Categoria: ARTIGOS

Leia artigos, colunas e debates sobre os fatos importantes e polêmicos da atualidade; envie seus artigos para nossa redação”

  • Quando o agro deve se comunicar?

    Quando o agro deve se comunicar?

    O agro e a comunicação estão sempre juntos. Informação de qualidade, bem ditas ou escritas e direcionadas corretamente são essenciais para que o consumidor conheça o produto que está à sua mesa. A informação clara e precisa é importante para esclarecer dúvidas da sociedade, pontuar fatos e especialmente: desmistificar temas importantes e combater as fakenews sofridas pelo setor.

    Tudo isso parece e deve ser muito óbvio para muita gente, mas fica a questão, quando o agro deve se comunicar? Eu respondo que é agora, hoje, em todos os meios e constantemente! Investimento em assessoria de imprensa, marketing, publicidade não é pra defender o setor e sim combater a desinformação com informação. Comunicar é também a arte de dizer a sua verdade para o próximo e não apenas responder os questionamentos e dúvidas que ele gera sobre você.

    É muito comum no agro que os investimentos em comunicação sejam para ‘apagar fogo’. É na hora da crise que se pensa em ‘mostrar a realidade’. E porque não expor a realidade sem egos, com clareza e esclarecimento para toda a sociedade? E porque não falar abertamente sobre a qualidade dos alimentos produzidos nas nossas cidades, sobre a importância do setor para a dona de casa e até mesmo abrir o diálogo para questões consideradas mais tensas, como aplicação de defensivos na lavoura?

    A assessoria de comunicação não serve apenas para defender o setor. É papel do assessor de imprensa identificar o que é de interesse comum, o que é preciso falar abertamente e apontar as necessidades de melhorias na comunicação interna e externa de companhias, entidades, profissionais e de um setor.

    Finalizo dizendo que o setor precisa se unir, abrir maior diálogo com a mídia e mostrar toda a cadeia produtiva. Falar da importância da produção de soja e milho para a pecuária, por exemplo, é falar diretamente com os telespectadores de jornais da hora do almoço. É com simplicidade e clareza que ela vai entender que a carne moída da almôndega precisa da lavoura de grãos. É a união que se faz uma boa comunicação institucional.

    O agro e a comunicação são aliados. Tenho falado muito sobre isso e pontuado algumas dicas no meu perfil no Instagram. Acompanhe semanalmente em @eladoagromt.

    Ana Sampaio é jornalista do agro e diretora de assessoria de comunicação da Crop AgroComunicação, única agência exclusivamente agro em Mato Grosso.

  • A luta pelo controle interno independente – Parte 2

    A luta pelo controle interno independente – Parte 2

    De acordo com a INTOSAI (ISSAI GOV 9140, item 5.1) a “independência é a ausência de condições que possam diminuir a atividade adequada de auditoria interna ou afetar o desempenho do executivo chefe de auditoria (CAE) para realizar suas responsabilidades de auditoria interna de maneira imparcial”.
    Veja também:  A luta pelo controle interno independente – Parte 1 – por Isaías Lopes da Cunha

    Para essa organização internacional a independência da auditoria interna é essencial porque o “papel de prestar informações precisas e imparciais sobre a utilização dos recursos públicos e dos serviços prestados exige que a atividade de auditoria seja realizada sem restrições – livre de interferências ou pressões da organização auditada ou uma área sob auditoria” (ISSAI GOV 9140, item 6.2)

    Nessa toada, o pano de fundo da luta da AUDICOM-MT é a defesa da moralidade e da probidade administrativa, da ética e integridade públicas, que são maculadas pela nomeação de servidor estranho à carreira de controle interno para o cargo de controlador geral, pois a precariedade e transitoriedade do cargo prejudica o comprometimento com a coisa pública e sua atuação independente, dando causa a politização da fiscalização dos atos de gestão, a ingerências político-partidárias e ao patrocínio de interesses de agentes públicos e/ou privados não republicanos.

    Como essas causas estão relacionados com a atuação do Ministério Público (MP), a Procuradorias Gerais de Justiça ou da República tem o dever-jurídico de defender administrativa e judicialmente os princípios básicos da administração pública (art. 37, CF), principalmente, a regra do acesso aos cargos públicos por meio do concurso público e, como exceção, o provimento em cargos em comissão para desempenhar exclusivamente funções de direção, chefia e assessoramento descritas em lei, combatendo a criação desses cargos para exercer atribuições técnicas, burocráticas e permanentes na administração pública.

    Nessa vertente, os Ministérios Públicos dos Estados de GO, MA, PB, PR, RJ e SC tem desenvolvidos boas práticas de fortalecimento dos controles internos municipais, segundo o CNMP. Na esfera judicial, o MP/SP tem dado exemplo de atuação proativa para os demais Parquet, pois somente no ano 2022 interpôs pelo menos 100 ADIs para invalidar leis municipais que visam fragilizar a carreira de controle interno (AUDICOM-MT, 2022).

    Considerando que as funções de controle interno são reguladas pela Constituição Federal, por leis complementares e normas gerais da União, que estabelecem atribuições técnicas a seus dirigentes, tais como representar ao Tribunal de Contas qualquer irregularidade ou ilegalidade que tiver conhecimento, sob pena de responsabilidade solidária (art. 74, §1º, CF) e de emitir parecer de controle interno sobre as contas anuais da autoridade máxima do órgão (art. 9º, LRF), não existe possibilita de modulação de efeitos de ADI a fim permitir que entes públicos editem novas leis com as pseudo atribuições de direção, chefia e assessoramento ao cargo de controlador geral em contrariedade a esses dispositivos constitucionais e legais.

    A tese firmada no RE 1041210/SP constitui requisitos para a criação de cargos em comissão, a serem observados pelos titulares dos Poderes da República e dos órgãos autônomos ao iniciarem o processo legislativo sobre a respectiva matéria e na sua atuação institucional, bem como pelos órgãos jurisdicionais ao decidirem sobre ações sob a sua jurisdição.

