Tag: Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023

  • Registros de racismo e homofobia disparam no país em 2022

    Registros de racismo e homofobia disparam no país em 2022

    Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgados hoje (20), mostram que o número de registros dos crimes de injúria racial, racismo e homofobia ou transfobia dispararam em 2022 no país na comparação com o ano anterio.

    Os registros de racismo saltaram de 1.464 casos em 2021, para 2.458, em 2022. A taxa nacional em 2022 ficou em 1,66 casos a cada 100 mil habitantes, uma alta de 67% em relação ao ano anterior. Os estados com as maiores taxas, de acordo com o anuário, foram: Rondônia (5,8 casos a cada 100 mil habitantes), Amapá (5,2), Sergipe (4,8), Acre (3,3), e Espírito Santo (3,1).

    Os registros de injúria racial também cresceram. Em 2021 foram 10.814 casos e, em 2022, 10.990. A taxa em 2022 ficou em 7,63 a cada 100 habitantes, 32,3% superior à do ano anterior (5,77). As unidades da federação com as maiores taxas foram Distrito Federal (22,5 casos a cada 100 mil habitantes), Santa Catarina (20,3), e Mato Grosso do Sul (17).

    Já o crime de racismo por homofobia ou transfobia teve 488 casos registrados em 2022 no país, ante 326, em 2021. A taxa nacional por 100 mil habitantes em 2022 ficou em 0,44 – 53,6% superior ao ano anterior. Os estados com as maiores taxas foram: Distrito Federal (2,4), Rio Grande do Sul (1,1), e Goiás (0,9).

    “Observamos grandes aumentos das taxas de injúria racial (que cresceu 32,3%) e racismo (que cresceu 67%), denotando aumento da demanda por acesso ao direito à não-discriminação”, destaca o texto do anuário.

    O FBSP criticou a falta de dados, que deveriam ser fornecidos pelos órgãos oficiais, referentes ao número de pessoas do grupo LGBTQIA+ vítimas de lesão corporal, homicídio e estupro.

    “Quanto aos dados referentes a LGBTQIA+ vítimas de lesão corporal, homicídio e estupro, seguimos com a altíssima subnotificação. Como de costume, o Estado demonstra-se não incapaz, porque possui capacidade administrativa e recursos humanos para tanto, mas desinteressado em endereçar e solucionar”, diz o texto.

    De acordo com o FBSP, para a quantificação desses crimes é necessário contar com dados produzidos pela sociedade civil, como os da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e do Grupo Gay da Bahia (GGB).

    De acordo com o anuário, a ANTRA contabilizou, em 2022, 131 vítimas trans e travestis de homicídio. Já o GGB registrou 256 vítimas LGBTQIA+ do mesmo crime em 2022. “O Estado deu conta de contar 163, 63% do que contabilizou a organização da sociedade civil, demonstrando que as estatísticas oficiais pouco informam da realidade da violência contra LGBTQIA+ no país”.

    “Se bases de dados são instrumentos primários de transformação social, o que a produção de dados oficiais desinformativos diz sobre o destino para o qual caminhamos no enfrentamento aos crimes de ódio no Brasil?”, questionou o texto do anuário.

    Edição: Denise Griesinger

  • Mortes violentas intencionais no país caem 2,4% em 2022

    Mortes violentas intencionais no país caem 2,4% em 2022

    A taxa de mortes violentas intencionais caiu 2,4% no país em 2022 na comparação com 2021. São consideradas mortes violentas não intencionais aquelas decorrentes de homicídios dolosos, latrocínio, lesão corporal seguida de morte, intervenção policial e morte de policiais. Os dados, divulgados hoje (20), são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).  

    A taxa de mortes violentas intencionais (MVI) passou de 24 para cada 100 mil habitantes em 2021, para 23,4 a cada 100 mil no ano passado. Em números absolutos, a quantidade caiu de 48.431 em 2021, para 47.508 em 2022 – a menor desde 2011, o primeiro ano da série histórica do fórum.

