimento Social, do Trabalho, de modo que, a partir do registro e já ali mesmo no local, poderão ser encaminhadas para a capacitação e para um futuro emprego”, disse ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), atual corregedor-nacional.

    Para que a iniciativa alcance esse público alvo, o CNJ tem mobilizado instituições e pessoas que já trabalham com essa temática, como o padre Júlio Lancelotti, que presta auxílio à população de rua de São Paulo e é porta-voz da campanha nacional.

    Segundo o CNJ, o mutirão contará com o apoio da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil) e demais associações de registradores civis para viabilizar a certidão de nascimento da população desprotegida social e economicamente.

    Defensorias públicas e o Ministério Público também são parceiros da iniciativa, auxiliando na presença de registradores em praças públicas, por exemplo. As corregedorias-gerais dos tribunais de cada estado ficarão a cargo de fiscalizar e apresentar os resultados do mutirão.

  • CNJ determina que o TIMT não aplique o aumento das custas em processos iniciados antes de 2021

    CNJ determina que o TIMT não aplique o aumento das custas em processos iniciados antes de 2021

    O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) considerou irregular a forma de cobrança das custas processuais pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) após a entrada em vigor da Lei estadual 11.077/20. A decisão foi proferida em sede de Procedimento de Controle Administrativo requerido pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT).

    Com isso, o CNJ suspendeu a cobrança das novas custas judiciais sobre os processos que foram distribuídos antes de 2021, quando passou a vigorar a lei. Também determinou prazo de 30 dias para que o TJMT regulamente a devolução dos valores cobrados a maior a quem requerer.

    “Trata-se de uma grande vitória que transcende a advocacia de Mato Grosso e que beneficia toda a sociedade”, comemorou a presidente da OAB-MT, Gisela Cardoso.

    Conforme explica Gisela, a irregularidade constava na não observação do que dispõe o artigo 15 da Lei 11.077/20, que estabelece a aplicação das custas previstas na nova lei apenas aos processos distribuídos após a data da sua vigência, em janeiro de 2021.

    “Identificamos as irregularidades nas guias de preparo emitidas para recursos de apelação e de agravo de instrumento interpostos em processos distribuídos antes da vigência da nova lei e partir disso passamos a buscar a adequação da lei, resultando no processo junto ao CNJ. Nos últimos dois anos atuamos fortemente para chegar à essa decisão”, conta a presidente da OAB-MT.

    Na prática, a nova regra prejudicou tanto os jurisdicionados quanto à atuação da advocacia, pois algumas alíquotas tiveram aumento exorbitante, como foi o caso da interposição de recursos oriundos da 1ª instância, com aumento entre 220,95% e 23.283,17%.

    Os valores especificados na Lei 11.077/20 continuam valendo para os processos distribuídos a partir de 2021.

  • Bancas de concurso para juízes terão paridade de gênero obrigatória

    Bancas de concurso para juízes terão paridade de gênero obrigatória

    O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, por unanimidade, ato normativo que obriga a paridade de gênero – ou seja, mesmo número de homens e mulheres – nas comissões examinadoras e bancas de todos os concursos públicos para o cargo de juiz no Brasil. A decisão foi tomada na última terça-feira (28).

    Outra mudança aprovada foi a inclusão obrigatória de questões sobre direitos humanos em todos os concursos públicos da Justiça. Tal obrigatoriedade existia somente no caso da Justiça militar.

    Relatora do tema, a conselheira Salise Monteiro Sanchotene destacou que os percentuais de presença feminina no Judiciário encontram-se estagnados desde 2019, no patamar de 38%. “O teto de vidro na magistratura existe e constatamos também uma diminuição do ingresso de magistradas”, disse.

    A paridade está próxima somente na Justiça do Trabalho, em que as mulheres representam 49% da magistratura. Na primeira instância, elas são 40%, enquanto que nas demais, apenas 25% são desembargadoras ou ministras. Desde 2018, o CNJ instituiu a Política Nacional de Incentivo à Participação Feminina no Poder Judiciário.

    Durante a votação sobre a paridade nas bancas, a conselheira também destacou a publicação de um novo Repositório de Mulheres Juristas do CNJ, que compila o currículo de 500 mulheres especialistas em diversos temas do direito – entre advogadas, juízas, defensoras públicas, integrantes do Ministério Público e outras operadoras de direito.

    Segundo Sanchotene, a ferramenta vem auxiliar na localização de “mulheres que podem ser citadas nos votos, ter participação incluída em bancas de concurso e em mesas de eventos jurídicos”.

    Edição: Kelly Oliveira