    Não obstante, a luta pelo controle interno independente e eficaz é contínua, árdua e encontra resistência da própria autoridade pública beneficiada pelas ações de controle, razão pela qual deve contar com apoio do MP e ser travada em várias frente de batalhas, especialmente junto ao TCE ou TCM, ao Poder Judiciário e aos Poderes Legislativos.

    Nesta última esfera, urge a necessidade de constitucionalização da essencialidade das atividades dos órgãos de controle interno e da organização da carreira dos servidores responsáveis por essa fiscalização, mediante aprovação de uma PEC do Estado a fim fortalecer o sistema de controle interno da administração pública do Estado e dos Municípios, suprir lacunas constitucionais, pacificar e prevenir futuros conflitos.

    No início desde ano, as entidades do Sistema de Controle Externo emitiram a Nota Recomendatória nº 03/2023 recomendando os Tribunais de Contas subnacionais a cumprirem e fazerem cumprir a Diretriz da ATRICON 3204/2014, aprovada pela Resolução ATRICON nº 05/2014, notadamente quanto à estruturação e funcionamento das controladorias internas municipais.

    Por fim, “como uma andorinha voando sozinha não faz verão” (Mara Lima, 1990), seria um grande marco na defesa da probidade administrativa e do patrimônio público caso os órgãos e entidades integrantes da Rede de Controle dos Estados brasileiros firmarem um pacto ou programa em prol do fortalecimento dos órgãos de controle interno dos municípios, a exemplo do Programa Unindo Forças do MP/SC, com ações integradas de fiscalização, orientação e capacitação.
    Isaías Lopes da Cunha é Auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT.

  • A luta pelo controle interno independente – Parte 1 – por Isaías Lopes da Cunha

    A luta pelo controle interno independente – Parte 1 – por Isaías Lopes da Cunha

    No início de sua obra clássica “A luta pelo direito”, Rudolf Von Ihering afirma que o fim do direito é a paz e a luta é o meio para obtê-la, assim, sem luta não há direito.  A vida do direito é a luta: luta dos povos, dos governos, das classes, dos indivíduos etc.

    Veja também: A luta pelo controle interno independente – Parte 2

    Nos últimos anos, profissionais de controle e suas entidades de classe lutam pela probidade administrativa e estrita observância aos princípios constitucionais da administração pública, principalmente o de acesso e exercício de cargos, empregos e funções públicas após prévia aprovação em concurso público (art. 37, caput, e II, CF).

    Apesar do importante e relevante papel do TCE-MT na implantação do SCI dos municípios mato-grossenses, mediante aprovação da Resolução nº 01/2007, das Resoluções  Normativas nº 33/2012 e nº 26/2014 e da Súmula nº 08/2015 que estabelecem, dentre outras diretrizes, que as atividades de controle interno devem ser exercidos por servidores públicos efetivos, ainda hoje, servidores ocupantes de cargos exclusivamente comissionados de controlador interno ou de controlador geral realizam essas atividades em alguns órgãos públicos.

    A fiscalização contábil, orçamentária, financeira, operacional e patrimonial dos órgãos e entidades públicas (art. 70, caput, CF), especialmente, de comprovar a legalidade e avaliar os resultados da gestão orçamentária, financeira e patrimonial dos órgãos e entidades públicas (art. 74, II, CF), requer aplicação de conhecimentos técnicos de Contabilidade e de Direito, sendo, portanto, uma atividade eminentemente técnica.

    Por ser uma função relevante para a Administração Pública, o Legislador Constitucional regulou a responsabilidade dos dirigentes dos órgãos de controle interno no art. 74, § 1º, da Lei Maior, que preconiza: “Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária”.

    Nesse contexto, o STF declarou inconstitucionais as leis de entes federativos que criam cargos comissionados de auditor de controle interno (ADI  3602/GO) e de diretor de controle interno e de controlador interno (RE 1264676/SC).

    Reafirmando a sua jurisprudência sobre cargos em comissão no RE  1041210/SP, a Suprema Corte fixou a seguinte tese:

    1. a) A criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais;
    2. b) tal criação deve pressupor a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado;
    3. c) o número de cargos comissionados criados deve guardar proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os criar; e
    4. d) as atribuições dos cargos em comissão devem estar descritas, de forma clara e objetiva, na própria lei que os instituir.

    Nessa esteira, as principais lutas da Associação dos Auditores e Controladores Internos dos Municípios de Mato Grosso (AUDICOM-MT) são a criação e o provimento de cargos efetivo de auditor ou controlador interno por meio de concurso público e o exercício de cargos em comissão de direção e chefia nas unidades de controle interno por servidor efetivo da carreira de controle interno.

    Das setes ADIs ajuizadas pela AUDICOM-MT, nas duas primeiras, o TJMT declarou inconstitucionais as leis que criaram cargos comissionados de auditor geral e auditor interno (N.U.1010030-36.2019.8.11.0000) e de controlador geral, coordenador de controle interno e gerente de auditoria (N.U.1014296-32.2020.8.11.0000) por ofensa ao princípio da investidura e ausência de atividades de direção, chefia e assessoramento (art. 37, II e V, da CF).

    A questão central que permeia todas essas ações é que os cargos em comissão, declarados por lei de livre nomeação e exoneração, possui natureza precária e transitória, por isso não coaduna como função de fiscalização dos atos de gestão, especialmente, os da autoridade nomeante, por não garantir independência funcional aos dirigentes dos órgãos de controle interno e porque suas atribuições são eminentemente técnicas e permanentes.

    Por outro lado, as controladorias internas fazem parte da estrutura da Administração Pública, a qual é organizada de forma hierárquica, necessitando dessa maneira também de cargos em comissão de direção e chefia nesses órgãos, dentro dos contornos constitucionais, para dirigir, planejar e supervisionar as atividades de controle e auditoria interna, bem como para representar a instituição e exercer os poderes administrativos.

    Diante desse imbróglio, umas alternativas jurídicas são a vinculação dos cargos em comissão de direção e chefia aos integrantes da carreira de controle interno por meio de lei e a interpretação pelo Poder Judiciário de que os ocupantes desses cargos são os responsáveis pelo controle interno (art. 74, §1º, CF) e, por isso, somente podem ser providos por auditores ou controladores internos de carreira.