    De acordo com a supervisora do Núcleo de Dados do FBSP, Isabela Sobral, a queda nacional foi puxada principalmente pela diminuição da violência nos estados do Norte e Nordeste. Nas regiões Sul e Centro-oeste, as taxas de MVI cresceram 3,4% e 0,8%, respectivamente. As demais regiões registraram queda: Sudeste (-2%); Norte (-2,7%); e Nordeste (-4,5%).

    De acordo com Isabela, a queda na taxa de MVI nos estados do Norte e Nordeste em 2022 é uma acomodação dos números, que pode ser explicada pelo patamar alto de comparação dos anos anteriores, a partir de 2016.

    “A baixa [no Norte e Nordeste] está muito relacionada a essa questão de ter tido uma explosão muito grande de violência nos últimos anos lá. Agora, está voltando ao patamar anterior a essa explosão. E essa explosão no Norte e Nordeste é muito devida à questão do crime organizado. Facções como o PCC e o Comando Vermelho, que surgem no Sudeste nos anos 2000, migram para as regiões Norte e Nordeste e as mortes explodem”, destaca.

    “E essa redução que a gente observa agora tem a ver com o passar desse momento de conflito maior que ocorreu a partir de 2016.”

    Apesar da queda nos índices, o Norte e o Nordeste ainda têm os estados mais violentos. O Amapá lidera o ranking de estado mais violento do país em 2022, com taxa de MVI de 50,6 por 100 mil habitantes, mais que o dobro da média nacional (23,4/100mil). O segundo estado mais letal foi a Bahia, com taxa de 47,1 por 100 mil habitantes, seguido do o Amazonas (38,8/100 mil).

    Já as unidades da federação com as menores taxas de violência letal foram São Paulo, com 8,4 mortes por 100 mil habitantes, Santa Catarina, com 9,1 por 100 mil, e o Distrito Federal, com taxa de 11,3. Ao todo, 20 estados registraram taxas de MVI acima da média nacional.

    Arte - Anuário de Segurança Pública. Arte/Agência Brasil

    Arte/Agência Brasil

    Racismo

    O perfil das vítimas de mortes violentas intencionais não se alterou significativamente no ano passado na comparação com o anterior. Os dados do FBSP mostram que, em média, 91,4% das mortes violentas intencionais vitimaram homens, enquanto 8,6%, mulheres. Já em relação a óbitos em intervenções policiais, 99,2% das vítimas eram do sexo masculino.

    Em relação ao perfil étnico-racial das vítimas de MVI em 2022, 76,5% eram negros. Segundo o FBSP, os negros são o principal grupo vitimado pela violência independentemente da ocorrência registrada, e chegaram a ser 83,1% das vítimas de intervenções policiais.

    Mesmo entre os latrocínios, que são os roubos seguidos de morte, a vitimização de pessoas negras é maior do que a participação proporcional delas na composição demográfica da população brasileira.

    “Chama atenção que não exista um debate mais amplo sobre suas origens, causas e possibilidades de redução. É um debate que ainda é tabu e interditado entre os tomadores de decisão nas organizações de segurança pública”, destaca o texto do anuário.

    O FBSP destaca ainda outro dado que pouco varia em relação a série histórica: 50,3% das vítimas de MVI em 2022 tinham entre 12 e 29 anos. Dentre os mortos em intervenções policiais, esse grupo etário concentra 75% das mortes.

    Violência Sexual

    Os dados do anuário mostram que o número de registros de estupros e estupros de vulnerável em 2022 foi o maior já registrado pelo FBSP: 74.930 vítimas – 88,7% mulheres e 11,3% homens.

    “Estes números correspondem aos casos que foram notificados às autoridades policiais e, portanto, representam apenas uma fração da violência sexual experimentada por mulheres e homens, meninas e meninos”, diz o texto do anuário.

    Em relação ao ano de 2021, a taxa de estupro e estupro de vulnerável cresceu 8,2% e chegou a 36,9 casos a cada 100 mil habitantes. Exclusivamente os casos estupro somaram 18.110 vítimas em 2022, um crescimento de 7% em relação ao ano anterior. Já os casos de estupro de vulnerável, com um total de 56.820 vítimas, teve incremento de 8,6%.