    Isaías Lopes da Cunha é Auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT

  • Mulheres são maioria na faculdade

    Mulheres são maioria na faculdade

    Apesar de as mulheres representarem a maioria da população brasileira, sendo 51,1% dos habitantes de acordo com dados do IBGE, a luta por equidade de gênero é contínua sendo uma realidade em diversas áreas da sociedade. No entanto, dentro do ambiente acadêmico, este cenário está se transformando. Em 2022, 21,5% das mulheres estudantes completaram suas graduações, enquanto somente 15,6% dos homens completaram seus cursos.

    unnamed 27De acordo com dados do Mapa do Ensino Superior de 2022, o número de pessoas do sexo feminino cursando alguma formação na área da saúde equivale a 73,2%, enquanto nas demais esse percentual é de 52,8%. Informações da base de dados do Pravaler, principal plataforma de acesso e soluções para o ecossistema de educação do Brasil, mostram que nos dois primeiros meses de 2023, os cursos majoritariamente financiados para mulheres foram Enfermagem, Psicologia, Medicina Veterinária, Odontologia, Fisioterapia, Biomedicina e Farmácia.

    “Mesmo em meio a tantos desafios, as mulheres têm conseguido conquistar o espaço que lhes é de direito na sociedade. É muito gratificante saber que, por meio do financiamento estudantil, temos conseguido contribuir com a diminuição da desigualdade de gênero nas instituições de ensino superior e, consequentemente, com a inserção no mercado de trabalho”, comenta Fernanda Inomata, psicóloga e CHRO do Pravaler.

    Luana Romão, de 41 anos, é exemplo disso. A enfermeira, que atualmente estuda para se tornar médica, encontrou no financiamento privado a oportunidade de transformar um sonho em realidade. “Meu filho tinha sete meses quando fui aprovada no vestibular. Com o apoio da família e a venda de um terreno, consegui cursar os primeiros anos de faculdade, porém, os valores eram altos, e quando o dinheiro apertou, o financiamento do Pravaler foi a alternativa para não trancar a faculdade”, conta.

    “O acesso ao conhecimento é a maior ferramenta de mudança social que existe e, por isso, o ingresso dessas mulheres nas universidades é algo tão importante, com um potencial gigantesco de colaborar com a mudança do cenário brasileiro quando o assunto é representatividade feminina”, finaliza a executiva.

  • A força do empreendedorismo feminino

    A força do empreendedorismo feminino

    Gosto muito de uma frase atribuída à estilista e empresária francesa Gabrielle Bonheur – “Coco” Chanel – que diz assim: “A minha vida não me agradava, então eu criei a minha vida”. Milhões de mulheres brasileiras vêm seguindo esta máxima mesmo sem saber e investindo no empreendedorismo, um movimento que ganha cada vez mais força no Brasil e no mundo.

    Uma pesquisa realizada pela Serasa Experian divulgada em novembro do ano passado, no mês do Empreendedorismo Feminino, mostrou que o cenário é realmente impactante e favorável para nós: das 20,6 milhões de empresas ativas no país, 8,4 milhões (ou 40,5%) têm mulheres como donas ou sócias majoritárias.

    Sou uma delas e me orgulho da minha trajetória que, apesar de curta em tempo, faz apenas três anos que encontrei o caminho do empreendedorismo, tudo que estou vivendo tem muita intensidade. Isso se deve à minha missão que não se limita a me tornar uma “mulher potência”, mas, sobretudo, levar centenas ou milhares de mulheres junto comigo.

    Sim, “nós podemos”, como disse o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama, que tem uma esposa igualmente extraordinária, Michelle, que dizia que “não há limite para o que nós, mulheres, podemos alcançar”. Devemos sim estar no palco da vida, desenvolvendo projetos grandiosos, contribuindo com a economia e a sociedade. O nosso lugar é onde nós queremos estar!

    Antes enxergava a minha demissão de um ótimo trabalho no serviço público, onde atuei por 12 anos, como um desafio, hoje, vejo como uma benção. Porém, ter mais de 50 anos não é fácil para as mulheres, pois, mesmo quando temos um currículo qualificado e somos competentes, não conseguimos recolocação no mercado. Dessa situação que experimentei e que me entristeceu inicialmente, pude fazer como uma fênix: renascer.

    Intensifiquei o ritmo de estudos, e é preciso humildade para olhar para dentro e admitir que não sabemos tudo e que precisamos aprender mais, principalmente sobre nós mesmas. A nova jornada me tornou palestrante, mentora de mulheres, escritora e recentemente empreendedora do Encontro de Mulheres de Negócios, que chegou à sua 6ª edição no início de março reunindo mais de 100 mulheres em Cuiabá. No total, mais de 400 mulheres já foram impactadas positivamente!

    Além disso, desenvolvi um projeto que é inovador em Mato Grosso, o Clube de Mulheres Potência, que busca oferecer uma “rede de apoio” às empreendedoras de todo Estado com ferramentas para que possam fazer o negócio dar certo. Essa “rede” leva informações para que elas possam se sair bem nos próprios negócios e na vida.

    Nossos encontros têm momentos de palestras, rodada de negócios, exposição de produtos e networking. O lema “mulher que levanta mulher” se tornou algo muito prático entre nós, que compramos e divulgamos os produtos e serviços umas das outras, pois acreditamos que “juntas somos mais fortes”!

    Nosso otimismo não significa ter uma visão romântica do contexto em que vivemos. Porque infelizmente as mulheres estão despontando como empreendedoras por motivos que sinceramente não deveriam. Em geral, porque somos demitidas (como foi comigo) e não encontramos lugar para recolocação profissional, isso é muito comum após os 40 anos e se acentua aos 60 anos, e o mesmo não acontece com os homens.

    Também pode acontecer em decorrência de não nos sentimos valorizadas e ganharmos menos que nossos pares homens, o que é duplamente ruim já que a maioria dos lares brasileiros é chefiado por mulheres; ou ainda pode acontecer uma demissão ao fim da licença-maternidade ou mesmo a não contratação por estarmos na fase mais vulnerável das nossas vidas, que é a maternidade. Como assim as mães não conseguem trabalhar ou ganham menos?

    Ao invés de sentar e chorar nós estamos, mais uma vez, nos reinventando. As mulheres têm essa capacidade incrível, pelas próprias habilidades desenvolvidas ao longo da ancestralidade feminina, de se transformar, como dizia o poeta Manoel de Barros, “quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras: liberdade caça jeito”. Estamos caçando um jeito de viver bem e de fazer bons negócios.

     

    Para tanto, estamos dispostas a aprender sobre áreas importantes como gestão, finanças, empreendedorismo, comunicação e imagem e marketing digital, além de desenvolver uma irmandade para oferecer apoio emocional umas às outras. Tudo isso porque a força-motriz do empreendedorismo feminino é o amor, que primeiro nos transforma, depois transforma as nossas famílias e, por fim, a própria sociedade.

    Kátia Arruda, palestrante, escritora e mentora de mulheres, Administradora, Mestre em Gestão de Pessoas, especialista em Comportamento Humano nas Organizações e Especialista em Direito Administrativo e Gestão da Qualidade.

  • Lugar de mulher é no AGRO!

    Lugar de mulher é no AGRO!

    Lugar de mulher é onde ela quiser. Sim, essa frase já virou um clichê, mas a gente não cansa de dizer. E hoje, dia 08 de março, em que celebramos o Dia Internacional da Mulher é importante que isso seja enaltecido. Porém, quero parafrasear dizendo que LUGAR DE MULHER É NO AGRO.

    E se tem uma coisa que eu posso dizer com propriedade é isso. Nesses meus pouco mais de 10 anos de atuação no mercado de trabalho enquanto jornalista, vivi, fiz e contei muitas histórias. Mas o que realmente ganhou meu coração e me tornou uma profissional posicionada foi o agro. Especialmente histórias de mulheres, de grandes mulheres que precisam trabalhar, falar, provar e estudar o dobro para alcançar os espaços que almejam.

    Mato Grosso é o maior produtor agropecuário do país e o terceiro maior produtor do mundo. Com certeza lugar de mulher é no agro sim. E em Mato Grosso mais ainda. Trabalhei em uma instituição do agro por alguns anos e foi lá que eu comecei a ver e reconhecer o papel da mulher neste setor. E afirmo que a presença feminina no campo, sejam elas profissionais ou produtoras, crescem a cada safra.

    Ao longo dessa minha trajetória de comunicadora do agro, conheci e aprendi com muitas mulheres que estavam à frente de grandes equipes, com grandes responsabilidades. São mulheres à frente de setores como administrativo e financeiro. Ou emplacando e estudando grandes temas como a sustentabilidade. E até mesmo pensando no futuro através da pesquisa científica. E tem as que estão no dia a dia do campo, por todo estado, para atender as mais variadas demandas do setor. Eu conheci. São profissionais mestres, doutoras, pós-doutoras com muitos anos de experiência e que se dedicam diariamente e são do agro. Lá é o lugar delas.

    Claro, as produtoras rurais. Grandes mulheres à frente dos seus negócios, cuidando do escritório, assumindo a produção, subindo na colheitadeira, na plantadeira, nos tratores, na lida com os animais no campo. Mulheres que estão na liderança em suas empresas, propriedades e nas cidades onde moram.

    Grandes movimentos criados e liderados por mulheres como as Agroligadas, o AgroMulher, projeto Mulheres do Agro, programa Mulheres em Campo e tantos eventos e cursos para ‘elas’. Temos também as inúmeras influenciadoras, palestrantes, agro coaches e consultoras.

    E foi o agro que me fez a profissional de hoje. Com muitos pontos de melhoria, mas com potencial e diferencial para este setor que me deu oportunidade, a qual abracei com todo meu conhecimento, força e determinação de mulher. Me preparo diariamente para os desafios profissionais e pessoais e sei que meu lugar é no agro. E tenho o prazer de empreender ao lado de outra mulher que é uma potência na comunicação do agro.

    Para todas as mulheres, profissionais que querem ingressar neste setor, sejam bem-vindas. O lugar de vocês é aqui. O agro tem muita oportunidade e nós mulheres temos o diferencial. O agro é para mulher!

    Feliz Dia Internacional da Mulher!

    Ana Sampaio é jornalista do agro e diretora de assessoria de comunicação da Crop AgroComunicação, única agência exclusivamente agro em Mato Grosso. Sigam @eladoagromt

  • O impacto positivo da mulher na Governança

    O impacto positivo da mulher na Governança

    Há uma frase do filósofo alemão Arthur Schopenhauer que diz que “a mulher é um efeito deslumbrante da natureza”. Na Governança Familiar não seria diferente, já que intuitivamente costumamos atuar em vários papéis de maneira incansável para promover o bem-estar da família e da empresa, o que habitualmente é chamada de “Governança invisível”.

    Embora a gente desempenhe funções importantes e com excelentes resultados, ainda há muito a se fazer no que se refere à igualdade de oportunidades e reconhecimento. Essa pauta vem sendo impulsionada pelo ESG (Environmental, Social and Governance) nas empresas e priorizada por movimentos globais, como a Agenda 2030 construída na Assembleia Geral das Nações Unidas. Em apoio, a ONU Mulheres lançou a iniciativa global “Por um planeta 50-50 em 2030: um passo decisivo pela igualdade de gênero”, com compromissos assumidos por mais de 90 países.

    Cristhiane Brandao 2 2

    Se analisarmos os dados dos últimos oito anos, vamos ver que houve uma evolução: o número de mulheres que ocupam cadeiras nos conselhos de companhias abertas cresceu de 3% para quase 18%, segundo um estudo da Global Board Diversity Tracker, da Egon Zehnder (2022). Isso se deve a uma série de esforços, entre os quais destaco a implantação do Programa Diversidade em Conselho (PDeC), desde 2014, pelo IBGC; e a Saint Paul Escola de Negócios, com o Advanced Boardroom Program for Women (ABP-W), um programa de formação de conselheiras, que é tutorado por Chris Aché, que já tem mais 400 executivas preparadas para ingressar nos conselhos (sou uma delas!).