    Os dados do FBSP mostram que 24,2% das vítimas de estupros, em 2022, foram homens e mulheres com mais de 14 anos, e que 75,8% eram incapazes de consentir, fosse pela idade (menores de 14 anos), ou por qualquer outro motivo (deficiência ou enfermidade).

    Segundo o forum, 10,4% das vítimas de estupro eram bebês e crianças, com idade entre 0 e 4 anos; 17,7% das vítimas tinham entre 5 e 9 anos e 33,2% entre 10 e 13 anos (a faixa etária mais afetada pelo crime). Ou seja, segundo os dados, 61,4% das vítimas tinham no máximo 13 anos.

    “Podemos ter como hipótese que estamos diante de um aumento das notificações já que as vítimas estão mais informadas e empoderadas. No entanto, este argumento precisa ser relativizado quando verificamos o perfil das vítimas. No Brasil, 6 em cada 10 vítimas são vulneráveis com idades entre 0 e 13 anos, que são vítimas de familiares e outros conhecidos. Ou seja, ainda que estas crianças e adolescentes estejam mais informadas sobre o que é o abuso, é difícil crer na hipótese do empoderamento como única explicação para o fenômeno”, ressalva o anuário.

    Considerando a autoria indicada no boletim de ocorrência, assim como em anos anteriores, na maioria absoluta dos casos os abusadores são conhecidos das vítimas (82,7%), e apenas 17,3% dos registros tinham desconhecidos como autores da violência sexual. Dentre as crianças e adolescentes entre 0 e 13 anos de idade vítimas de estupro os principais autores são familiares (64,4% dos casos) e 21,6% são conhecidos da vítima, mas sem relação de parentesco.

    Pessoas negras seguem sendo as principais vítimas da violência sexual, mas houve crescimento da proporção em relação a 2021. Ano passado, 56,8% das vítimas eram pretas ou pardas (no ano anterior eram 52,2%). Em relação às demais, 42,3% eram brancas, 0,5% indígenas e 0,4% amarelas.

    Investimentos e metas

    Segundo o anuário, os investimentos em segurança pública no país em 2022 – somadas todas as esferas –, totalizaram R$ 124,8 bilhões, um crescimento de 11,6% em relação ao ano anterior. O resultado foi impactado, principalmente, pelo maior volume de despesas dos estados e Distrito Federal (R$ 101 bilhões), que tiveram alta de 12,9%, em relação a 2021.

    Já os investimentos da União (R$ 14,4 bilhões) apresentaram crescimento menor do que o dos estados, de 2,6%. “Esse montante baixo chama a atenção pois a União, em tese, seria responsável pela organização da política de segurança pública com vistas a uma atuação sistêmica de todos os agentes da área através do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP)”, diz texto do anuário.

    O FBSP destaca que o Ministério da Justiça e Segurança Pública revisou o Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, lançado em 2018, e estabeleceu metas de redução de homicídios dolosos, de lesões corporais seguidas de morte e de latrocínios.

    A pasta definiu que até 2030, fim do prazo de vigência do atual Plano Nacional, a meta de redução desses crimes somados deveria alcançar a taxa de 17 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes. Os dados de 2022 mostram que a meta já foi alcançada em 54% dos 5.570 municípios brasileiros.

    “Estamos no caminho da redução? Sim. De fato, já faz dois anos que a gente observa essa queda nacional. Mas a gente vê também que tem alguns estados que não tiveram queda e tiveram aumento. Há 12 estados com aumento na taxa. Ou seja, é preciso observar o contexto dos estados para que a gente consiga a redução de uma forma mais uniforme no país”, destaca Isabela Sobral.

    Em 2022, em comparação com o ano anterior, tiveram alta de mortes violentas intencionais os estados: Acre (21%), Alagoas (4,2%), Mato Grosso (18,9%), Minas Gerais (2,2%), Pará (0,6%), Paraná (7,2%), Pernambuco (1,3%), Piauí (4,5%), Rio Grande do Sul (3,8%), Rondônia (14%), São Paulo (1,3%), e Tocantins (5,5%).