     

    A representação importa, mas a inclusão é o próximo passo. Ainda temos muito chão pela frente e talvez o primeiro passo seja em relação ao próprio conhecimento, afinal, com os diversos papéis que desempenhamos como temos lapidado nossas competências? Estamos sendo preparadas para ocupar espaços como sócia, conselheiras, auditoras, executivas (diretoras), Governance officers e membros de comitês de assessoramento?

     

    Por se tratar de um processo, muitas vezes acabamos assumindo papéis na Governança com as quais temos mais habilidade, entre eles, impulsionar e encorajar indivíduos e equipes, além de buscar novas oportunidades de negócios, identificar oportunidades e tomar decisões. O perigo é que sejamos reconhecidas somente como “cuidadoras”.

     

    O relato recente de Gabriela Baumgart, presidente do conselho de administração do IBGC, mostra que é preciso coragem para abrir caminho: “Hoje, tenho a felicidade de ter companheiras mulheres, seja em conselhos ou outras atividades exercidas. (…) O caminho é longo, mas posso dizer que é uma alegria poder participar deste movimento de diversidade e inspirar outras mulheres”.

     

    Outro exemplo de liderança feminina é Solange Cruz Bichara, presidente da escola Mocidade Alegre, que estava há mais de nove anos sem receber o título, e se tornou a campeã do carnaval de São Paulo deste ano. O resultado se deve ao trabalho profícuo realizado por ela, que já recebeu o título de campeã do desfile de São Paulo outras seis vezes, e usou todo seu conhecimento em administração na escola de samba. Achei a história fantástica!

     

    Neste mês de março, em que celebramos o Dia da Mulher, precisamos debater as questões de empoderamento feminino além do aspecto superficial. O cerne não é colocar mulheres para ocuparem “espaços masculinos”, mas construir uma cultura – dentro da empresa e da família – onde esse poder possa ser compartilhado e multifacetado, ou seja, tenha matriz masculina e feminina, levando em consideração o conjunto de habilidades e características inerentes a cada um, só assim teremos o exercício da liderança realizado por homens e mulheres sem distinção ou discriminação.

     

    O grande desafio sem dúvida é criar esse ambiente diverso e inclusivo para que nós, mulheres (e qualquer membro da família), possamos exercer sua plena potência como líderes, sejam nos negócios ou na Governança Corporativa e Familiar. Para isso, é importante abrir espaço genuíno para que inicialmente possamos mostrar nosso ponto de vista, tenhamos desafios reais e vejamos nossas conquistas reconhecidas. Só assim poderemos avançar.

     

    Não existe um único caminho possível, por esse motivo, desenvolver um ambiente em que se possa demonstrar a própria vulnerabilidade e gerar conexões verdadeiras por meio de diálogo e feedbacks será essencial. Sempre descrevo esse “novo caminho” como uma jornada rumo à diversidade.

     

    Como toda transformação, exige tempo e muito esforço de todos os envolvidos. Mas a dedicação também será catalisadora de importantes promotores de integração, união e diálogo na família empresária. Ingredientes como esse fortalecem valores e a longevidade do seu negócio! Parabéns, mulheres! Vamos avançar juntas!

     

    Cristhiane Brandão, Conselheira de Administração, Consultora em Governança para Empresas Familiares e Coordenadora do Capítulo Brasília/Centro Oeste do IBGC.

  • Direito a Desconexão

    Direito a Desconexão

    O direito que garante as pessoas de se desconectar do trabalho e principalmente, de não se envolverem em comunicações eletrônicas relacionadas ao trabalho, fora do expediente começa a fazer sentido.

    Antigamente um trabalhador após a jornada de trabalho se desligava da empresa e ia cuidar da sua vida domestica. Hoje com as facilidades da internet forçamos as pessoas a trabalharem fora do horário previsto. #desconexão

    Essa ideia que sempre estamos online esta adoecendo trabalhadores, prejudicando relacionamentos e ainda nos forçando a entender que nunca precisamos descansar. #desconexão

    Em termos gerais, o direito de desconectar lida com as restrições físicas do trabalho tradicional versus os locais de trabalho digitais de hoje. Assim, a legislação que faz sentido para um operário fabril que vai para casa passar a noite é aplicada ao trabalhador que faz home office.

    Esse adoecimento da sociedade tem feito países regular leis e condutas ao chamado direito de desconexão a fim de barrar os excessos da cultura sempre ativa em torno de smartphones e acesso constante a e-mails, whatsapp e mensagens de trabalho.           #desconexão

    França, Reino Unido, Austrália e Canada já fazem uso de legislações que regulamentam o trabalho remoto estabelecendo limites mais rígidos sobre quando as obrigações de um trabalhador remoto começam e terminam.20210121PHT96107 original 1

    A Irlanda introduziu um código de conduta sobre o direito de desconectar para todos os trabalhadores, onde as reclamações podem ser apresentadas a um conselho de disputas no local de trabalho.

    Segundo Frances O’Grady Ex-Secretária-Geral do Congresso Sindical do Reino Unido “Todos nós precisamos de um bom equilíbrio entre vida pessoal e profissional com algum tempo de inatividade adequado. Mas a tecnologia de hoje pode facilmente confundir a linha entre trabalho e casa, sem diminuir o estresse do trabalho. “

    Mas o direito de desconectar, exige que grandes organizações reformulem políticas sobre comunicação digital fora do horário de trabalho e definam qual é o limite desse novo jeito de trabalhar.

    20201130PHT92729 original

    Essa indefinição de limites revela complexidades importantes que afetam a aplicabilidade do direito de desconectar a legislação. E mais, e empresas revejam que impactos econômicos podem suportar.

    Na ausência de constrangimentos físicos reais, renegociar o ritmo de trabalho e a sua duração é agora um exercício cultural de todos.

    E se não temos leis que regulamentem esses limites sobre a jornada de trabalho o que podemos fazer?

    Individualmente, alguns funcionários tentam regular os limites entre trabalho e vida pessoal usando dispositivos separados para seus trabalhos.960x0 1

    Trabalhadores individuais podem administrar seus próprios horários de trabalho para evitar que o excesso tenha efeitos negativos na vida domestica, alguns aplicativos podem ajudar nessa atividade.