    Registraram queda: Amapá (-25%), Amazonas (9,3%), Bahia (-5,9%), Ceará (-9%), Distrito Federal (-10,1%), Espírito Santo (-4,8%), Goiás (-5,6%), Maranhão (-6,5%), Mato Grosso do Sul (-0,2%), Paraíba (-6,9%), Rio de Janeiro (-5,8%), Rio Grande do Norte (-7,7%), Roraima (-18,4%), Santa Catarina (-9%), e Sergipe (-3,9%).

    Edição: Denise Griesinger

  • População negra encarcerada atinge maior patamar da série histórica

    População negra encarcerada atinge maior patamar da série histórica

    A população negra encarcerada no sistema penitenciário brasileiro atingiu o maior patamar da série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), iniciado em 2005. De acordo com o anuário da entidade, divulgado hoje (20), em 2022, havia 442.033 negros encarcerados no país, ou 68,2% do total das pessoas presas – o maior percentual já registrado.

    Em 2021, essa proporção era de 67,5%. Há 18 anos, em 2005, quando a série histórica do FBSP teve início, os negros representavam 58,4% das pessoas presas no país. Já os brancos, no sistema prisional, eram 197.084 em 2022, ou 30,4% do total. Em 2005, eram 39,8% do sistema prisional.

    “O sistema prisional brasileiro escancara o racismo estrutural. Se de 2005 a 2022 houve crescimento de 215% da população branca encarcerada, houve crescimento de 381,3% da população negra. Em 2005, 58,4% do total da população prisional era negra, em 2022, esse percentual foi de 68,2%, o maior da série histórica disponível. Em outras palavras, o sistema penitenciário deixa evidente o racismo brasileiro de forma cada vez mais preponderante. A seletividade penal tem cor”, destaca o texto do anuário do FBSP.

    No total, a quantidade de pessoas presas no sistema carcerário brasileiro aumentou de 815.165 em 2021 para 826.740, em 2022. A razão de detentos por vaga também aumentou, de 1,3 (2021) para 1,4 (2022), ou seja, o sistema está operando ainda mais acima de sua capacidade. Segundo o anuário, há 230.578 pessoas privadas de liberdade a mais do que o sistema comporta.

    “Persistem, portanto, as condições de superlotação e insalubridade. A integridade física e moral das pessoas em privação de liberdade é banalizada. Vai se assentando uma “cultura do encarceramento”, com a sobrerrepresentação negra naturalizada. Na medida em que o Estado se mantém inerte, legaliza a desigualdade e corrobora as irradiações do racismo estrutural”, destaca o texto o anuário.

    Presos sem condenação

    O documento do FBSP mostra ainda que houve diminuição proporcional dos presos provisórios – pessoas detidas sem condenação – no sistema prisional. Em 2020, eram 30,2% do total; em 2021, 28,5%; e agora, em 2022, 25,3%.

    “Podemos estar diante dos impactos da implementação cada vez mais consistente das audiências de custódia, cujo marco inaugural data de 2015. Mesmo com a diminuição a comemorar, ainda estamos falando de 210.687 pessoas privadas de liberdade sem que tenham sido condenadas”, diz o texto do anuário.

    Monitoramento eletrônico

    O anuário chama a atenção para o aumento do número de detentos como monitoramento eletrônico. Em 2019, eram 16.821 presos com monitoramento eletrônico (2,2% do total); em 2022, esse número foi para 51.897 (11% do total dos presos).

    De acordo com o documento, a mudança ocorreu principalmente em razão da Recomendação 62 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de 2020, que recomendou adoção de medidas preventivas à propagação de covid-19 no sistema prisional.

    “O monitoramento eletrônico tem sido propalado como uma alternativa ao encarceramento. Tanto que é apresentado pelo CNJ como resposta hábil a lidar com os problemas estruturais do sistema carcerário. Contudo, a se considerar, que ao mesmo tempo em que esse expediente eletrônico preserva da privação de liberdade degradante, essa modalidade de cárcere impõe uma rotina de sobrevivência que impacta diretamente na autonomia, trazendo marcas simbólicas que estigmatizam a condição da pessoa encarcerada”, diz o texto do anuário.

    Edição: Valéria Aguiar