    Mas é preciso ficar atento ao que é tempo de trabalho com estar trabalhando online e acessar a internet para compras, usar mídias sociais, ou jogar.

    Apesar da eficácia duvidosa das leis de direito de desconexão, elas levantam questões importantes sobre a organização do trabalho moderno ao lado de nossas expectativas coletivas sobre o tipo de trabalho que valorizamos como sociedade e o tempo que deveria consumir.

    As leis e as discussões resultantes sobre elas podem contribuir para uma mudança cultural do vício em trabalho, pelo menos em relação ao trabalho remunerado.

    Algumas organizações como a Volkswagen e a Daimler já introduziram restrições à comunicação digital há vários anos. O direito de desconectar pode encorajar mais empresas a tomar medidas semelhantes.

    O direito de desconectar pode ser o catalisador para uma reflexão importante sobre uma mudança cultural que tire o estigma de um ritmo de trabalho menos frenético e permita que os funcionários tenham mais controle sobre seus limites entre vida publica e a privada.

    Por Maria Augusta Ribeiro é especialista em comportamento digital e Netnografia

  • Desarmadilhar o indivíduo e desvalorizar as paredes

    Desarmadilhar o indivíduo e desvalorizar as paredes

    Li que na estrada para ser Brasil (ainda caminhando) já houve tempo em que o Estado, os funcionários públicos, as ordens religiosas, os padres, todos eram proprietários de escravos. Os próprios escravos, uma vez livres, adquiriam escravos.

    Acordamos! Mas ainda dormimos. Falta-nos a noção simples de igualdade.

    Nós quase nunca somos quem os outros esperam. E, em homenagem à vida, eu não estou só como eu achava. Acreditamos que todos sabemos o que é ser uma pessoa. No entanto, essa definição é quase sempre redutora e falsa.

    Não se trata de estar no movimento do abolicionismo, do racismo, do LGBTQIAP+, das vítimas, dos direitos humanos, é ser direitos humanos em movimento. Não se trata de aceitar o outro, é saber que você é o outro também. É transitar de vidas. É visitarmos e sermos visitados por outras sensibilidades.

    A vida da gente é uma vereda para ser pessoa. Não, não somos o centro da vida nem o topo da evolução. Começamos indivíduos, estamos na corda bamba para ser gente. O que nos faz ser pessoa não está no CPF, nem no RG. Muito menos na carteira funcional. Ou nos famosos “ser alguém na vida” e “ter sucesso, ter futuro”. O que nos faz pessoas é o modo como pensamos e agimos. Como sonhamos, como somos com os outros, com nós mesmos e com nossa circunstância.

    De que adianta os títulos de mestre e doutor, de que servem o cargo de promotor, juiz, ministro ou presidente, se quando diante de uma alma humana, não conseguimos ser … outra alma humana.

    É difícil ser pessoa, nem que seja por um momentinho, até de visita. Às vezes a gente quase é … Gente é um universo vasto, profundo, homem algum sabe muito. As forças interiores da vida humana ainda se mostram profundamente ocultas para nós. Por isso essa caminhada deve ser atenta, sem rudeza e sem soberba. Para ir habituando os olhos ao escuro. Aprendendo com sentidos visíveis e invisíveis. Ah! Nunca houve tanta estrada. E nunca nos visitamos tão pouco.

    Não é fácil procurar o que nos ajuda a sair da gente, o que nos afasta das nossas certezas. Como diz Mia Couto, nesse território, não temos apenas sonhos, somos sonháveis.

    Cada um é porque é os outros e a realidade envolvente. Simone de Beauvoir disse: a verdadeira natureza humana é não ter natureza nenhuma. Desvalorize as paredes, amigo leitor!

    * Emanuel Filartiga é promotor de Justiça em Mato Grosso

     

  • “É fundamental para o país que o setor ferroviário seja mais plural e com um número maior de operadores.”

    “É fundamental para o país que o setor ferroviário seja mais plural e com um número maior de operadores.”

    Acompanhe a entrevista realizada pela Revista Brasileira de Transportes – RBT – Volume 2 – Número 2 – 4ª edição –  Páginas 11 a 19 – FGV Transportes – com José Luis Vidal, diretor-executivo da ANFA – Associação Nacional das Ferrovias Autorizadas.vidal anfa 768x768 1

    José Luis Vidal é Engenheiro Elétrico pela Escola de Engenharia Mauá, com especializações em Economia Mundial pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto – FEP, Gestão de Risco e Tomada de Decisão Financeira pela Universidade de Chicago e Liderança na Inovação pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts – MIT (Prêmio Fire Hydrant Award). É pós- graduado em Administração de Empresas pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM, certificado como Conselheiro de Administração Experiente (CCA+) pelo Instituto de Governança Corporativa – IBGC e concluiu o Programa de Educação continuada em Gerenciamento de Risco Corporativo e Curso Avançado para Membros de Conselho de Administração – IBGC. Possui mais de 25 anos no setor de infraestrutura e logística e, atualmente, ocupa as posições de Presidente do Conselho Diretivo e Diretor Executivo da Associação Nacional das Ferrovias Autorizadas – ANFA e de Coordenador do Comitê de Infraestrutura e Logística da Rede Governança Brasil – RGB. É membro dos seguintes Conselhos de Administração: Santos Brasil S. A, BEMISA – Brasil Exploração Mineral S.A e WV Logistics. É membro do Conselho do Fórum Brasil Export e Coordenador do 1° Programa de Aperfeiçoamento em Governança, Compliance e Gestão de Riscos com Ênfase no Transporte e na Infraestrutura, promovido pelo Instituto Latino-Americano de Governança e Compliance Público, para os associados da CNT.

    RBT – Segundo dados recentes da ANTT, o Brasil possui 29.878 quilômetros de ferrovias, mas 62,1% dos trilhos (18.554 quilômetros) encontram-se subutilizados e 23,7% (7.076 quilômetros) ociosos. Diante desse cenário, no final de 2021, surge o novo Marco Legal das Ferrovias, Lei 14.273/21, com destaque para o regime de autorizações ferroviárias para a iniciativa privada. Como esse novo regime poderá impulsionar o modo ferroviário brasileiro e contribuir para o equilíbrio da matriz de transporte de cargas?

    José Luis Vidal – O Brasil, entre os países de dimensões semelhantes, é o que menos utiliza o sistema ferroviário para o transporte de cargas, com somente 21,5% do volume total de cargas sendo transportado pelas ferrovias, bem menos do que na Rússia, Canadá, Austrália, Estados Unidos e China. Na Rússia, 81% das cargas são transportadas em linhas férreas, muito à frente do índice canadense, de 46%. Na sequência, aparecem Austrália e EUA (43%), e China (37%), índices mais próximos do que poderíamos ter. No Brasil, em 2020, 68% do volume de cargas foi transportado em apenas 9% das ferrovias em operação.
    Em 2020, o Brasil movimentou 365 milhões de toneladas por ferrovias. Desse total, 250 milhões foram transportados em ferrovias operadas pela VALE, EFC e EFVM, com 1.900 km de extensão. Os outros 115 milhões de toneladas foram movimentados nos restantes 18.600 km de ferrovias em operação, ou seja, 9% da malha ferroviária em operação no Brasil transportou 68% do volume de carga e, nos 91% da malha restante, circulou o terço restante das cargas (32%). É importante destacar que, do total movimentado pela VALE, EFVM e EFC, somente 8,8% eram cargas de terceiros.

    A ANFA entende que o novo Marco Legal das Ferrovias e o regime de autorizações ferroviárias podem mudar esse cenário, ampliando os investimentos em infraestrutura gerando desenvolvimento econômico e social nas diversas regiões do país.

    RBT – No início de 2022, foi criada a Associação Nacional das Ferrovias Autorizadas (ANFA), entidade que representa as empresas envolvidas nas implantações de ferrovias pelo sistema de autorização, com você como primeiro diretor executivo. Quais são os principais objetivos da ANFA e como será sua atuação para contribuir com a melhoria da infraestrutura ferroviária do país?

    José Luis Vidal – A missão da ANFA é apoiar o setor privado na implantação de novas ferrovias, aproximando o setor das melhores práticas ESG e contribuindo com o desenvolvimento do país. Queremos apoiar o governo a desenvolver uma política de Estado, e, consequentemente, uma regulação que propicie o equilíbrio da relação entre os atuais concessionários e as autorizadas.
    Outra perspectiva será fomentar a indústria ferroviária brasileira, que está praticamente parada. Sem grandes encomendas por parte dos atuais concessionários ferroviários de cargas e passageiros, os fabricantes de trens instalados no país estão vivendo de eventuais exportações e das bem menores receitas das áreas de serviços, incluindo reformas e modernizações de equipamentos já em operação.
    No segmento de passageiros, a ociosidade na fabricação de trens (considerando que cada trem é composto por uma locomotiva e oito carros) está em 80%. Na área de cargas, incluindo locomotivas e vagões, chega a quase 100%. A construção e operação de ferrovias autorizadas pode ajudar a dinamizar esse setor, assim como promover desenvolvimento socioeconômico longe dos grandes centros atuais.
    Somos favoráveis a um Brasil industrializado.

    RBT – O quadro ferroviário atual não gera interesse em novos investidores e empreendedores para o patrocínio do desenvolvimento logístico do país, visto que a matriz brasileira de transporte de cargas é dominada pelo modo rodoviário, que detém uma fatia de 65%, ficando o modo ferroviário com apenas 21%. Como as autorizações ferroviárias poderão contribuir para maior racionalidade e melhor equilíbrio da matriz de transportes de cargas, oferecendo transporte para o agronegócio, produtos industrializados, combustíveis e contêineres, além do predominante transporte de minérios e carvão?

    José Luis Vidal – O Brasil tem uma baixa integração regional do seu sistema ferroviário, com a malha atual basicamente sendo a mesma dos anos 90. Isso provocou um baixo ritmo de crescimento das cargas ferroviárias: registramos 2,8% de crescimento anual nos últimos 10 anos. Um número muito modesto para um país que no mesmo período multiplicou suas exportações de grãos.
    Levando em consideração apenas o transporte de grãos, vemos que o Brasil apresenta baixo percentual de transporte ferroviário, com ineficiências e sobrecustos muito significativos. Dos 305 milhões de toneladas de grãos produzidos, 69 milhões foram transportados por ferrovias, ou apenas 22,6%.
    A competividade da produção brasileira passa pela necessidade de alternativas logísticas que permitam diminuir o “Custo Brasil” e aumentar
    a eficiência. Esse custo pode ser reduzido com a implantação de novas ferrovias que permitam a universalização do transporte ferroviário, e
    que evitem os conflitos com a carga própria. Isso poderá permitir o acesso a usuários que isoladamente não conseguem maximizar a sua capacidade pela existência de gargalos ferroviários.
    A ampliação do sistema nacional ferroviário, com a integração aos outros modais, é fundamental para maximizar a performance de cada etapa da intermodalidade. As autorizações ferroviárias, de iniciativa e financiamento privado, além de altamente convergentes com as soluções ESG, são fundamentais para a necessária ampliação da participação ferroviária na matriz de transportes nacional.

    RBT – As atuais concessionárias, caso sejam afetadas pela entrada em operação de alguma ferrovia autorizada, poderão migrar para o novo regime jurídico de autorização, sem prejuízo das obrigações contidas nos atuais contratos, no que se refere a investimentos e manutenção do transporte de cargas e passageiros. Qual seria o resultado prático desse eventual cenário?

    José Luis Vidal – É importante que a agência reguladora e o governo federal avaliem se a migração dos atuais contratos de concessão para contratos de autorização contribuirá efetivamente para o aumento da competitividade do transporte ferroviário, sempre tendo como objetivo principal a expansão da malha, a conquista de novos mercados e o desenvolvimento de novos serviços.
    Outro ponto a destacar é que o modelo de capital de uma ferrovia que foi construída pelo Estado e concedida à iniciativa privada tem uma estrutura de remuneração do capital muitas vezes diferente de uma autorizatária, que assume 100% do risco de implantação de um novo trecho.

    RBT – Parece existir um consenso de que o novo regime de autorizações ferroviárias seja acompanhado de uma regulação para viabilizar
    a obrigatoriedade do tráfego mútuo e direito de passagem nos novos ramais, trechos ferroviários autorizados e nas ferrovias existentes, que são operadas sob o regime de concessão. Isso é viável na prática, em termos operacionais e comerciais?

    José Luis Vidal – Teremos de entender as particularidades operacionais, administrativas, financeiras e comerciais do modelo de concessão e de autorização, e desenvolver regulação que equilibre a relação de forma justa.
    Essa regulação pode ser desenvolvida pela ANTT, que pode supervisionar o nível de cumprimento que os autorizatários entregarão à sociedade e as obrigações dos concessionários com foco no atendimento ao público, evitando distorções de mercado que se assemelhem a monopólios privados. É fundamental para o país que o setor ferroviário seja mais plural e com um número maior de operadores.

    RBT – O decreto no 11.245/2022 foi publicado para regulamentar a lei no 14.273/2021, denominada de “Lei das Ferrovias”, e institui o programa de desenvolvimento ferroviário, cujo objetivo é criar condições para acelerar o processo de devolução de trechos subutilizados na malha ferroviária concedida. Qual é a sua visão sobre a aplicabilidade prática desse decreto?

    José Luis Vidal – A lei aprovada pelo Congresso moderniza o setor e gera mais empregos, possibilitando o investimento privado em ferrovias. O novo marco cria condições para aumentar a eficiência, promovendo a diminuição de sobrecustos por sobreutilização do transporte rodoviário, estipulando a autorregulação, reprimindo as práticas anticompetitivas, permitindo o múltiplo acesso às ferrovias e criando o agente transportador ferroviário.
    O instrumento das autorizações já apresentou resultados muito significativos no setor portuário com a atual Lei de Portos (Lei 12.815/2013) e, mais recentemente, no setor aeroportuário (Aeroporto Catarina, em São Roque). Estima-se que o mesmo ocorrerá no setor ferroviário, uma vez que as autorizações apresentam um regime jurídico mais ágil e menos burocrático em comparação com
    as concessões.
    Atualmente, estão estimados investimentos de R$ 240 bilhões, nos próximos 10 anos, ou seja, quinze vezes mais do que os R$ 16 bilhões investidos no setor, nos últimos 10 anos. Em um momento em que o Estado brasileiro precisa priorizar o combate às carências sociais, e, simultaneamente, ampliar a infraestrutura, sempre precursora do desenvolvimento, a criação de soluções combinadas são essenciais para o contínuo crescimento do país. As autorizações ferroviárias, de iniciativa e financiamento privado, além de altamente convergentes com o conceito ESG, são fundamentais para a necessária ampliação da participação ferroviária na matriz de transportes nacional.

    RBT – O decreto no 11.245/2022 estipulou prazos para que as autorizatárias cumpram as etapas para o início da implantação das vias. São três anos para obter a licença prévia, cinco anos
    para a licença de instalação e 10 anos para a de operação. Esses prazos são adequados? Quais são os principais projetos prontos para serem implementados?

    José Luis Vidal – A ANFA entende que o modelo de autorizações pode ajudar a acelerar o desenvolvimento do país, ampliando a movimentações de cargas e apoiando a redução do Custo Brasil. O grande número de autorizações solicitadas reforça que há, de fato, grande demanda reprimida para movimentação em ferrovias.
    Inicialmente, os prazos são viáveis, mas, para que os projetos comecem a ser implementados, é importante a criação de uma normatização adequada, que garanta segurança jurídica para atração do investidor privado, seja doméstico ou internacional.
    Também é importante destacar que o contrato de autorização ferroviária é o passo inicial para o desenvolvimento do projeto e que, com a realização dos estudos de engenharia, por exemplo, muitas vezes é necessária a revisão do traçado definido inicialmente no contrato.

    RBT – Atualmente, as autorizações ferroviárias totalizam 22 mil quilômetros de novos trilhos em todo o país, com projeção de investimentos de mais de R$ 258 bilhões de recursos 100% privados. Mesmo assim, os investimentos públicos no setor ferroviário ainda serão necessários?

    José Luis Vidal – Entendemos que o sistema ferroviário brasileiro deveria ser composto por mais de um modelo de gestão. Os investimentos privados em ferrovia substituirão, em parte, a necessidade de investimentos públicos no setor, já que as ferrovias, como todas as infraestruturas de logística e transportes, são investimentos de grande monta e indutores do desenvolvimento, e novas fronteiras econômicas podem ser abertas no Brasil com um transporte ferroviário eficiente e econômico, como a vasta experiência mundial demonstra há mais de um século.

    Importante lembrar que o Brasil é composto de inúmeras realidades diferentes, isso deve servir para nos mostrar que os modelos de cada região têm suas particularidades e devemos buscar modelos se aproximem ao máximo destas realidades. Que operar commodities minerais e ou agrícola é absolutamente diferente de operar carga geral e que, por tal, os compromissos de investimentos, as taxas de retorno, a gestão dos ativos, entre muitos outros pontos, têm de ser considerados de formas particulares e pontuais.

    RBT – Por fim, como você analisa o mercado ferroviários brasileiro, em termos de demanda, atratividade comercial, segurança operacional, qualidade de serviço, regulação, eficiência energética, geração de empregos, controle ambiental e viabilidade financeira?

    José Luis Vidal – O comprometimento com o meio ambiente não é mais uma opção e sim um pré-requisito de sobrevivência nessa nova forma de fazer negócio. As ferrovias autorizadas podem contribuir para o desenvolvimento de uma visão sistêmica do transporte brasileiro que possibilite o equilíbrio da matriz de transporte, propiciando a redução no consumo de energia fóssil, contribuindo para a diminuição das emissões de CO2. Com a ferrovia, a redução nas emissões de poluentes na atmosfera, comparada com o uso da rodovia, é estimada em cinco vezes, (fls. 24/27, Boletim de Logística – A Retomada dos Investimentos Ferroviários para Aumentar a Eficiência da Matriz de Transportes). Com isso, a ampliação da malha ferroviária contribui com o cumprimento das metas globais assumidas pelo Brasil, reduzindo as emissões de CO2 e colaborando para o controle do clima.